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sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Em mais um Natal, recordam-se as escarpas vinhateiras do Douro e da Régua.

Um dia, no já distante ano de 1957, deixamos as nossas raízes e partimos para o mundo. Mas Peso da Régua, onde nascemos, que na história do Douro Vinhateiro é uma das mais importantes cidades beirando o rio Douro dos barcos-rabelo, aconchegada entre montanhas revestidas de videiras que oferecem o único Vinho do Porto, permanece firme no coração, a dividir paixão afetiva com a Pemba de nossa adolescência e demais recantos hospitaleiros que nos abrigaram ao longo da vida.

Nela aprendemos a magia dos primeiros Natais em Invernos felizes de convívio e brincadeiras infantis com Família numerosa e, então, unida.

Naquela época, nossos queridos Avós, Pais, Tios, em sua maioria já no Alto, responsáveis por essa "mágica" de encanto, acompanhavam e transmitiam-nos o gosto pela tradição, o entender da confraternização, a percepção do perfume das pinhas queimadas na lareira, do odor das rabanadas com molho de vinho do Porto e canela, do sabor do bolo-rei, da competição do raspa, do bacalhau em bolinhos ou cozido com todos, do polvo, do creme com açúcar queimado, das batatas do Menino Jesus e de tantas outras deliciosas iguarias que só o Natal traz para a mesa lusitana farta, pródiga mesmo nos lares mais humildes.

Com seu olhar complacente, protector, realizavam os nossos tutores sua incansável missão de nos educar também nos costumes, na tradição, na hospitalidade e na afabilidade do Douro do nosso Portugal.

Continuam, acredito em minha FÉ cristã, resguardando e acompanhando lá do Céu certamente, os nossos Natais e os nossos passos terrenos.

Para eles, para meus Familiares (incluindo minha querida Mãe Nair e meu saudoso Pai Jaime Ferraz que já 'partiram'), para meus conterrâneos, para meus Amigos no presente e para mim também porque me faz bem, fico discorrendo com as lembranças desse tempo feliz, percorrendo veredas do planeta virtual em busca da afirmação do sentir e da confirmação de que estamos próximos, mesmo quando distantes fisicamente.

E aqui fica para todos, o simbólico presente de Natal forjado em imagens de vários autores que nos levam à Régua, ao Douro e a Portugal.

Apreciem e aproveitem bem, em mais um NATAL de nossas vidas!
- Jaime Luis V. F. Gabão - Transcrito com alterações do blogue ForEver PEMBA de 23 de Dezembro de 2007. Actualizado em Dezembro de 2013.
flicKr --> Encontramos fotos quase sem fim sobre Peso da Régua aqui !

Clique nas imagens para ampliar. Imagens da net e texto de J. L. Gabão para os blogues "Escritos do Douro" e "ForEver PEMBA". Actualizado em Dezembro de 2013. Este artigo pertence aos blogues Escritos do Douro e ForEver PEMBA. É permitido copiar, reproduzir e/ou distribuir os artigos/imagens deste blogue desde que mencionados a origem/autores/créditos.

sábado, 20 de abril de 2013

Recortes - Peso da Régua antiga

Clique nas imagens para ampliar. Imagens originais cedidas por JASA. Edição de imagem de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Abril de 2013. É permitido copiar, reproduzir e/ou distribuir os artigos/imagens deste blogue desde que mencionados a origem/autores/créditos.

quarta-feira, 13 de março de 2013

O comissário da Sandeman

Encontro-me à mesa da minha secretária, num entardecer outonal com a luz a resplendecer nas águas do rio e nos vinhedos que serpenteiam o vale Abraão, absorvido na leitura de um livro que, de um momento para o outro, me leva às vindimas no meu Douro. Enquanto ouço, lá no meio dos socalcos coloridos, os cantares das vindimadeiras e os sons de uma gaita-de-beiços, um harmónio, os ferrinhos e os bombos que acompanham o pisar das uvas pelos homens, deixo-me viajar no tempo em direcção ao passado.

Acabo de chegar à vila da Régua dos finais do século dezanove. O comboio que me trouxe terminou aqui a sua marcha, apenas com um ligeiro atraso relativamente ao seu horário. Estou na estação, que esconde muita da sua beleza arquitectónica nos ramos dos frondosos plátanos. Da sua porta principal, começa a sentir-se o bulício de pessoas e dos transportes na estrada nacional que lhe passa em frente. Sinto odores de vinho fino que se misturam com perfumes de flores silvestres. As diligências da viúva Vilela, empresária e benemérita, estão de saída para outras paragens.

A vila está a crescer e o comércio prospera, mas é a sua beleza que atrai a atenção do meu olhar e me deixa, por breves instantes, extasiado pela luz e pela intensidade das cores de uma paisagem fascinante que alastra até às margens do rio. Sou despertado por uma velha rebuçadeira de bata branca que vende pacotinhos de uns rebuçados embrulhados em papel. Compro-lhe dois pacotinhos e delicio-me com o aroma de flor de laranjeira de um doce rebuçado da Régua.

Olho as horas no relógio da estação, está muito calor, decido passear-me pela Rua da Bandeira, o coração da vila, onde se faz todo o comércio de retalho, as casas exportadoras guardam o vinho e as aguardentes, onde ficam as hospedarias e as pensões e se encontram as figuras mais respeitáveis da terra. Depois de fazer uma ligeira refeição numa hospedaria mais recomendada, quero visitar a Loja do Zé Pinto, progressista ferrenho, e aí comprar a última edição do bi-semanário O Douro. O jornal interessa-se por divulgar os assuntos da lavoura, do comércio dos vinhos e a gestão da câmara do regenerador Dr. Júlio Vasques. À entrada desta loja, onde se vende um pouco de tudo, deixo o meu olhar penetrar numa sala para aí rever figuras ilustres numa roda de cavaqueira e que, agora, me parecem almas retiradas das profundezas da Eternidade ou de um outro mundo. Na verdade, não os conheço nem eles me conhecerão a mim, mas nutro por eles uma indisfarçável admiração, simpatia e respeito pelo que fizeram no seu tempo. Se eu pudesse falar com alguns deles, seria com o poeta Camilo Guedes Castelo Branco, que continua a usar a sua  farda de soldado da paz.

