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terça-feira, 4 de maio de 2010

Cartas de longe: As conversas do dr. Camilo

A arte de contar do escritor, do médico-Amigo, do cidadão do Douro e da literatura portuguesa contemporânea Camilo de Araújo Correia:

Crónica - O cimo da Régua

Hoje em dia, já não se usa muito entre nós a designação toponímica de Cimo da Régua.

Como foi com ela que me criei, ainda hoje me sabe bem ouvi-la ou vê-la escrita.

O Cimo da Régua ia, mais ou menos, do Valente Novo à Casa da Fortuna, de um lado. Do outro, estendia-se da Valente Velho às lojas de ferragens do João Guerra e Domingos Figueiredo. Perpendicularmente, na Rua Serpa Pinto, chegava à loja do Antão, frente a frente com a Associação Comercial.

Pelo seu intenso e variado comércio, o Cimo da Régua era, pode dizer-se, a nossa "Baixa".

Toda a gente se via, toda a gente comprava isto e aquilo no Cimo da Régua.

O ponto nevrálgico desta nossa "Baixa" era a loja do Zé Pinto, onde se podia comprar do melhor arroz ao melhor café, do melhor papel de carta à melhor escova. Também se podiam engraixar os sapatos em cadeirão episcopal montado num pequeno estrado. O "Vintecinco", mesmo com um grãozinho na asa, engraixava a preceito, dava as novidades e vendia as cautelas delicadamente. Era na loja do Zé Pinto que se encontravam os figurões da Régua para longas cigarradas e longas conversas, a que não faltava uma pontinha de má língua local e nacional. O Zé Pinto, dentro do balcão, saía da conversa para atender os fregueses. Mesmo aos que apertava a mão com efusiva fraternidade, não deixava de apertar os preços do que viessem comprar. Implacável até ao tostão !

Fora da loja o Zé Pinto era a pessoa mais magnânima do mundo. Num passeio de amigos gostava de pagar tudo a toda a gente.

Muito perto do Zé Pinto, ficava o Quartel dos Bombeiros. Aí se reuniam estudantes, empregados e artífices. Além de mesas de jogo, havia um bilhar e uma grande estante de bons livros. As instalações eram de tal maneira exíguas que os carros se viam e desejavam para sair e entrar. Quando tocava o fogo, toda a gente que andasse por ali se juntava para assistir às manobras. O globo de entrada era tão baixo que o Justino Nogueira, garboso porta-estandarte, o partiu algumas vezes com a ponta do mastro.

- Ó Justino! Ó Justino... agacha-te! - avisavam os companheiros.

Junto dos Bombeiros ficava a oficina do João Latas. A oficina era de latoaria, mas tinha uns prateleirões até ao teto, onde adormeciam os mais variados artigos de ferragem.

Pelo seu temperamento e pela sua longa história de estranhas atitudes, o João Latas era, como então se dizia, um maduro. Foi das primeiras pessoas da Régua a lidar com automóveis, dando pelas escabrosas estradas de então grandes passeios com as pessoas gradas da terra. Chegavam a ir à Galiza o que, na altura, era longe e arriscado como ir ao fim do mundo. São muitas e pitorescas as aventuras que se contavam do Joâo Latas ao volante.

De tão maduro que era, tanto podia responder como não corresponder aos cumprimentos de quem lhe entrasse na oficina. Também podia ter toda ou nenhuma paciência com os fregueses:

- Boa tarde, senhor João!

- ... ...

- Tem desandadores assim, assim...?

- Tenho... tenho... Faltam-me ele desandadores desses! Olhe, estão lá em cima a ouvi-lo...

E apontava uma prateleira lá do alto.

- Faça o favor de me dar um...

- Disso está você bem livre! Tenho o escadote lá para trás... não estou para o ir buscar - respondia, continuando o tam-tam na lata que estava a afeiçoar.

E o freguês lá ia embora a resmungar, lamentando não ter ido ao João Latas em melhores dias...

....

- Bom dia, senhor João!

- Bom dia, ora viva o meu amigo! Que o traz por cá?

- Ando, desde o Porto, à procura de uma navalha espanhola, de duas lâminas e...

- Tenho ainda umas ou duas... - cortava o João Latas.

- Quero uma.

- Se tiver dinheiro para a levar!

- Ó senhor João... então não hei-de ter!?

- Pode não ter... pode não ter... eu lhe digo... estas navalhas são de antes da guerra... feitas as contas ao preço actual...

O João Latas caía, então, numa folha de costaneira, a fazer contas sobre contas, até afirmar, peremptório:

- A navalha está-lhe em 200$00 e pico.

- Ó senhor João... mas isso é uma fortuna!

- É pegar ou largar !
O freguês largava, com o fogo no rabo, sem a desejada navalha e sem compreender tamanho desconchavo.

O João Latas era também um caso único a mandar as contas aos seus fregueses. Tanto as mandava logo, com a solda ainda quente, como depois de muita insistência de quem lhas pedia.

Uma vez, mandou à Senhora D. Branca Martinho, por quem, como toda a gente, tinha o maior respeito, a seguinte conta:

- Um fundo novo numa cafeteira de litro - grátis.
- Um pingo numa panela - grátis.
- Soldar a asa de um funil - grátis.
- Mão nova num regador velho - grátis.
- Total: 4 serviços grátis a 2$50 - 10$00.

...Aquele Cimo da Régua... ... ...
- Por Camilo de Araújo Correia - Villa Regula de Março de 1999.
Crónica - o Douro de anteontem

O nosso rio era caudaloso no Inverno e sereno do findar da Primavera ao findar do Outono. Sempre alegre e corredio, o Douro era um potro à solta entre as margens. Vieram depois as barragens meter-lhe o freio e o bridão. Fizeram dele um amestrado e pachorrento cavalo de circo.

Muito lucramos com esta sucessão de enormes espelhos de água, permitindo um desporto e um turismo impensáveis no lombo de um potro irrequieto. Mas também muito perdemos...

O estrujão, o sável e a lampreia, de tanto marrarem contra o cimento das barragens, acabaram por desistir de procurar para a desova os rios ainda abertos às suas imperiosas condições de procriação.

Entre nós conhecido por solho, o estrujão foi-se extinguindo. Dele ficou apenas um dito, de que muita gente já não saberá a origem. Dormir como um solho quer dizer dormir profunda e serenamente. A imagem vem do tempo em que esses grandes peixes do nosso rio se deixavam levar pela corrente, muito quietos, como se dormissem à flor da água.

As lampreias também deixaram de se vender pelas ruas da Régua, oferecidas em regadores, ainda vivas, num desespero de pouca água e pouco espaço. Meu pai, médico de muitas caridades, recebia em abundância os mimos de cada época do ano. As lampreias eram, por vezes, tantas que era preciso largá-las no tanque do quintal, para lhes dar vazão. Agarrá-las era depois um alvoroço de gritinhos e fugas precipitadas.

O sável era ainda mais abundante que a lampreia. Por toda a Régua passavam homens e mulheres a apregoá-lo com dois ou três enfiados num vime. O saboroso peixe chegava a todas as casas, à boca do rico e do pobre, frito ou de escabeche.
O Dr. Júlio Vilela falava, a lamber o beiço, de um sável na telha arranjado pelos homens do rio. E descrevia:

- O sável, bem temperado com azeite, alho, pimenta e loureiro, entala-se entre duas telhas. Depois, é só ir virando sobre uma fogueirinha de lenha. Além de ficar delicioso, a espinha desembainha-se como uma espada.

O Dr. Júlio e os seus petiscos...

Um ano, o sável foi tão abundante que chegou a exaltar o homem mais sereno da Régua - José Afonso de Oliveira Soares.

Pintor e poeta de grande mérito, veio a merecer um busto no jardinzinho bem perto da casa onde morou.

Diz, assim, o pedestal:

Talento e bondade
Flor de simpatia
Que nos merecia
Esta saudade.

Também mereceu da Câmara Municipal uma segunda edição da sua História da Vila e Concelho do Peso da Régua.

Pois, um dia, o nosso sereníssimo Afonso Soares, cheio de sável até ao simpático bigode, largou de casa a esbracejar, ao ver que a esposa se preparava para lhe servir ao almoço, mais uma vez, umas postas de sável frito.

Foi do Cruzeiro para os lados da estação a remoer vinganças num grande nuvem de tabaco. Entrou na Pensão Borges e foi sentar-se à mesa mais recolhida. Logo se aproximou, todo mesureiro, o Adelino Gomes.

- Que temos para o almoço, Adelino?

- Para o senhor Soares arranjam-se umas postinhas de sável...

Ao virar do segundo para o terceiro milénio o Douro de anteontem acordou estremunhado do sono telúrico. Tomou o freio nos dentes, soltou-se da corrente e largou à desfilada pelas margens, galgando-as até onde lhe chegou o fôlego. Por quatro vezes, casas e vinhedos lhe sofreram a fúria. A Princesa do Douro ficou irreconhecível por uns dias. Mas, ao sol de Março pôde mirar-se ao espelho do seu rio, outra vez vaidosa e conformada.
- Camilo de Araújo Correia, Villa Regula de Março de 2001.
Crónica - O Pecador

O senhor Valentim era um homem triste e de poucas falas. Dizia-se, até, que fôra para aquela aldeia remoer grandes pecados da cidade.

Passava o ano em redor da vinha e da horta que granjeava com exemplar esmero. As árvores e o cão, que sempre tinha, eram a sua família e o seu único convívio.

Quando alguém o abordava ou quando aparecia na venda a fazer compras, era agradável de falas e de modos. Mas parecia sempre morto por regressar à sua tristeza, ao seu pequeno mundo de silêncio.

Ninguém lhe conheceu mulher legítima ou devaneio de ocasião. Eu próprio, quando o visitei na única doença que teve, não vi por toda a casa retrato ou sinal de família desfeita. Chamou-me a atenção uma litogravura de Nossa Senhora do Socorro colada na parede, como um selo, por cima da barra da cama.

Depois de o auscultar, olhei para a gravura e disse-lhe, sorrindo:

- Não o fazia religioso, senhor Valentim...

- E não sou. Essa gravura que aí vê comprei-a no ano em que resolvi não voltar à procissão do Socorro.

- Mas porquê? Fazia-lhe bem ir à festa, sempre se distraia um pouco...

- Eu sou enjeitado, senhor doutor; e sempre me senti enjeitado por onde andei, até me fixar aqui.

- Mas... as pessoas parecem estimá-lo...

- Estimam, sim... mas foi Nossa Senhora do Socorro que me fez sentir calor humano pela primeira vez na vida.

- Mais uma razão para não deixar de a visitar! Dizem-me que nem à Régua vai...

- Ia todos os anos... mas, a certa altura, senti que andava a pecar...

- A pecar?!

- Sim... a pecar. O senhor doutor não compreende... É preciso ser enjeitado para sentir toda a bondade e beleza de Nossa Senhora do Socorro. Muitos anos a olhei, da beira do passeio, como se visse a mãe que nunca tive. Depois... depois dei comigo a olhá-la como se ela fosse a mulher que nunca reparou em mim...

Viveu ainda muitos anos. Era um homem só, com a sua vinha, o seu cão e o seu pecado.
- Camilo de Araújo Correia - Extraído da brochura das festas de Nossa Senhora do Socorro de Agosto de 1982.

Camilo de Araújo Correia - Filho de peixe sabe nadar

Camilo de Araújo Correia, filho do escritor João de Araújo Correia, nasceu no Porto em 1925, mas vive na Régua desde os três anos. Aí fez a instrução primária na escola oficial e o 1º ciclo do liceu no extinto Colégio Reguense. Completou o curso nos liceus de Lamego e Vila Real. Frequentou depois a Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, onde viria a formar-se em 1953.Enquanto estudante de Coimbra, viveu sempre em república (o Palácio da Loucura) e despertou para a literatura, colaborando nos jornais académicos da época - A via latina, A Briosa e o Pagode. Em 1961 foi mobilizado para Moçambique, integrado como anestesista no Hospital Militar 338, destinado a Porto Amélia. Ajudou a formar e a dinamizar o “Grupo Cénico de Porto Amélia”. Além de ter sido ensaiador, escreveu para um dos espectáculos daquele grupo a revista Atracou o "Troça Nova". Mantém no Arrais uma coluna semanal, desde 1978. Publicou entre outros: Histórias na Palma da Mão; Coimbra Minha; Livro de Andanças; Na Rota do Sal; Médicos, Doentes e Outras Gentes; Coimbra, Outra Vez. - Entrevista completa em: http://www.trasosmontes.com/eitofora/numero11/entrevista2.html

(Transferência de arquivos do sitio "Peso da Régua" que será desativado em breve)

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Uma crónica intemporal - Era em Agosto…

*M. Nogueira Borges
Era em Agosto com as águas deslizando para as hortas, os vinhedos repletos de verde e de doçura, os homens de coletes a tiracolo e sacholas pelos ombros, as mulheres mastigando broa e encolhendo ciúmes, as crianças a jogarem às escondidinhas no adro da capela e nas curvas dos quelhos, os cães e os gatos a barafustarem nos terreiros do casario perseguindo galinhas e garnizés, o bêbedo de sempre arrancado à taberna pelo filho desgostoso ou pela mulher já habituada.

A tarde acabava assim, com o sol a morrer devagarinho por detrás das montanhas, uma fresca macia alegrando as almas, os velhinhos do Asilo a derreterem minutos para a ceia e o médico a abandonar a Casa do Povo.

A menina senta-se ao piano e os seus dedos brancos deslizavam suavemente pelo teclado.

As Rosas da Despida desfolhavam-se em emoções e os sons espalhavam-se pelos corredores e escapuliam-se, serenamente, pelas janelas abertas, flutuando no silêncio da noite como fantasias de crianças. Ecoavam além, nos contrafortes dos montes ou no fundo do vale a quem os antigos chamavam poço do vinho.
Era Agosto e as festas do Socorro anunciavam-se. As ornamentações engalanavam as ruas, os carrinhos e os carrocéis enchiam a Alameda e as iluminações não deixavam sombras para namorar. Quando as lâmpadas desenhavam o campanário da Igreja do Peso muitos olhos se desviavam lá para cima a ver se os Remédios já cintilavam.

Era um tempo em que a perseverança não se excepcionava e a terra cavada com suor dum esforço ancestral tinha uma história feita de lendas e as gentes sonhos sem fim onde se recriavam a habitualidade, se espevitavam futuros, se diversificavam motivações e se engrandeciam espaços.

As Festas do Socorro eram um compasso de espera na roda do tempo e do trabalho, estreias de fatos e vestidos, arranjos de cabelo nos salões da Vila que a Régua ainda não era cidade de nome.

Era a romaria dos desenraizados do litoral em retorno aos almoços de cabrito assado e arroz de forno nas mesas familiares. As estradas enchiam-se de carros e de excursões, os comboios fumegavam na Estação, um mar de gente inundava a princesa do Douro e todos eram conhecidos.