Retomo a minha caminhada e, de uma viela que circunda o Largo do Cruzeiro, vejo passar o senhor Afonso Soares de barbas brancas e olhos luminosos. Deve ter acabado o seu repasto, porque fuma com redobrado prazer. Disseram-me que é um apreciador de sável, um saboroso peixe que ainda se pesca no rio Douro. Bem gostava de o ter convidado para provar comigo esta deliciosa especialidade gastronómica, mas o senhor Soares é um artista diletante, jornalista, escritor, erudito e pintor. Quase que desconfio que não pode dissipar nenhum do seu precioso tempo com um estranho que lhe apareça assim de frente. Tem mesmo muito que fazer e deve estar preocupado com o futuro da corporação de bombeiros, onde acabou de ser escolhido para Comandante.

Desço a ruela das Vareiras, com as tabernas que vendem os vinhos mais baratos e apreciados pelo povo e onde crescem negócios em que o sal e a sardinha salgada de barricas são as principais mercadorias. Ao fundo da rua sobressai o areal extenso por onde corre o rio e voam vertiginosamente as últimas andorinhas, anunciando que estão de partida. Um barco rabelo de bela içada, carregado com cinquenta pipas de vinho da feitoria, produzido pela firma Martinez e Gassiot, solta as amarras de um movimentado cais fluvial.

Como se faz tarde, aproximo-me da Rua Nova para me dirigir à Casa da Companhia. No seu átrio, juntam-se lavradores, comerciantes, corretores e comissários das casas inglesas. Enquanto uns discutem os preços da pipa de vinho da vindima, outros exibem amostras de colheitas antigas. O preço da pipa ronda os 25.000 mil réis e os viticultores estão insatisfeitos. Diante de mim, tenho os senhores Francisco Ferreira e António Claro, fiéis empregados da Casa A.A. Ferreira, Scrs. Estou surpreendido, os lavradores, numa veneração digna de deuses, saúdam-nos com vénias e mesuras. Gostava de cumprimentar a D. Antónia, a Ferreirinha, que deve estar pela Quinta das Nogueiras, e agradecer-lhe a generosidade para com a associação de bombeiros, que, como primeira sócia contribuinte, muito ajudou nos primeiros anos de existência.

Quem eu vinha procurar, um tal comissário da casa Sandeman, não encontrei. Ali perto, está a relojoaria de Adolfo Pauman, um velho actor galego que deixou as artes cénicas para ser bombeiro voluntário e se dedicar ao comércio reguense. A porta da loja está encerrada, pelo que decido entrar na Botica do Anastácio, outro memorável ponto de tertúlia. Ao balcão, está um moço que avia umas receitas de pomadas. Pergunto-lhe pelo paradeiro do senhor António Roberto Pinto. Depois de sair o cliente, diz-me que devo encontrá-lo na casa da Real Associação dos Bombeiros, no Largo da Chafarica, onde ao fim da tarde costuma ir jogar dominó, quino e frequentar a sala de leitura. Meto as pernas ao caminho em direcção à Rua da Boavista e, em pouco tempo, chego ao quartel dos bombeiros voluntários, instalado numa casa antiga, o rés-do-chão para arrumar as bombas e o primeiro andar para reuniões e encontros de lazer.

É domingo, e as badaladas do sino da capela do Senhor do Cruzeiro dão as seis horas da tarde. Alguns associados, mais habituados a frequentarem a sala de jogos e a casa de leitura, apressam-se a entrar no quartel. Reconheço o senhor António da Silva Correia, solicitador, e o Dr. Júlio Manso Preto, jurisconsulto e publicista que exerce o foro na vila. Ninguém sabe onde nasceu, mas aqui se radicou e fez família. Intriga-me que deste autor ninguém tenha dado atenção ao folheto que publicou em 1864 com o sugestivo título Duas Palavras Acerca da Régua e Arredores. Não o li, mas o seu autor faz aí um magistral retrato poético desta terra, então com poucas ruas, algumas com bons edifícios elegantemente construídos, notável pelo seu comércio de vinhos. Ele, que adoptou esta terra para viver, viu beleza nas colinas tapeteadas de vinha e polvilhadas de casario branco, um encanto para o olhar, donde se  avistava um rio forte, sem igual, e os enormes  sabugueiros em flor.

Atravessa o Largo da Chafarica, vindo do seu escritório, um jovem que começara a advogar como sucesso. Apaixonado pelos ideais republicanos, vai dedicar-se com afinco a resolver as mais problemáticas das questões do Douro. O causídico chama-se Antão de Carvalho e está a iniciar o brilhante futuro que o levará ao cargo de Ministro da Agricultura, logo após a instauração da República, e depois a ser o mais dinâmico dos paladinos do Douro.

Aproxima-se o abastado comerciante Joaquim Sousa Pinto, fardado de bombeiro, acompanhado pelo Comandante Afonso Soares e pelo presidente da direcção, Alberto Pereira Rolla, sendo saudados com continência por um piquete de voluntários. Param diante de mim e, como não me reconhecem familiar ao meio, cumprimentam-me com um afável “Boa tarde, meu caro amigo”. De imediato, o Comandante Afonso Soares, que traz na mão esquerda um manuscrito do livro que irá publicar, os Apontamentos para a História da Vila e Concelho, abeira-se de mim e pergunta-me se me pode ser útil. Digo que sim, que procuro o senhor António Roberto Pinto, comissário da casa comercial Sandeman, a quem precisava de dar umas palavras...! Avisa-me que deve estar a chegar para entregar um donativo da casa Sandeman para ajudar a missão dos bombeiros. Ainda o ouço exclamar: “Bem precisamos de dinheiro….”. Entretanto, pergunta-me se me fiz associado contribuinte. Não sei como lhe responder, mas prometo ao Senhor Soares que, mais tarde, aparecerei para me inscrever como sócio e é o que faço… um século depois.

As badaladas do sino do Cruzeiro voltam a ouvir-se dolentemente e fazem-me acordar de um sono profundo, aconchegado pelo calor outonal. Tenho aberto o livro de actas dos mandatos das primeiras direcções dos bombeiros da Régua. Cá está o desconhecido comissário que não tive a sorte de encontrar na minha viagem ao passado. Uma acta da reunião extraordinária da Direcção dos Bombeiros datada de 1893 confirma-me que, nesse dia, esteve presente oSr. António Roberto Pinto comissário da casa ingleza Sandeman, tendo por este entregue á hora desta sessão  a quantia  25.00 mil réis, que a mesma offerece para os fundos da Associação. Deliberou-se por unanimidade agradecer a oferta”.

A Sandeman, como casa comercial, morreu; aquele mítico nome pertence agora a outra empresa de vinhos, a Sogrape. Com ela morreram também os influentes comissários das casas inglesas, sobre os quais o escritor João de Araújo Correia escreveu o seguinte: “Governam-se melhor que o lavrador e quase tão bem como o comerciante. Estabelecem entre um e outro uma risca de união perfeita de metal precioso. Ser comissário é ser alguém. Ser comissário de casa inglesa é porventura ser mais do que alguém. (…) Ser empregado de ingleses, no Douro, é ser gente estremada – ainda que o emprego se exerça numa adega com caneco à cabeça. Se o emprego é porém de vulto, se representa confiança e espelha a bizarria inglesa, o empregado chama-se comissário e é um lorde. É um lorde entre lavradores preocupados com colheitas e com vendas”.

Já cá não estão estes lordes da sociedade duriense para defenderem o seu bom nome. Morreram todos. Perdura o nome do Sr. António Roberto Pinto, que, apesar de nada sabermos acerca dele, deixou uma fama de benfeitor dos bombeiros da Régua.

Devia acabar aqui esta pequena história. Mas, o mais certo, é ela continuar para acrescentar o exemplo da casa Symington - sócia contribuinte nº 578 – que assim concede o seu apoio a uma instituição humanitária que tem como seu ideal fazer o bem comum. 
- José Alfredo Almeida*, Peso da Régua, Fevereiro de 2013
*O Dr. José Alfredo Almeida é advogado, ex-vereador (1998-2005), dirigente dos Bombeiros Voluntários de Peso da Régua entre outras actividades  escrevendo também cronicas que registam neste blogue e na imprensa regional duriense a história da atrás citada corporação humanitária e fatos do passado e presente da bela cidade de Peso da Régua.



Clique nas imagens para ampliar. Texto e imagem de JASA. Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Fevereiro de 2013. Também publicado no jornal semanário regional "O ARRAIS" edição de 13 de Março de 2013 - 1ª parte. edição de 20 de Março de 2013 - 2ª parte. Este artigo pertence ao blogue Escritos do Douro. É permitido copiar, reproduzir e/ou distribuir os artigos/imagens deste blogue desde que mencionados a origem/autores/créditos.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Retalhos da net - A MAGNA CARTA DA HISTÓRIA DO VINHO DO PORTO – a escritura de Cister (1142)

Transcrição - Trabalho descreve características e finalidades do Projecto de Cister no Douro - Esses doze séculos formavam uma grossa cortina de escuridão e ignorância, alimentada pela moleza graxista do emproado ‘magister dixit‘ que tem eivado a investigação da História Medieval. Além das escrituras de S. João de Tarouca (TARAUCAE MONUMENTA HISTPRICA, estabelecidas por A Almeida Fernandes), os historiadores do vinho do Porto podem estudar também os tratados medievais (sete, só até D. Fernando), por ex. os de D. Dinis com a França e a Inglaterra (1290, 1293 e 1304), além das lutas portuárias já de seu pai, D. Afonso III, com o bispo do Porto, que recorreu, sem sucesso, ao próprio Papa, para não ser constituído, já em 1255, o Concelho Municipal de Gaia, que lhe retirava fartos direitos alfandegários. Este trabalho descreve e enquadra a motivação, características e finalidades do Projecto de Cister no Douro, em terras do Aio duriense e integrado na Cruzada ibérica de ajuda a D. Afonso VI, o Conde D. Henrique e D. Afonso Henriques.

A escritura de 1142, de compra da “herdade dos Varais“, integra-se no projecto vitivinícola cisterciense de Cambres, que metodicamente aí acrescenta outras quintas pioneiras, sempre concentradas no eixo do rio Douro: com a foz do Varosa, do Temilobos, do Tedo....

O contexto agrícola dos conventos de Cister de Tarouca e do Varosa garantia uma farta e mimosa subsistência alimentar, mas não permitia o cultivo da vinha, pelo menos com a qualidade licorosa de “vinho de missa“ (16º álc.), em compatibilidade com a sacralidade litúrgica dos cálices de ouro e prata.

A necessidade inicial de prover de ‘vinho de missa’ as múltiplas necessidades diárias da celebração da eucaristia transformou-se fatalmente no desenvolvimento, aperfeiçoamento e expansão comercial[1] desse “vinho cheirante de Lamego“, depois ‘baptizado’ (com mais aguardente vínica) como “vinho do Porto“ (19º álc.), no acto da exportação.

Por isso é tão marcante esta escritura de 1142.

É a MAGNA CARTA.

Que rasga, definitivamente, a citada ‘cortina histórica’ entre o séc. V romano da “fonte do milho“ de Canelas e o séc XVII-XVIII do Marquês.

O “vinho de missa“ licoroso (16º álc.), ou “cheirante de Lamego“ da Ordem de Cister, chamou-se “do Porto“, por daqui ser exportado, pelo menos já desde o reinado de D. Dinis.

A junção de aguardente vínica (entre 13-18 litros/pipa) para exportação, eleva a norma alcoólica do “vinho do Porto“ para 19º álc..

Já bem antes do séc. XVI só a quinta de Mosteirô (Cambres) exportava 15-16.000 almudes, o que pressupõe infraestruturas de muitas décadas, quer relativas ao saibramento e plantação da vinha até se tornar produtiva, quer ao tempo apreciável de envelhecimento do vinho licoroso quer, ainda, ao fabrico dos próprios meios de transporte: carros de bois, barcos, armazéns, vasilhame...

A Alfândega do Porto, em 1741, registou a exportação de 19.000 pipas!

Mas a riqueza do nosso vinho fino é ainda Dádiva e Espírito:

Alma e não apenas Corpo.

Nas funduras da Paisagem os visitantes encontrarão a Essência do nosso Ser colectivo, que no Douro foi criado, por Egas Moniz e Cister de Borgonha, para D. Afonso Henriques, fundando com ele a dinastia borgonhesa e deixando este Património aos Durienses, a Portugal e a toda a Humanidade.