Havia crianças ao carrachol e idosos amparados a bengalas, cantadores de chulas, tocadores de realejos, bombos, ferrinhos e concertinas. Dançava-se no meio das ruas e em todos os cantos onde o pó escondia feições.

Os rapazes sopravam em cornetas de barro, mercavam-se panos, mantas e potes para a vindima, voavam ilusões sobre o murmúrio humano, as gargalhadas estrondeavam, avinhadas, nos tascos e cafés, à mistura com o tilintar dos copos, e as tristezas estavam trancadas nas casas vazias das aldeias em redor.
Era em Agosto e, quando a Senhora do Socorro se passava, no andor florido, por entre alas de bombeiros e anjinhos, a multidão esquecia a profanidade e ajoelhava-se em silêncio de Fé encomendando promessas, gemendo aflições e cantando alegrias. A Senhora a todos sorria numa magnanimidade de ternura e perdão que marejava os olhares dum povo cheio de memórias de sacrifício glosadas por poetas e prosadores.

Era Agosto e as uvas amadureciam à espera dos cestos…
- In  Boletim das Festas de Nossa Senhora do Socorro.


*Manuel Coutinho Nogueira Borges é escritor e poeta do Douro-Portugal. Nasceu no lugar de S. Gonçalo, freguesia de S. João de Lobrigos, concelho de Santa Marta de Penaguião, em 12.10.1943. Faleceu em 27 de Junho de 2012 na cidade de Vila Nova de Gaia. Frequentou o curso de Direito de Coimbra, cumpriu o serviço militar obrigatório em Moçambique, como oficial mil.º e enveredou pela profissão de bancário. Tem colaboração dispersa por diversos jornais, nomeadamente: Notícias (de Lourenço Marques); Diário de Moçambique (Beira), Voz do Zambeze (Quelimane), Diário de Lisboa, República, Gazeta de Coimbra, Noticias do Douro, Miradouro, Arrais e outros. Em 1971 estreou-se com um livro de contos a que chamou "Não Matem A Esperança". (In 'Dicionário dos mais ilustres Trasmontanos e Alto Durienses', coordenado por Barroso da Fonte. Manuel Coutinho Nogueira Borges está no Google.
  • Manuel Coutinho Nogueira Borges neste blogue.
Clique nas imagens para ampliar. Texto e imagens cedidas pelo Dr. José Alfredo Almeida. Fotos de Miguel Guedes. Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Agosto de 2012 e em homenagem ao saudoso Amigo MANUEL COUTINHO NOGUEIRA BORGES. Este artigo pertence ao blogue Escritos do Douro. É proibido copiar, reproduzir e/ou distribuir os artigos/imagens deste blogue sem a citação da origem/autores/créditos. 

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Em exposição no Matadouro Municipal: O CORETO DA RÉGUA!

(Clique na imagem para ampliar. Imagem original daqui)

É irónico. Mas é real e triste em simultâneo, pois o Coreto do Jardim Alexandre Herculano de saudosa memória e de tantas histórias e inesquecíveis momentos musicais escritos no tempo e no passado da bela cidade de Peso da Régua, apodrece abandonado lá pelo velho matadouro municipal de Godim.

Alertado pelo "movimento", que sinto justo, de alguns conterrâneos inconformados com o triste e lacónico fim dado ao nosso Coreto, aqui deixo palavras recebidas que me permito transcrever e também um apelo ao Senhor presidente do Munícipio da Régua para que reveja com atenção e carinho o assunto. Afinal, o hoje não existiria sem passado... E este Coreto do Jardim Alexandre Herculano merece respeito e ser preservado (o que não deve ser assim tão caro) porque faz parte do passado e das queridas lembranças que orgulham e emocionam muitos de nós, "vareiros" que estimamos a nossa cidade da Régua e acreditamos veementemente em seu futuro.

  • O CORETO: No Jardim Alexandre Herculano (de saudosa memória), frente à Câmara Municipal há muitos anos existiu um belo coreto, onde diversas bandas de música ali se exibiam, nas Festas do Socorro, perante a atenção de inúmeros apreciadores, claro que, com o desaparecimento do jardim, o mesmo sucedeu ao coreto, constando, depois, que se encontrava a “descansar”, no Matadouro Municipal, às intempéries, prevendo-se que a sua “saúde” não seja das melhores.
    Acontece que, com a nova Câmara, esta, em nosso entender, deve retirar o coreto, e colocá-lo em lugar visível, talvez na Alameda dos Capitães, para que possamos, nas próximas Festas do Socorro, ouvir as bandas musicais. - Fernando Guedes/Noticias do Douro.

  • O CORETO NA RÉGUA: Durante muito anos, existiu no então jardim Alexandre Herculano, em frente à Câmara Municipal de Peso da Régua, - até que alguém teve a infeliz ideia de o fazer “desaparecer” - um artístico Coreto, que serviu, durante anos a fio, as Festas do Socorro, os entusiastas pela música, para que se deleitassem a ouvir as bandas que ali actuavam. Em Novembro de 2005 tivemos oportunidade de chamar à atenção da então eleita Câmara Municipal, que dentro de dias iria tomar posse, para este “desaparecimento” mas não surtiu, até hoje, qualquer efeito e, assim, com as Festas de Nossa Senhora do Socorro “à porta”, vimos (novamente) relembrar o assunto, pois o Coreto merece, para que tenha um lugar visível como sempre teve, para satisfação de todos. Claro que, durante todo este tempo em que está a “morar noutras bandas”, deve necessitar de uma grande reparação, dadas as intempéries que por ele têm passado. Que alguém se recorde dos serviços que o Coreto prestou e tome as devidas providências para contentamento de todos quantos dele ainda se recordam! Esperamos que, com este novo reparo, o Coreto não fique novamente no esquecimento e apareça a entidade que tenha consideração com o que aqui escrevemos. - Fernando Guedes/Notícias do Douro.

  • Blogue "O Coreto Alexandre Herculano" que dinamiza a AAC-Associação dos Amigos do Coreto - Aqui!

sábado, 28 de maio de 2011

LOUVOR À ASSOCIAÇÃO HUMANITÁRIA DE BOMBEIROS VOLUNTÁRIOS DO PESO DA RÉGUA


Dr. José Silva Pinto

Teve o Senhor Presidente da Direcção desta mais que centenária e prestigiosa Associação, a gentileza de convidar-me a elaborar um texto com os principais eventos que conheci desta e nesta Associação – a que estou a aceder com muita honra para mim e com o máximo prazer, visto que se trata de algo da minha terra natal. Aliás, esta e a Santa Casa de Misericórdia são as obras de carácter assistenciais e humanitárias, principais ou nºs 1 do Peso da Régua.

Vou tentar, se a memória me não trair, descrevê-los cronologicamente.

1. Conheci a existência da Associação quando, ainda miúdo, ouvia uns gritos estranhos e perguntei o que eram tais gritos. Explicaram-me o que era, donde vinha e o que iam fazer os “Bombeiros”. Fiquei muito e gostei do modo com que explicaram tudo, as alegrias e tristezas como as pessoas se exprimiram acerca da Associação e Bombeiros!

2. Vi, pela 1ª vez, o Quartel quando minha mãe me pediu, para vir ao chamado, então “cimo da Régua”, onde 1 agente da GNR, dirigia o trânsito automóvel, então em 3 sentidos. Vim à Casa Fortunato e à mercearia do Sr. José Pinto da Fonseca. Perguntou-me a que família eu pertencia e o lugar onde morava; lugar: então, “Cais de Baixo” ou “Fundo da Régua”; pelos meus pais, disse-me que ainda éramos parentes por parte de meu pai: “Pinto”. Aproveitei essa confiança e pedi-lhe para me indicar onde era o “Quartel dos Bombeiros”. Dispôs-se logo a vir comigo e indicou, e perguntou-me se eu queria entrar para o conhecer melhor. Aceitei. Senti-me pequeno dentro do edifício e das viaturas e alguns Bombeiros fardados! Gostei imenso e contei em casa.