[1] Os regulamentos originais de Cister proibiam a venda de produtos monacais: mas as necessidades económicas da guerra da cruzada e a insistência da procura tornaram irresistível a tentação comercial e a regra foi aligeirada.
Clique nas imagens para ampliar. Imagens e texto autorizadas/cedidos pelo Dr. Altino Moreira Cardoso (AMC). Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Outubro de 2012. Este artigo pertence ao blogue Escritos do Douro. É proibido copiar, reproduzir e/ou distribuir os artigos/imagens deste blogue sem a citação da origem/autores/créditos. 

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Retalhos da net: Douro - Investigador alega descoberta do antepassado do vinho do Porto

O investigador Altino Moreira Cardoso defende, num estudo a publicar em Setembro, que a Casa dos Varais, foi «a primeira» a produzir «vinho cheirante de Lamego», no século XII, que posteriormente foi denominado vinho do Porto.

Transcrição de "Café Portugal" | sexta-feira, 10 de Agosto de 2012

A investigação, que parte da descoberta de uma escritura de compra datada de 1142 vai ser divulgada na revista «Douro - Estudos & Documentos», da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, e será ainda objecto de uma publicação autónoma, em livro.

Natural de Peso da Régua, Altino Moreira Cardoso tem-se dedicado à história do Douro e da fundação de Portugal. Foi na Torre do Tombo que o investigador encontrou um documento das escrituras do Mosteiro de São João de Tarouca, entre a quais a da compra de uma herdade na foz do Varosa, outorgada pela Ordem de Cister. Esta será a primeira escritura relacionada com o sector da vinha na região.

A propriedade, localizada junto do rio Douro, no concelho de Lamego, pertence actualmente à família de João Azeredo.

Altino Moreira Cardoso defende que foi na Quinta dos Varais que os monges plantaram «os primeiros vinhedos do Douro», com «castas trazidas da Borgonha», de onde era proveniente a Ordem de Cister, bem como o seu mentor São Bernardo e o conde D. Henrique.

«Trata-se, portanto, da primeira quinta a produzir o medievalmente chamado vinho cheirante de Lamego, depois denominado do Porto, por daí ser exportado», avançou.

O responsável associa, por isso, o início da produção de vinho pelos monges de Cister neste território à época do início da nacionalidade, com o Rei D. Afonso Henriques.

Os vestígios da produção de vinho no Douro remontam à época da ocupação romana deste território, de que é exemplo a Fonte do Milho, em Canelas, que está a ser alvo de uma intervenção por parte da Direção Regional de Cultura do Norte (DRCN). 


No entanto, com a invasão muçulmana, a produção de vinho e as vinhas foram, segundo o investigador, praticamente abandonados, porque o Alcorão proibia a ingestão de bebidas alcoólicas.

Com a chegada da Ordem de Cister, os monges apressaram-se a plantar vinhas para produzirem o vinho de missa, o qual, de acordo com o investigador, «tinha uma técnica especial de fabrico» que considera ser parecida «com a técnica de produção de vinho do Porto».


Depois, com o aumento em massa da produção a Ordem de Cister terá começado a vender o vinho.

A descoberta desta escritura foi uma surpresa, mas enche de orgulho os proprietários da Quinta dos Varais. A propriedade está na família de João Azeredo pelo menos desde 1700, no entanto, muitos dos documentos históricos foram destruídos num incêndio, ocorrido em 1940.

É motivo de orgulho, mas é também um acréscimo de responsabilidade, já que este estudo vem chamar a atenção para a propriedade.

Com produção de vinho do Porto e DOC Douro, a Casa dos Varais está actualmente de portas abertas ao turismo rural e ao enoturismo.

Licenciado em Filologia Românica pela Faculdade de Letras de Coimbra, Altino Moreira Cardoso já publicou diversas obras como «D. Afonso Henriques – Os mistérios e a lógica», «Afonso Henriques no Douro nascido e criado», ou Grande Cancioneiro do Alto Douro.
Clique nas imagens para ampliar. Imagens cedidos pelo Dr. Altino Moreira Cardoso (AMC). Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Setembro de 2012. Este artigo pertence ao blogue Escritos do Douro. É proibido copiar, reproduzir e/ou distribuir os artigos/imagens deste blogue sem a citação da origem/autores/créditos. 

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Retalhos da net: Douro - O paraíso esquecido e as histórias que moram lá

- Transcrição de "VISÃO" - 30 de Agosto de 2012:
Reportagem
Douro: O paraíso esquecido e as histórias que moram lá
À margem das excursões turísticas, a região Património da Humanidade ainda guarda memórias, figuras e sabores que atestam o seu caráter genuíno, resistente e sentimental. A VISÃO desta semana propõe-lhe uma viagem aos segredos, dores e alegrias do vale encantado.

Diz-se que quando um galo canta em Barca d'Alva é ouvido em três distritos e dois países. A ponte Sarmento Rodrigues une Bragança e Guarda. A província de Salamanca eleva-se ali ao pé. É aqui que o Douro cai, por fim, nos braços portugueses depois de namoriscar margens ibéricas desde Miranda. Do miradouro do Alto da Sapinha, vê-se tudo isto, mais as águias, imperiais, planando. O resto imagina-se. Visto de perto, este prodígio de homens sobre a natureza árida também encerra fantasmas. Quem diria? Uma estação de comboios, das mais belas que o rio beijou, está entregue a fatalismos e memórias de lua-de-mel. Pelas ruas, homens sonâmbulos ruminam conversas mortas. Esplanadas cansam-se da babugem aos novos cavalos de Troia do rio, cruzeiros a abarrotar de turistas rapinando a paisagem com olhares gulosos, mas apenas isso. "Chegam, entram ou saem dos autocarros, e seguem viagem. É negócio que não deixa um cêntimo nestas terras", lamenta-se Mário dos Anjos, testemunha diária de rebanhos excursionistas com karaokes de Malhão a bordo.

Não se vive dos olhos pasmados ou espantos que vêm e vão.

Oriundo de Vilar de Amargo, o feitor da Quinta da Batoca tem um pretérito imperfeito a bailar na boca. As terras que, do alto de Ligares, piscam o olho a Barca d'Alva significavam tudo para ele. A quinta, das maiores do Douro, "era um jardim perfumado, de vinhas, olivais e amendoeiras", gerando cobiças e atiçando invejas. O escritor Guerra Junqueiro, proprietário, conquistou-a, a palmo, à aridez e pedra rude, mas também à manha e astúcia de uns quantos. Com prosa bruta inscreveu na paisagem um poema visual, de enlevos homéricos. Deixou versos pela casa, esboçados na cal, que agora se vão descascando e apagando como recordações ténues. "Plantou a maioria das oliveiras e ainda se dedicava a partir miolo de amêndoa na varanda, ao serão", conta, de ouvir, Mário dos Anjos.

A casa está trancada há décadas. A fundação que leva o nome daquele que zurziu o sarrafo na monarquia e no povo "resignado" bem tentou abrir portas a residências artísticas, inspirando exuberâncias literárias ou da mesma espécie. Nada feito, sentenciaram os poderes de Estado e a penúria autárquica. Mágoas que nem o restauro dos cardenhos, a apanha da azeitona ou os cachos que Mário leva ao Porto conseguiram apagar.

O LAGAR, TRADIÇÃO REQUINTADA
Longe vão os tempos dos "parranas engravatados" que surripiavam a região e Eugénio de Andrade imortalizou. A cada época a sua moldura pacóvia. Por estes dias, o Douro, domesticado na sua fúria secular de águas livres, deixa-se ir na corrente de elitismos vistosos e manias sensaboronas, resignado a cenário de flirts turísticos sem consequência, mas muito na moda. Se não desaguarem à porta de Cristina Gomes, ali para Escalhão, em Figueira de Castelo Rodrigo, ela até agradece. "Isto é para saborear." O Lagar saiu-lhe do pelo e do coração, não é pasto de excursão.

A empresária agrícola deixou a capital quando a asma da filha recomendou a pureza das raízes. À doença foi um ar que lhe deu e veio a vontade de fincar, de vez, os pés na terra. Com o empenho do marido, Pedro Rocha, restaurou, a partir de ruínas, o lagar dos avós. "Para mim, isto não é um restaurante, é um lugar de afetos", assegura.

Ali, o muro dos antepassados recuperado. Aqui, um trilho antigo, alfaia de madeira e lâmina aguçada, a servir de balcão, no qual repousa um exemplar de Sente e Descobre, guia turístico de Figueira, o mais falado de quantos são editados por estas bandas. Autoria de Daniel Gil, que lançou a ideia dos roteiros a partir d'A Viagem do Elefante, de Saramago, ou não tivesse a odisseia literária do paquiderme Salomão deixado fundo rasto no Douro e mais além.

Pela mão do amigo ou iniciativa própria, Cristina calcorreou casas e lares de terceira idade da região à cata de receitas ancestrais, dadas como perdidas. O pão de trigo chega agora das aldeias. O azeite respeita saberes e sabores rurais de outrora, por isso o polvo à Lagar pode vir à mesa, a boiar. A horta é da época, respeita os ciclos naturais. Queijos, fumeiros e enchidos têm o rótulo da geografia sentimental. A maioria dos vinhos exibe o selo da região demarcada do Douro. Pode ser um Carm, branco, de 2011, ou um tinto Vale de Pios, 2008, ali mesmo, de Escalhão.

Luís Sottomayor, enólogo da Casa Ferreirinha, gosta de chamar ao Lagar a sua cantina. Ao espírito gourmet ou lá o que é, Cristina contrapôs uma ementa em iPad, feita de "tradição requintada". A evidência come-se com os olhos: onde outros rubricam design gastronómico e estrangeirismos pomposos num prato ratado, Cristina exibe mimos de avós em fartas travessas de barro, a fazer jus aos nomes suculentos: tirinhas de porco preto com molho de laranja, cacho de vitela com migas de tomate, lagarada de bacalhau. O doce de ovos com batata é um hino à sabedoria caseira. De "comer e chorar por mais", frase que, por acaso, também dá nome a uma sobremesa de amêndoa de enfeitiçar paladares. Até a morcela doce de Escalhão, com mel e canela, "que já ninguém fazia", renasceu aqui.

ALMENDRA, DOCE E ORGULHOSA
A esta mesa pantagruélica senta-se Alfredo Mendes, décadas de escrita batucada num jornalismo de sabor literário, por vezes devedor de mostos e partilhas gustativas. Ainda cachopo, rumou a Leça da Palmeira levando a aldeia com ele, por dentro dele. Outros o fizeram, por necessidade ou aventura. Almendra, em Vila Nova de Foz Coa, é território de pergaminhos vários, com gravuras rupestres à distância de um rabisco, casas aristocratas e romaria sem igual em todo o Douro, a Senhora do Campo. Ali se teceu o que viria a ser a Lusomundo, a partir da vivenda da família Bordalo. Ali ainda se tricotam episódios da envergadura de Romeu e Julieta, com enredo na Casa dos Caldeiras, onde donzela mal-amada traiu o temido doutor da terra e se enamorou de rapaz do povo. Em tenra idade, ali foi parar Maximino de Sousa, o famoso padre Max, de esquerdas, assassinado à bomba nas fervuras do pós-revolução. "Não vás para padre. És bonitinho e depois as pequenas vão andar atrás de ti", rogava-lhe, sem sucesso, Sezira Ivone, que recorda o catraio que ali fez a instrução primária, bondoso.

Alfredo dedicou anos ao garimpo das alcunhas e dizeres do torrão natal, devolvendo à terra "códigos que nos uniam a todos, carregados de afeto e distinção, fruto de laços harmoniosos e de sangue". Do mapa do tesouro fazem parte mais de três mil termos, condimentados por influências castelhanas, francesas e árabes, e encontrados, até, nas obras de Jorge Amado e Machado de Assis. Em breve, a Câmara de Foz Coa editará este levantamento, ilustrado a partir de precioso arquivo fotográfico, cuidado com saudade por almendrenses como João Varges, radicado no Brasil. As páginas lavram honra e posteridade à Cabra Manhosa, ao Mata-a-Morte, ao Cai-lo-Cú, ao à Puta Gaga, mas também ao Caldo Enchebre ou às Balulas. Não se pense que a empreitada é coisa arcaica, pois não passaram muitos anos desde que um conservador do registo predial viu as cartas para Almendra serem devolvidas à procedência por nelas não constar a alcunha do destinatário.

Freguesia de destino marcado por partidas e chegadas, coube a Jorge Ribeiro e Valerie Censier encontrar aqui a terra a que chamam sua. Ela francesa, artista plástica. Ele de Gondomar, músico, ator e homem de mil ofícios, com percurso certificado pelas portas que abril abriu, onde, cantava-se, a seiva de uma espera tornou tudo mais urgente. Cansados da vida de estrada, Valerie e Jorge assentaram arraiais na vila duriense, depois de viagens ao desatino. Vegetarianos, nem os trajes nem a postura vagamente hippie desencadearam estigmas ou maldições ciciadas. "Fomos acarinhados desde o início. Trouxemos ideias novas, mas absorvemos o espírito da terra", reconhece Jorge.