3. Dali em diante, sempre que ouvia tocar a “sirene” e se podia, vinha, com outras pessoas, saber onde ocorria o incêndio; alguns viam-se, outros não, consoante o lugar onde aconteciam. Eu tudo admirava! Com a idade, o vir ao “cimo da Régua”, tornou-se mais frequente e entrar para admirar as viaturas, com o que me orgulhava e algo me satisfazia!

4. A 1ª vez que vi um incêndio, de perto e de altas proporções foi quando se deu esse incêndio na “Casa Viúva Lopes”, perto da CP. Vinha eu, minha mãe e minha irmã e outros vizinhos (as) da “Novena de Nossa Senhora do Socorro quando, perto do Largo dos Aviadores, ouvimos tocar a sirene. Olhamos e vimos o fumo que vinha dos lados da CP. O grupo dirigiu-se para lá, quando, já de longe, começamos a ver umas grandes labaredas, e (como eu nunca tinha visto), disseram o nome da “Casa …”, e fomo-nos aproximando, quando “Agentes da GNR” impediram toda a gente de se aproximar mais (a nascente e do poente). Ardia!... Ardia!... quando começamos a ver uma “chaminé” que começava a tombar e as pessoas a gritar!... Eis senão quando vimos a chaminé cair, aos poucos e, com um grande estrondo, se desfez onde parou – qual “gigante adamastor”! Inesquecível! Ninguém arredou pé sem saber se algum bombeiro teria sofrido algo. Quando tal, começou um sussurro a dizer que parecia que tinha morrido o Sr. “João dos Óculos”. Quando tal, confirmou-se a verdade do tal sussurro!... Era assim conhecido porque era o único bombeiro que, naquele tempo, usava óculos!... Eu conhecia-o bem – parece-me que ainda estou a vê-lo: de estatura média e muito mexido, respeitado e admirado.
5.  No dia seguinte e seguintes, não se falava noutra coisa e, quando alguém lembrava o Sr. “João dos Óculos”, ninguém continha as lágrimas! Quando, num dos dias seguintes, se celebraram as “exéquias fúnebres”, a igreja matriz foi pequena para receber toda a gente que queria rezar, render-lhe a última homenagem e um dar-lhe “Adeus” sentido. O semanário local encheu-se só com este inusitado evento e com o “bombeiro mártir” do seu dever, generosa e exemplarmente cumprido. Estiveram presentes altas individualidades de todo o distrito. À entrada dele, na igreja, no momento da elevação da S. Hóstia e do S. Cálice, bem como no final, os clarins fizeram chorar todos os olhos e até pareceu que as santas imagens acompanharam este clamor! Sendo tudo “triste”, foi muito “bonito”!... o mesmo aconteceu quando a “urna” desceu à terra nua e fria!!!

6.  Quando já eu passeava na Régua, lamentava, no meu interior, o novo Quartel continuar por acabar, o que, creio eu, levou dezenas de anos. Até que chegou a ocasião do uso de novo Quartel que, além do lugar e dos espaços, é, em arquitectura, um dos mais bonitos que tenho visto; ficando, assim a Régua com um Quartel adequado, além de ser a 1ª Associação Distrital de Bombeiros; vai fazer 131 anos, em 28.11.
7. Mais tarde, alguém se eco que a Associação necessitava de um novo “Estandarte”. Meu pai - Manuel Pinto - estava na Venezuela, como imigrante. Não se fez esperar muito. Enviou o custo para a sua aquisição, e a Direcção convidou-nos: minha mãe e os seus 5 filhos, a irmos vê-la. Minha irmã Maria de Fátima tinha o “curso de bordados da Singer” e disse que a Bandeira não estava perfeita. Perguntaram-lhe o que faltava. Respondeu: “o bordado em toda a volta”. Ficaram a pensar… Ela ofereceu-se para o fazer!... Ainda hoje é o Estandarte que embeleza a participação de Bombeiros na Festa Anual de Nossa Senhora do Socorro e outras festividades e eventos.

8. Pouco depois, a Associação adquiriu uma nova Ambulância. A Direcção teve a amabilidade de convidar a minha irmã do meio – a Maria Celeste (Celestinha) para ser a madrinha. Ainda há pouco apareceu na foto de umas destas utilíssimas Histórias, de véu branco, como era costume então, em actos religiosos, na bênção… e “branco”, pois era adolescente.

9.  O fim no meu “curso teológico” teve celebração solene na Matriz. 4 Bombeiros abrilhantaram-na: 2 tocaram cornetim (?), lindamente, por ocasião das “comemorações e elevações”; 2 outros levantaram o estandarte, os outros 2 estenderam o pano lindo a bandeira.

10. Uma palavrinha dirigida ao Senhor Presidente da Direcção, Dr. JOSÉ ALFREDO ALMEIDA. É um HOMEM, todo motivado e dedicadíssimo à Nobre Causa dos BOMBEIROS. Pertence também à Direcção Distrital, bem como a nível Nacional, e tem sido incansável em aumentar a nossa Associação, cada vez melhor e maior, a todos os níveis, recebendo todo o respeito, gratidão e admiração de todos os reguenses!

À POPULAÇÂO REGUENSE

11. Para que consigamos melhor o referido escopo, façamo-nos todos “SÓCIOS” dos BOMBEIROS VOLUNTÁRIOS REGUENSES. Como diz o slogan muito usado “AJUDEMOS PARA SERMOS AJUDADOS QUANDO NECESSITARMOS”!
NOTA: Agradecemos ao Dr. José Silva Pinto por ter colaborado neste nosso “arquivo” com um inédito sobre as suas memórias dos bombeiros da Régua que não deixam de ser um contributo muito importante de quem viveu e presenciou factos que interessam à história da Associação.
Como revela neste seu escrito, os bombeiros não esquecem o gesto de generosidade do seu pai, Manuel Pinto que, quando esteve emigrado na Venezuela, ofereceu o actual Estandarte da Associação, nem o de sua irmã Maria Celeste Pinto, uma “madrinha” numa cerimónia festiva.

O nosso bem-haja pelo “LOUVOR” que atribui á Associação e aos seus bombeiros da Régua. Eles sentem-se gratos e reconhecidos pela sua generosa atitude.
- José Alfredo Almeida em Maio de 2011 - Escritos do Douro.
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Louvor à Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua
Jornal "O Arrais", Quinta feira, 19 de Maio de 2011
(Dê duplo click com o "rato/mouse" para ampliar e ler)
Louvor à Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Relembrando - UM DE NÓS - Em Memória de Jaime Ferraz Gabão

Em Memória de Jaime Ferraz Gabão
Nasceu na cidade de Peso da Régua em 13 de Abril de 1924.
Com 68 anos, faleceu a 18 de Junho de 1992, dia do Corpo de Deus, em Lisboa - onde, uns dois meses antes, se submetera a melindrosa intervenção cirúrgica. Portanto hà 23 anos!