O casal cuidou da autoestima das gentes da terra e povoados da região. Voluntariou-se para atividades socioterapêuticas junto de crianças e jovens das terras do Coa e organizou caminhadas, vindimas, sessões de ioga, passeios de burro, dignificando natureza e tradições. "Quando acontece algo novo, as pessoas ficam ansiosas", diz Valerie, que agora quer fazer pão em forno antigo. Jorge, esse, já andou no restauro de pombais e aprendeu com os velhotes as artes da enxertia, da poda e das apanhas. É vê-lo animando aldeias, comunidades agrícolas. Qual saltimbanco, carrega às costas espetáculos para crianças e adultos, com reportório e itinerários inspirados na musicoterapia, na pedagogia curativa e socioterapia. Nas horas que nunca sobram é vê-lo vestido de homem paleolítico nas atividades teatrais do Museu do Coa ou em diálogos pessoanos. Lá para finais de setembro aparecerá em Serralves a puxar um burro com livros. "É um espetáculo para crianças. Até o asno pode ser difusor de cultura."

A GUARDIÃ DE LENDAS
Ao final de uma destas manhãs tórridas do Douro, na outra margem do rio, no concelho de Carrazeda, Flora Teixeira já havia recebido nove notificações no Facebook. Deitara-se tarde na véspera: falara com filhos e netos, radicados em Moçambique, pelo Skype.

Levantara-se cedo. Antiga catequista, agradeceu aos céus mais um dia na terra e foi "mata-bichar", não sem antes sintonizar a Ansiães FM, a cujos discos pedidos não falha. Na mesa, repousam, rabiscados a letra redonda, os próximos poemas e artigos sobre as tarefas rurais de antigamente, que publica no jornal da terra, da Associação Cultural e Recreativa de Pombal de Ansiães. A aldeia, onde sobram pouco mais de cem almas, tem tradições teatrais desde 1927 e, no passado, tomou-se de brios na luta contra o analfabetismo.

Os habitantes vivem ainda a ressaca do festival de artes, realizado há semanas. Flora deu um workshop de sabão biológico e andou numa azáfama para acolher artistas, todos com alimento e teto garantido, ano após ano, nas casas dos anfitriões. Aos 82 anos, esta antiga tecedeira e ex-emigrante em África não falta a uma aula de ginástica e mantém a agenda preenchida com atividades onde canta, dança e representa. "Não sei o que é o tédio nem o isolamento", assume, de sorriso aberto. Há uns anos, a filha enviou-lhe, pelo correio, um computador portátil. "Para a melhor mãe do mundo, que nunca se esquece de saber e aprender", escreveu. E ela aprendeu.

O escritor Alexandre Perafita imortalizou-a no património imaterial da região. Flora herdou do avô a veia de narradora. É guardiã de lendas. "Para cima de três dúzias!" Histórias da peste em Pombal ou de mulheres que sonharam com ouro numa fraga que vai contando às crianças, nas escolas. "Sempre inventei monólogos e variedades." Das visitas despede-se de copo em riste, com presunto e queijo "para fazer a boca ao vinho", que é generoso ou fino, diz-se por aqui, com propriedade e acerto. "Não sejam pessimistas, toquem a vida para a frente", brinda.

PAI CALVO, CEMITÉRIO DE XISTO
José Pinto bem gostaria de dizer o mesmo, mas deixaram-lhe uma herança de pedra. Era esse o nome do filme baseado na saga duriense dos romances de Alves Redol, cuja rodagem, nos anos 1990, esteve prevista para Pai Calvo, aldeia fantasma, de xisto, em Armamar. "Ainda andaram aqui uns meses, prometendo que o filme ajudaria à reconstrução da aldeia. Mas depois a empresa faliu e eu fiquei a arder em 600 contos", conta este proprietário de afamada quinta.

A aldeia sofreu com a razia da filoxera, praga que, no final do séc. XVIII, transformou o Douro num cemitério de fragas e gentes, túmulos gravados nas encostas, desesperos atirados ao rio ou suspensos num laço fúnebre de corda. Desde 1930 que não se vislumbra vivalma naqueles carreiros onde repousam 13 casas e lagares, três delas compradas por José Pinto. "Desbastei o mato bravo, arranjei telhados, pus isto à vista." Chamam-lhe "o dono de Pai Calvo" e vagueia horas por ali, entre sonho e alucinação. "Não perdi a esperança de recuperar a aldeia para turismo rural ou museu. É uma questão de honra à memória familiar e de gerações", desabafa, de voz embargada.

A história do Douro está cheia de penitências carregadas entre flores bravas e penedos. Cansaços que, desafiando a natureza esquiva e encostas íngremes, vindimaram, do granito e do xisto, néctares dos céus, empoleirados em vidas precárias. O radioso resultado vê-se, como em nenhum outro lugar, do miradouro da Casa Redonda, na Quinta das Carvalhas, no Pinhão, propriedade da Real Companhia Velha. Dez minutos a subir, em círculo. As nuvens quase tocam a cabeça. O esplendor duriense pode ser apreciado, num ângulo de 360 graus, durante uma das atividades da quinta, do enoturismo à observação de aves.

O Douro anda, entretanto, obstinado em acasalar com a modernidade. Ora agasalhando um ripanço perigoso e sem freio, ora prenhe de rebeldia e inovações. Nos últimos anos, o Pôpa Vinho Doce tinto e o levíssimo Rufete, feito a partir de castas mal-amadas, beliscaram novos e desconfiados apetites. Maria do Céu é mais doces, mas pagou, em invejas e mentalidade retorcida, a fatura da sua magia.

Em Remostias, no Peso da Régua, a Doces do Céu impôs-se pelo saber, os produtos da terra e a lambarice, "mas não à custa destes turistas estrangeiros que aparecem por aqui e regressam com a barriga cheia de paisagem". As Régulas, de avelã, ovos moles e massa folhada, são uma dedicatória à sua terra. As Penaguiotas, pecado de ovos, é tributo aos de Santa Marta. As natas e os lacinhos não têm explicação, nem precisam. Já as Ferreirinhas são diamantes de chocolate, chila, amêndoa, uvas passas e vinho do Porto e trazem água no bico. Homenagem a D. Antónia Ferreirinha, mulher brava do Douro, "mas também uma forma de perpetuar, com doçura, a memória das mulheres da região, cujo destino era ter um bando de filhos, 15 ou 20, fazer o caldo à noite e aturar pancada dos maridos. E olhe que ainda há disto", lamenta-se ela.

AQUI NASCEU O 'VINHO CHEIRANTE'
Na margem esquerda, com vista para o casario estilo pato-bravo da Régua, João Azeredo também anda a matutar nas invejas que uma recente descoberta originou e que ameaça revolucionar a historiografia do Douro. Segundo um estudo do investigador Altino Cardoso, a publicar pela Universidade do Porto, a secular Casa dos Varais ocupa o território onde, em 1142, os monges de Cister iniciaram a produção do "vinho cheirante de Lamego" a partir de castas da Borgonha, para usar nas missas, que viria a ser posteriormente denominado Vinho do Porto. "Comprova-o um documento do Mosteiro de São João de Tarouca. A data, um ano antes da fundação da nacionalidade, até arrepia!", confessa o proprietário da quinta que receberá este legado.

João Azeredo foi apanhado de surpresa. A princípio desconfiado, rendeu-se às evidências. "É uma grande responsabilidade, para mim e para a região. Mas vem sustentar uma convicção pessoal: o Vinho do Porto não é apenas obra de ingleses, da D. Antónia, do Barão de Forrester ou do Marquês de Pombal, como pretendem fazer crer. Foi obra de gente mais simples e humilde", acentua. A Casa dos Varais já tinha sido pioneira no turismo de habitação, mesmo enfrentando resistências familiares. João abandonou o Porto nos anos 1980, deixando para trás a escola agrícola, e evitando o esfarelar da herança familiar. Transformou lagares, melhorou a qualidade das castas, apostou na comercialização. Na Casa dos Varais, manteve-se Maria Rosa, raro património duriense da safra de antigas cozinhas e encantamentos de levar ao lume, devidamente comprovados no arroz de pato e na doçaria. João também põe o avental, mas apenas nas ocasiões em que, fazendo uso do seu único segredo gastronómico, confeciona a Truta do Monge. "É fumada em barrica de vinho do Porto e leva sete ou oito horas a preparar", refere, orgulhoso.

Da janela da sala de jantar, ainda atordoado com os efeitos da novidade recente, repousa o olhar nas águas do Douro e medita nos tortuosos caminhos da região. "Assustam-me os projetos tipo elefante branco. Corremos o risco de replicar a Régua", medonho exemplo estético planeado de costas para o rio e "casas de banho viradas para fora", como lhe chamou D. Duarte Pio de Bragança. "O Douro é tradição, origem, genuinidade", acode Ernestina, a esposa. Ele concorda: "Os projetos e as modas não podem ignorar o rosto humano desta região."

'GANCHINHO' E O RIO CANSADO
Em Baião, a uma hora do Porto, o Douro já vai cansado, antes do encontro com o mar. Já não é bem um rio, esta bacia de águas serenas. "É mais um penico", lamenta Adriano Mouta, 73 anos, um dos últimos barqueiros vivos, imortalizados em Porto Manso, por Alves Redol. Estamos entre a terra do romance e a Pala. Nascido em Porto Antigo, do lado de Cinfães, Adriano mergulhou nas águas outrora matreiras para enganar a fome. "Tinha nove anos. Quando fiz a comunhão, levei sapatilhas emprestadas e mal segurava as calças", conta, enquanto se prepara para matar saudades do tempo em que era apenas Ganchinho, catraio travesso, filho de Joaquim Ruço, corajoso arrais da região.

Para Adriano foram dias e noites, por vezes de "nagalho à cabeça, todo nu", nadando desde Aregos, ou a domar rabelos com 70 pipas, Cockburn, Ramos Pinto, "por aí fora". Em Melres, já as ditas iam mais leves, aliviadas de litros de vinho fino, por conta de um crédito de misérias. Fez exame de quarta classe, com distinção. Disseram-lhe que escrevesse a Salazar. Um amigo embelezou o rascunho. "Acrescente 'A Bem da Nação'", recomendou o padre, influente. Adriano empregou-se na ferrovia, entre Lisboa e Porto. A vida passou-a a ver comboios, nas oficinas. Quando voltou ao Douro, de vez, encontrou-o transtornado, enjaulado em nome de futuros risonhos que poucos viram. Depois, veio o Lúcio, trasladado para o Douro, "que engoliu quanto peixe bom havia: escalo, boga, barbo. Agora só sai peixe mole, esfarelado. Nunca mais comi nada destas águas."

Adriano guarda o Douro dentro de si. Caudais de súplicas e desânimos, mas onde homens e mulheres foram erguidos ao tamanho de gigantes por sonharem com presépios acima do nível das águas. "Foi uma vida tirana. Mas se me tirassem o Douro dos olhos, matava-me logo aqui."

Clique nas imagens para ampliar. Imagens e textos da revista "VISÃO", com a devida vénia. Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Agosto de 2012. Permitida a reprodução e/ou distribuição dos artigos/imagens deste blogue sómente com a citação da origem/autores/créditos.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

O que vamos lendo no mundo virtual...