UM DE NÓS !
Morreu Jaime Ferraz Gabão. Morreu um de nós, os do ARRAIS. Morreu, por ventura, o colaborador que mais lhe respeitava uma das linhas mais vincadas do seu carácter, bem definida no primeiro número. Dizia-se na apresentação, ENCONTRO NA RUA, que "um jornal é também a história e a consciência de uma terra". Ora, na grande maioria das suas crónicas, Jaime Ferraz Gabão foi a história e a consciência da Régua. Recordou acontecimentos longínquos, quando ao presente lhe pareceram oportunos, e sublinhou o dia a dia, sempre que lhe adivinhava a utilidade de algum eco no futuro. São incontáveis as figuras e figurinhas que desfilaram nas suas memórias da Régua antiga. Trouxe á luz dos jornais, famílias inteiras, quase extintas, o que sempre provocava nos descendentes uma onda de simpatia e gratidão, Tive a oportunidade de ler algumas cartas, vindas de longe, de uma comoção difícil de esquecer. Voltou a dar vida às ruas velhinhas, de comércios e ofícios, hoje fechados na própria nostalgia dos tempos e costumes que não voltam. 
Jaime Ferraz Gabão era um reguense pelo nascimento e pelo coração, mas de origem vareira. Sempre se orgulhou dessa origem. Viveu a geminação Régua-Ovar como um encontro dentro de si próprio. Seguiu-a do seu canto, pequeno mundo de livros e papéis. A falta de saúde não lhe permitiu assistir às cerimónias oficiais.
Estivesse onde estivesse, o seu coração pulsava pela Régua. São disso eloquente testemunho as HISTÓRIAS DO SPORT CLUBE DA RÉGUA e do NOTÍCIAS DO DOURO.

Jaime Ferraz Gabão foi um jornalista espontâneo. Como tantos outros expoentes do nosso jornalismo, foi homem de formação sem formatura. O sentimento dos jornais, o espírito atento e a experiência, foram fazendo dele o apreciado jornalista que veio a ser.
Nos muitos anos de África, passados em Porto Amélia, foi colaborador de quase todos os jornais moçambicanos, muito especialmente do DIÁRIO de Lourenço Marques. Neles praticou um jornalismo de noticiário oportuno e de inabalável sentimento patriótico. Quando a descolonização lhe desmantelou a vida, ficou a lamentar mais os prejuízos da terra portuguesa, do Atlântico ao Índico, que as suas próprias perdas. Foi em Moçambique um saudoso de Portugal e em Portugal um saudoso de Moçambique.

No seu regresso de África, veio a ser, pouco a pouco, a alma e a sobrevivência do NOTICIAS DO DOURO. Por fim, era ele, com a dedicação dos tipógrafos, a conseguir, em cada semana, um número difícil.
Quando o NOTICIAS DO DOURO sofreu, bruscamente, uma grande mudança de clima, Jaime Ferraz Gabão sentiu um desconforto tão inesperado como injusto. Para se recompor da enorme frustração, não lhe bastava ser correspondente do PRIMEIRO DE JANEIRO e colaborador esporádico do JORNAL DE MATOSINHOS. Precisava de mais espaço no jornalismo regional. Teve-o da magnânima e hospitaleira VOZ DE TRÁS-OS-MONTES e, depois, do ARRAIS. Com inquebrantável assiduidade, colaborou nestes jornais do seu espírito e do seu coração, até às últimas migalhas de saúde.

Pelo seu desinteressado altruísmo, Jaime Ferraz Gabão veio a merecer da Cruz Vermelha Portuguesa a "Medalha de Agradecimento" e a "Medalha e Cruz de Mérito". O Sport Clube da Régua, distinguia-o ,desde 1965, como "Sócio de Mérito".
Depois de completar 50 anos de jornalismo, muitas foram as homenagens e distinções merecidas por Jaime Ferraz Gabão: Rotary Clube da Régua, Clube da Caça e Pesca do Alto Douro, Voz de Tráz-os-Montes e Arrais; "Medalha de Mérito Jornalístico" da Câmara Municipal de Peso da Régua e "Louvor pelos relevantes Serviços Prestados à Imprensa Regional" da Presidência do Conselho de Ministros.

A Régua mais Régua, a Régua de Jaime Ferraz Gabão, sentiu bem e logo a sua perda, acompanhando-lhe o féretro ao cemitério do Peso, com recolhida pausa na Igreja Matriz, para celebração de missa de corpo presente. Foram celebrantes os padres António Maria Cardoso e Vital Capelo, por ausência inevitável do padre Luis Marçal.
Toda a cerimónia foi um profundo adeus a Jaime Ferraz Gabão. Um adeus, que as eloquentes palavras do Dr. António Maria Cardoso, seu velho e querido amigo, souberam prolongar no coração e no espírito de toda a gente. Foi uma evocação circunstânciada e sentida. Tão sentida que pôde acender as primeiras saudades de Jaime Ferraz Gabão, pouco antes da terra, da sua terra o tirar, para sempre, da nossa companhia.
- Peso da Régua, Junho de 1992, Camilo de Araújo Correia.*
*Agradeço a José Alfredo Almeida os recortes do Arrais oferecidos e que me permitiram a transcrição integral deste artigo do também já saudoso, companheiro e Amigo Dr. Camilo de Araújo Correia.
  • Em tempo de festas de Nossa Senhora do Socorro na cidade da Régua, recordo Jaime Ferraz Rodrigues Gabão!  
  • Jaime Ferraz Rodrigues Gabão citado no portal do Sport Club da Régua - Aqui!

sexta-feira, 18 de junho de 2010

UM DE NÓS - Em Memória de Jaime Ferraz Gabão

Em Memória de Jaime Ferraz Gabão
Nasceu na cidade de Peso da Régua em 13 de Abril de 1924.
Com 68 anos, faleceu a 18 de Junho de 1992, dia do Corpo de Deus, em Lisboa - onde, uns dois meses antes, se submetera a melindrosa intervenção cirúrgica. Portanto hà 18 anos!

UM DE NÓS !
Morreu Jaime Ferraz Gabão. Morreu um de nós, os do ARRAIS. Morreu, por ventura, o colaborador que mais lhe respeitava uma das linhas mais vincadas do seu caráter, bem definida no primeiro número. Dizia-se na apresentação, ENCONTRO NA RUA, que "um jornal é também a história e a consciência de uma terra". Ora, na grande maioria das suas crónicas, Jaime Ferraz Gabão foi a história e a consciência da Régua. Recordou acontecimentos longínquos, quando ao presente lhe pareceram oportunos, e sublinhou o dia a dia, sempre que lhe adivinhava a utilidade de algum eco no futuro. São incontáveis as figuras e figurinhas que desfilaram nas suas memórias da Régua antiga. Trouxe á luz dos jornais, famílias inteiras, quase extintas, o que sempre provocava nos descendentes uma onda de simpatia e gratidão, Tive a oportunidade de ler algumas cartas, vindas de longe, de uma comoção difícil de esquecer. Voltou a dar vida às ruas velhinhas, de comércios e ofícios, hoje fechados na própria nostalgia dos tempos e costumes que não voltam. 
Jaime Ferraz Gabão era um reguense pelo nascimento e pelo coração, mas de origem vareira. Sempre se orgulhou dessa origem. Viveu a geminação Régua-Ovar como um encontro dentro de si próprio. Seguiu-a do seu canto, pequeno mundo de livros e papéis. A falta de saúde não lhe permitiu assistir às cerimónias oficiais.
Estivesse onde estivesse, o seu coração pulsava pela Régua. São disso eloquente testemunho as HISTÓRIAS DO SPORT CLUBE DA RÉGUA e do NOTÍCIAS DO DOURO.