Os vinhos do Douro e Porto e a moda de Fátima Lopes
– NOVEMBRO 22, 2011 (transcrição)
POSTED IN: GASTRONOMIA E VINHOSNOTÍCIASSÃO OS MELHORES EXEMPLOS DA PRODUÇÃO NACIONAL, COM REGISTO DE SUCESSO EM TODO O MUNDO, QUE AGORA SE ASSOCIAM NUM EVENTO ÚNICO. À NOTORIEDADE DOS VINHOS DO DOURO E PORTO JUNTA-SE A MODA DA NÃO MENOS INTERNACIONAL ESTILISTA FÁTIMA LOPES, PARA DOIS DIAS DE PROVAS, PALESTRAS E DEMONSTRAÇÕES CULINÁRIAS HARMONIZADAS COM MUITA MODA. É O PORTO E DOURO WINE SHOW, PROMOVIDO PELO INSTITUTO DOS VINHOS DO DOURO E PORTO (IVDP), QUE NO FIM DE SEMANA DE 26 E 27 DE NOVEMBRO, NO CONVENTO DO BEATO, VAI JUNTAR, ENTRE OUTROS, PRODUTORES DA REGIÃO DEMARCADA DO DOURO, MANEQUINS, CHEFES DE COZINHA E ESPECIALISTAS DA ÁREA EM REDOR DE NOVOS CONCEITOS E NOVAS FORMAS DE APRECIAR OS VINHOS DO DOURO E PORTO. CATIVAR NOVOS PÚBLICOS E RECONQUISTAR OS PORTUGUESES, DESIGNADAMENTE OS LISBOETAS, SÃO OS GRANDES OBJETIVOS.
É A 6ª EDIÇÃO DO PORTO E DOURO WINE SHOW QUE, PELA PRIMEIRA VEZ, SE ASSOCIA À ESTILISTA FÁTIMA LOPES, PARA ALIAR DUAS GRANDES APOSTAS NACIONAIS: O VINHO E A MODA. MAIS DE 70 EXPOSITORES VÃO ESTAR PRESENTES PARA APRESENTAREM AS NOVIDADES A UM PÚBLICO MAIORITARIAMENTE JOVEM E INTERESSADO. MANEQUINS AGENCIADOS POR FÁTIMA LOPES VÃO “DESFILAR” AS ROUPAS DA COLEÇÃO OUTONO/INVERNO E CONTATAR COM OS NÉCTARES DO DOURO. REINVENTAR O CONCEITO DO VINHO E O SEU CONSUMO É O OBJETIVO DO IVDP QUE TEM NO EVENTO A PRINCIPAL APOSTA DE PROMOÇÃO DOS VINHOS DA REGIÃO DEMARCADA DO DOURO NO MERCADO NACIONAL.NO ESPAÇO MODA EXPERIENCE, NO SÁBADO, PELAS 18H00, FÁTIMA LOPES E MANEQUINS DA FACE VÃO APRENDER COMO APRECIAR E HARMONIZAR O VINHO DO PORTO COM CHOCOLATE.A VENCEDORA DO PROGRAMA DA RTP1 MASTERCHEF, LÍGIA SANTOS, SERÁ UMA DAS CHEFES A BRILHAR NO EVENTO, NO DIA 27, ÀS 17H30, NO ESPAÇO COZINHA AO VIVO. A PROMISSORA CHEFE DESCOBERTA NA PRIMEIRA EDIÇÃO DO MASTERCHEF, VAI ESTAR LADO A LADO COM NOMES COMO CHEFE NUNO DINIZ  (YORK HOUSE), CHEFE JUSTA NOBRE (RESTAURANTE SPAZIO BUONDI), CHEFE HENRIQUE MOURO, (RESTAURANTE ASSINATURA), GUILHERME RODRIGUES, EDITOR DE VINHOS DA REVISTA GOSTO | BRASIL, JOÃO PAULO MARTINS, SANDRA TAVARES DA SILVA E JOSÉ MARIA SOARES FRANCO.UM PROGRAMA VASTÍSSIMO, RECHEADO DE NOVIDADES E QUE ESTE ANO, PELA PRIMEIRA VEZ ENVOLVE A TÃO AGUARDADA ENTREGA DOS PRÉMIOS DO CONCURSO “GASTRONOMIA COM VINHO DO PORTO”, QUE DURANTE QUATRO SEMANAS PERCORREU O PAÍS DE LÉS A LÉS À PROCURA DAS MELHORES HARMONIZAÇÕES DOS 100 RESTAURANTES NACIONAIS INSCRITOS. NO DIA 26, ÀS 18H00.PROGRAMACOZINHA AO VIVO
26 Nov. – 17h30 – Vinhos do Douro
Justa Nobre. Chefe
27 Nov. – 17h30 – Vinho do Porto
Lígia Santos. Chefe MasterChef
ESPAÇO MODA EXPERIENCE COM FÁTIMA LOPES
26 Nov. – 18h00 -  Vinho do Porto
Manequins. Convidados
Experiências em “Voga” Porto e Chocolate
27 Nov. – 18h00 -  Vinho do Douro
Manequins. Convidados
Experiências em “Voga” Douro e Queijo
PROVAS DE VINHO
26 Nov. – 19h00 -  Vinho do Douro
Bento Amaral. Moderador
Guilherme Rodrigues / Revista Gosto, Brasil. Crítico de Vinhos
27 Nov. – 16h00 – Vinho do Porto
Bento Amaral. Moderador
João Paulo Martins. Crítico de Vinhos
HARMONIZAÇÕES
26 Nov. – 16h00 – Vinho do Porto
Henrique Mouro. Chefe
José Maria Soares Franco. Enólogo
27 Nov. – 19h00 – Vinho do Douro
Nuno Diniz. Chefe
Sandra Tavares da Silva. Enóloga
CONFERENCIAS DO VINHO
26 Nov. – 17h00 – “Exportar o Douro para o Mundo”
27 Nov. – 17h00 – “Vinhos do Porto- um novo paradigma no consumo”
Entrada
1 dia |  5€/pax com oferta de copo de prova
2 dias | 8€/pax com oferta de copo de prova
Valor de compra só do copo | 3€
FONTE: Mediana - In Jornal Norte

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Um brinde para domingo, 13 de Novembro de 2011

Douro: Várias entidades convidam a um brinde nacional no domingo com vinho do Porto

LUSA - Vila Real, 08 nov (Lusa) -- Várias entidades do Douro convidam todos os portugueses a um brinde com vinho do Porto, no domingo, Dia Europeu do Enoturismo, uma iniciativa que marca o arranque das comemorações do décimo aniversário da classificação da região como Património Mundial.
A UNESCO classificou o Alto Douro Vinhateiro (ADV) a 14 de dezembro de 2001. No âmbito das comemorações dos 10 anos após a distinção como Paisagem Cultural, Evolutiva e Viva, o Douro apela e convida para um "Brinde a Portugal e aos Portugueses", no domingo, data em que se celebra o Dia Europeu do Enoturismo.
A proposta é para que o brinde seja proporcionado, às 13:00 em ponto e em todo o país, pelo maior número de restaurantes, bares, lojas e locais. A intenção do "Brinde a Portugal e aos Portugueses" é a de que os portugueses promovam também, em suas casas, às 20:00, um brinde à família, aos vizinhos e aos amigos.