Jaime Ferraz Gabão foi um jornalista expontâneo. Como tantos outros expoentes do nosso jornalismo, foi homem de formação sem formatura. O sentimento dos jornais, o espírito atento e a experiência, foram fazendo dele o apreciado jornalista que veio a ser.
Nos muitos anos de África, passados em Porto Amélia, foi colaborador de quase todos os jornais moçambicanos, muito especialmente do DIÁRIO de Lourenço Marques. Neles praticou um jornalismo de noticiário oportuno e de inabalável sentimento pátriótico. Quando a descolonização lhe desmantelou a vida, ficou a lamentar mais os prejuízos da terra portuguesa, do Atlântico ao Índico, que as suas próprias perdas. Foi em Moçambique um saudoso de Portugal e em Portugal um saudoso de Moçambique.

No seu regresso de África, veio a ser, pouco a pouco, a alma e a sobrevivência do NOTICIAS DO DOURO. Por fim, era ele, com a dedicação dos tipógrafos, a conseguir, em cada semana, um número difícil.
Quando o NOTICIAS DO DOURO sofreu, bruscamente, uma grande mudança de clima, Jaime Ferraz Gabão sentiu um desconforto tão inesperado como injusto. Para se recompôr da enorme frustação, não lhe bastava ser correspondente do PRIMEIRO DE JANEIRO e colaborador esporádico do JORNAL DE MATOSINHOS. Precisava de mais espaço no jornalismo regional. Teve-o da magnânima e hospitaleira VOZ DE TRÁS-OS-MONTES e, depois, do ARRAIS. Com inquebrantável assiduidade, colaborou nestes jornais do seu espírito e do seu coração, até às últimas migalhas de saúde.

Pelo seu desinteressado altruísmo, Jaime Ferraz Gabão veio a merecer da Cruz Vermelha Portuguesa a "Medalha de Agradecimento" e a "Medalha e Cruz de Mérito". O Sport Clube da Régua, distinguia-o ,desde 1965, como "Sócio de Mérito".
Depois de completar 50 anos de jornalismo, muitas foram as homenagens e distinções merecidas por Jaime Ferraz Gabão: Rotary Clube da Régua, Clube da Caça e Pesca do Alto Douro, Voz de Tráz-os-Montes e Arrais; "Medalha de Mérito Jornalístico" da Câmara Municipal de Peso da Régua e "Louvor pelos relevantes Serviços Prestados à Imprensa Regional" da Presidência do Conselho de Ministros.

A Régua mais Régua, a Régua de Jaime Ferraz Gabão, sentiu bem e logo a sua perda, acompanhando-lhe o féretro ao cemitério do Peso, com recolhida pausa na Igreja Matriz, para celebração de missa de corpo presente. Foram celebrantes os padres António Maria Cardoso e Vital Capelo, por ausência inevitável do padre Luis Marçal.
Toda a cerimónia foi um profundo adeus a Jaime Ferraz Gabão. Um adeus, que as eloquentes palavras do Dr. António Maria Cardoso, seu velho e querido amigo, souberam prolongar no coração e no espírito de toda a gente. Foi uma evocação circunstânciada e sentida. Tão sentida que pôde acender as primeiras saudades de Jaime Ferraz Gabão, pouco antes da terra, da sua terra o tirar, para sempre, da nossa companhia.
- Peso da Régua, Junho de 1992, Camilo de Araújo Correia.*
*Agradeço a José Alfredo Almeida os recortes do Arrais oferecidos e que me permitiram a transcrição integral deste artigo do também já saudoso, companheiro e Amigo Dr. Camilo de Araújo Correia.
  • Em tempo de festas de Nossa Senhora do Socorro na cidade da Régua, recordo Jaime Ferraz Rodrigues Gabão!  
  • Jaime Ferraz Rodrigues Gabão citado no portal do Sport Club da Régua - Aqui!

terça-feira, 11 de setembro de 2012

O Sal, o Peixe e o Vinho

*M. Nogueira Borges

Chegavam, de manhã cedo, a apregoar, “Sardinha fresca!... É de Ovar!...”

- De Ovar?... – perguntava-me intrigado.

- Então a sardinha não chega do Porto?... – continuava eu na minha estranheza.

Vinham em barricas, sem cabeça e sem vísceras, dispostas simetricamente, acamadinhas entre sal. Comiam-se, assadas nas brasas da lareira ou fritas na sertã, com batatas cozidas e nacos de broa, regadas com azeite poupado que, antigamente, as pessoas não besuntavam os queixos e uma almotolia tinha que dar para muitas e muitas refeições. Havia, até, quem as comesse cruas acompanhadas com uma cebola cortadinha aos bocados e enfeitadas com sal. Quando ia à Régua, lá estavam elas, bem à mostra, ali para a beira-rio, na Rua das Vareiras (há quem lhe chame Custódio José Vieira), a serem regateados com o dinheiro escondido num nó do lenço.

Lembrei-me desta memória ao ler, recentemente, um opúsculo do nosso escritor Camilo de Araújo Correia, intitulado NA ROTA DO SAL, escrito para a primeira sessão oficial do processo de geminação das cidades do Peso da Régua e de Ovar, ocorrida nos Paços do Concelho desta cidade, em 25 de Julho de 1991.

Nestas histórias de geminações são sempre mais abundantes as tradições orais do que a documentação de arquivo (dispersa e muitas vezes omissa) a justificarem, ancestralmente, a irmandade hodierna.

Camilo de Araújo Correia perguntou, procurou, e fez contas: “Há cerca de duzentos anos que a Régua e Ovar andam de mãos dadas pois se admite como cerca a fixação das primeiras colónias vareiras na Régua, logo a seguir à construção dos armazéns da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro, em 1790”.

A partir de então o futuro parece ter nascido com o plantio da vinha e o disciplinar do comércio vinícola. À nossa terra, afluíram gentes de muitos lugares, em demanda da melhoria económica, como se um eldorado de prosperidade resplandecesse na margem direita do Rio defendia pelos contrafortes do Peso com as suas casas senhoriais. Vieram muitos, mas, principalmente, vareiros e galegos que saibraram montes abandonados aquando da filoxera, plantaram americano, abriram lojas e tabernas, e transformaram a Régua num grande BALCÃO onde se fizeram e desfizeram fortunas pesando os comestíveis e medindo o tinto.

Os vareiros abandonaram as terras da beira-mar, trazendo, rio acima ou pelas estradas do Porto, o peixe e o sal que não tínhamos. Chegaram para governar a vida e não lhes recusaremos a façanha da aventura. Eram solidários, não se invejando nas vestimentas ou nos sorrisos de satisfação pelos negócios bem conseguimos. A montes e vales (mais a montes do que a vales), as quintas e casebres, as aldeias próximas ou remotas, levaram o sal ou a sardinha, à cabeça ou aos ombros, em carros de bois ruminando distâncias ou em jumentos resvalando nos pedregulhos. Alimentaram pobres e ricos quando a carne era luxo e as jornas mal davam para a sonhar. Misturaram o sangue com os autóctones e com os de além-Minho, criaram filhos e netos nesta fogueira de Verão quando acaba a Primavera e neste Inverno de gelo quando os vinhedos amarelecem e por cá andam nos nomes e nas caras com quem nos cruzamos no dia-a-dia.

Nesta hora de Festa, de amor e devoção à nossa Padroeira, é acto religioso lembrarmo-nos de quem nos ajudou a (re) criar o chão, a fermentar o sangue e a moldar as consciências.

Sem pretender adornar ou moralizar a saga duriense, lembremos, aos de hoje, os de ontem, e recordemos que o IMORTAL Escritor do Douro  - João de Araújo Correia - foi o único que soube retratar e elevar à verdadeira dimensão do seu esforço a gesta heróica deste povo: os de cá e os de fora que aqui se criaram e morreram libertando as almas por estes MONTES PINTADOS.

Quem desejar a abundância dos pormenores históricos que lhe leia O SEM MÉTODO e PALAVRAS FORA DA BOCA. Lá estão os vareiros e os galegos (lá estamos nós todos) na genuinidade rácica e na miscigenação sem adulterações.

- M. Nogueira Borges, Abril 1993, in Boletim da Festas de Nossa Senhora do Socorro.


 *Manuel Coutinho Nogueira Borges  é escritor e poeta do Douro-Portugal. Nasceu no lugar de S. Gonçalo, freguesia de S. João de Lobrigos, concelho de Santa Marta de Penaguião, em 12.10.1943. Faleceu em 27 de Junho de 2012 na cidade de Vila Nova de Gaia. Frequentou o curso de Direito de Coimbra, cumpriu o serviço militar obrigatório em Moçambique, como oficial mil.º e enveredou pela profissão de bancário. Tem colaboração dispersa por diversos jornais, nomeadamente: Notícias (de Lourenço Marques); Diário de Moçambique (Beira), Voz do Zambeze (Quelimane), Diário de Lisboa, República, Gazeta de Coimbra, Noticias do Douro, Miradouro, Arrais e outros. Em 1971 estreou-se com um livro de contos a que chamou "Não Matem A Esperança". (In 'Dicionário dos mais ilustres Trasmontanos e Alto Durienses', coordenado por Barroso da Fonte. Manuel Coutinho Nogueira Borges está no Google.
  • Manuel Coutinho Nogueira Borges neste blogue.
Clique nas imagens para ampliar. Texto cedidos pelo Dr. José Alfredo Almeida (JASA). Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Setembro de 2012 e em homenagem ao saudoso Amigo MANUEL COUTINHO NOGUEIRA BORGES. Este artigo pertence ao blogue Escritos do Douro. É proibido copiar, reproduzir e/ou distribuir os artigos/imagens deste blogue sem a citação da origem/autores/créditos. 

quarta-feira, 3 de junho de 2009

A bênção da bandeira


(Clique na imagem para ampliar)

Esta imagem de 29 de Novembro de 1959, da autoria do fotógrafo reguense Baía Reis, assinala a cerimónia da bênção de uma nova bandeira da Associação dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua que se realizou na Igreja Matriz com a bênção do distinto pároco Dr. Avelino Branco, acolitado pelo senhor José da Silva Pinto (filho do benemérito que mais tarde abraçou o sacerdócio e foi um dos fundadores da vizinha Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Fontes), por ocasião das comemorações do 79º aniversário da instituição.

Esta bela bandeira que, se encontra guardada no Museu da Associação (também visitável em: http://www.museudodouro.pt/exposicao_virtual/BVRegua.html), foi oferecida, com veneração aos bombeiros da Régua, por uma figura muito conhecida e carismática no Peso da Régua, o senhor Manuel Pinto, – temos uma fotografia sua que aqui mostramos em sua homenagem - já falecido, residente na freguesia de Canelas que, segundo sabemos, a essa data, se encontrava emigrado na Venezuela.

Pode ver-se, através desta imagem, que a bandeira é transportada pelas mãos de um grande bombeiro, o Chefe Joaquim Laranja e é agarrada numa das pontas pela madrinha do acto, a bonita menina Maria Celeste da Silva Pinto (actualmente emigrada em Inglaterra), uma filha deste nosso benfeitor. Em sua volta, encontram-se presentes vários cidadãos, ainda nossos conhecidos, que assistiam a esta singela cerimónia.

A bandeira é o símbolo máximo da Associação que a representa em todas as sessões solenes, desfiles de bombeiros, cerimónias oficiais, funerais de todos aqueles que estiveram a serviço desta nobre causa e ainda nas mais importantes festividades religiosas, como é o caso da procissão solene em honra de Nossa Senhora do Socorro, a quem os Bombeiros da Régua prestam homenagem e devoção.

Na bandeira estão todas colocadas as condecorações atribuídas a esta Associação e ao seu Corpo de Bombeiros, das quais destacamos as seguintes:

O grau de Cavaleiro da “Ordem da Benemerência” (1930), o grau de Oficial da “Ordem da Cruz de Cristo” (1931), o título de membro Honorário da “Ordem do Infante D. Henriques” (1984), o Crachá de Ouro da Liga dos Bombeiros Portugueses (1980), a Medalha de Honra da Câmara Municipal de Peso da Régua (1989), a Medalha, de Ouro de 2 estrelas (1977) da LBP, a Medalha de Mérito de Mérito, de grau Ouro da Federação dos Bombeiros do Distrito de Vila Real (1980) e ainda os Louvores da Câmara Municipal do Peso da Régua, Câmara Municipal de Armamar e do Governo (1904 e 1931).

Para além destas mercês honoríficas, destaca-se ainda o título de “REAL ASSOCIAÇÃO” que foi concedido à Associação pelo Rei D. Luís I, em 1882, - dois anos após a sua fundação -, designação que adoptou ainda durante alguns anos.

Esta importante distinção régia, apenas atribuída a algumas associações no nosso país, testemunha a grande importância que os bombeiros do Peso da Régua sempre tiveram.
Por fim, é de salientar que as associações humanitárias dos bombeiros voluntários de Ermesinde, de Cheires (Alijó) e da Figueira da Foz concederam à Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua, o honroso título de “SÓCIA HONORÁRIA”.
- Peso da Régua, Junho de 2009, José Alfredo Almeida.


- Outros textos publicados neste blogue sobre os Bombeiros Voluntários de Peso da Régua e sua História:
  • Comandante Lourenço de Almeida Pinto Medeiros: Fidalgo e Cavaleiro dos Bombeiros da Régua - Aqui
  • A força do voluntariado nos Bombeiros - Aqui!
  • A visita do Presidente da Républica Américo Tomás - Aqui!
  • Uma formatura dos Bombeiros de 1965 - Aqui!
  • O grande incêndio dos Paços do Concelho da Régua - Aqui!
  • 1º. de Maio de 1911 - Aqui!
  • Homens que caminham para a História dos bombeiros - Aqui!
  • Desfile dos veículos dos bombeiros portugueses - Aqui!
  • Uma instrução dos bombeiros no cais fluvial da Régua - Aqui!
  • O Padre Manuel Lacerda, Capelão dos Bombeiros do Peso da Régua - Aqui
  • A Ordem Militar de Cristo - Uma grande condecoração para os Bombeiros de Peso da Régua - Aqui!
  • Os Bombeiros no Largo da Estação - Aqui!
  • A Tragédia de Riobom - Aqui!
  • Manuel Maria de Magalhães: O Primeiro Comandante... - Aqui!
  • A Fanfarra dos Bombeiros Voluntários de Peso da Régua - Aqui!
  • A cheia do rio Douro de 1962 - Aqui!
  • O Baptismo do Marçal - Aqui!
  • Um discurso do Dr. Camilo de Araújo Correia - Aqui!
  • Um momento alto da vida do comandante Carlos dos Santos (1959-1990) - Aqui!
  • Os Bombeiros do Peso da Régua e... o seu menino - Aqui!
  • Os Bombeiros da Régua em Coimbra, 1940-50 - Aqui!
  • Os Bombeiros da Velha Guarda do Peso da Régua - Aqui!
- Link's:
  • Portal dos Bombeiros Voluntários de Peso da Régua (no Sapo) - Aqui!
  • Novo portal dos Bombeiros Voluntários de Peso da Régua - Aqui!
  • Exposição Virtual dos Bombeiros Voluntários de Peso da Régua - Aqui!
  • A Peso da Régua de nossas raízes - Aqui!

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Na inauguração do monumento a Afonso Soares

Discurso de  Alberto de Almendra Valente
“Afonso Soares era a encarnação viva de cidadania”

"Ex. mas  Autoridades Eclesiásticas, Militares e Civis, Minhas Senhoras e Meus Senhores:
Delegou em mim a Ex.ma Comissão do Monumento a Afonso Soares, a alta missão, de nesta ocasião transcendentemente espiritual para a gente da Régua, proferir algumas palavras sobre o digno homenageado.
Agradeço, desvanecido, a honra que me quiseram dar, sobretudo manifestamente conhecido como é, que, em meios a tantos títulos ilustre, não hesitaram em rejeitar o brilho da palavra de muitos, para dar preferência a elemento que, somente, poderia igualá-los, pondo o coração a falar. Aceitei porque estou sempre pronto a todo o serviço que me ordenem em prol desta sagrada terra, mas antes, rogo a Deus que lhes perdoe o mau gosto de preferência, que poderá resultar brutalmente para a sua generosidade, visto que os olhos do meu espírito se negam, por vezes, a colaborar nestas lidas, mergulhando-me, quando menos espero numa treva horrível.
Fujo quando posso a trabalhos que exijam cogitações, estudos ou confrontos, receando ser obreiro da Torre de Babel, vencido quando menos se previa!
De resto, a luz da minha exigência foi sempre de camarada e brilho e de intensidade, e paz, portanto de uma surpresa clara.
Ex.ma Comissão:
Parafraseando Vergílio: Falta-me força para apreciar jóia de tão pouco puro quilate!
Eis o que valho. Todavia, como sou, aqui estou às ordens de V. Excias!
Senhoras e Senhores...
No remanso do seu lar, pequeno e humilde, se fez e cresceu  a grande figura que a colaboração de muitos, aproveitada por dois, manterá eternamente neste formoso recanto, como Reguense de Lei.
Alma Angelical!
Amigo Extraordinário!
Nunca sua boca se abria que não fosse para aconselhar ou ensinar, ou para numa linguagem pessoalíssima, nos deliciar com as mais interessantes narrações.
Tinha no olhar a expressão dulcíssima do sol que aquece e ilumina a alma dos desgraçados!
Afonso Soares era a encarnação viva de cidadania; e dispunha sensibilidade tão fina que parecia animar todas as imagens que o cercavam.
Nos últimos anos da sua vida e à medida que a decrepitude lhe diminuía a estatura, ia-se agigantando, progressivamente, e de modo tal que chegava a convencer já detentor de expressão, palavra e olhar de ser pairando alto, na vizinhança do Senhor!
Escreveu a História da Régua: Trabalho honesto e perfeito, fruto de estudo e observação, ao longo dos anos, e realizando em meio ingrato, como o nosso, onde correntes acentuadamente comerciais e agrícolas, consomem todas energias aos seus habitantes.
Desempenhou, com mestria, vários cargos e, alguns, de manifesta responsabilidade.
Comandou os bombeiros, dirigiu jornais, havendo-se sempre como homem de equilíbrio e irrepreensível.
Como pintor, marcou admiravelmente.
E, como já em tempos afirmei, não creou escola. Tão modesto nunca realizou “salões”. Seu nome não transpôs fronteiras, nem, tampouco, sua terra deixou.
Valasquez, Murrillo e tantos outros, ganharam asas e procuraram grandes centros de arte, onde se agigantaram.
Todavia, Afonso Soares, seguiu a trajetória de grandes mentalidades Universais, que dispensam escola para se manifestarem génios!
Essa expressão magnífica de mármore e bronze, que passa a ser um padrão de glória da nossa terra, esse grito de arte, concebido por um homem que legará à Pátria Portuguesa uma obra imortal, mostrará aos que passarem, o interesse, o carinho que merecem aos reguenses os triunfos dos seus filhos!
Fez vibrar, de lés- a-lés, quem se interessa pelas nobres manifestações do espírito, numa hora de conturbação demoníaca, que tudo parece subverter!
Ó Régua, Régua! Coração das montanhas doiradas, trono esplendoroso do Vinho do Porto, altar de Nossa Senhora do Socorro, doce lar dos meus filhos, ninho dos meus amigos! Acabas de escrever mais uma das famosas páginas da História que Afonso Soares principiou!
Que a lição sirva de exemplo a quantos se propuseram à direcção da tua vida, dos teus anseios, para que os vindouros possam dizer-se filhos da terra mais rica e bela do Universo.  
- Peso da Régua, 17 de Abril de 1950

Notas: A cópia deste discurso foi cedida pelo Senhor José Stuart Torrie, Cônsul Honorário em Rouen, na França, um dos netos de Afonso Soares. Também nos cedeu várias fotografias, alguns registos biográficos da família e dos descendentes de Afonso Soares, um precioso recorte da notícia do jornal “Primeiro de Janeiro” (com a informação alusiva à inauguração do monumento da autoria do escultor Henrique Moreira), cópia de outros discursos manuscritos e alguns comentários dactilografados sobre o cidadão, jornalista, artista, escritor, autor da História da Vila e do Concelho do Peso da Régua e inesquecível Comandante dos Bombeiros da Régua.
Sobre a inauguração do monumento à memória de Afonso Soares destaca-se da notícia publicada pelo extinto diário portuense ainda o seguinte: “A comissão que tomou a feliz iniciativa da erecção do monumento, era constituída pelos antigos alunos da sua escola de pintura, Srs. António Teixeira e Armindo Mesquita. Nas cerimónias realizadas, colaborou a Associação de Bombeiros, de cujo corpo activo Afonso Soares foi também digno comandante. Essas cerimónias foram as seguintes: Romagem ao cemitério; Missa na Igreja Matriz, bênção e baptismo das 2 novas viaturas da Associação de Bombeiros. O pronto-socorro de que foi “madrinha” a Sr.ª Zélia Fernandes de Carvalho, senhora ilustre e bondosa, viúva do importante proprietário Sr. António Fernandes e irmã do prestigioso duriense que foi o Dr. Antão Fernandes de Carvalho, recebeu o nome de “Santo António”. A ambulância, de que foi «madrinha» a Sr.ª D. Maria da Conceição Soares Torrie, em representação da Sr.ª D. Maria Estefânia Monteiro Guedes, recebeu o nome de “Santa Maria”, em homenagem à mãe do benemérito Sr. Feliciano Monteiro Guedes.
Organizou-se depois um grande cortejo, em que se incorporaram bombeiros, escuteiros da Régua e de Godim, autoridades, representantes dos organismos locais, etc., cortejo que acompanhado de uma banda de música se dirigiu ao pequeno jardim do Cruzeiro, onde se fez a inauguração do monumento que se encontrava coberto pelos estandartes de várias agremiações, cujos emblemas obedeceram ao desenham do artista notável que o homenageado foi. Estavam presentes as suas filhas, Sras. D. Fausta Soares Osório de Almeida e D. Maria da Conceição Soares Torrie e netos Sr. José Afonso Soares Osório de Almeida e meninos José e Isabel Maria Soares Torrie. Por parte da comissão promotora, usou da palavra o Sr. António Teixeira, tendo-se seguido o Sr. Alberto Almendra Valente. Após a inauguração, a corporação de Bombeiros desfilou em continência, tendo as filhas e os netos de Afonso Soares recebido os cumprimentos”.

Clique nas imagens para ampliar. Sugestão de texto e imagens de JASA (José Alfredo Almeida) para este blogue. Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Junho de 2012. Texto também publicado na edição do semanário regional "O Arrais" de 21 de Junho de 2012. Só permitida a cópia, reprodução e/ou distribuição dos artigos/imagens deste blogue com a citação da origem/autores/créditos.