terça-feira, 20 de março de 2012

José Afonso de Oliveira Soares

José Afonso de Oliveira Soares, natural do Peso da Régua, é reconhecido enquanto artista e decano dos jornalistas de província, por João de Araújo Correia. Dirige a sua vida à causa social enquanto bombeiro, vindo a comandar a corporação entre 1893 e 1927.
O Senhor Soares, como era conhecido na terra, à qual se dedicou toda a vida, assistiu às épocas conturbadas da viragem do século XIX para o século XX, mantendo-se alheio à política. Desenvolve a sua actividade profissional, além do voluntariado nos bombeiros, no campo das artes plásticas, da literatura e do jornalismo[i].
Nos bombeiros, Afonso Soares, não faz parte do grupo de sócios fundadores, embora apoie a causa desde início, inscrevendo-se como sócio contribuinte. Em 1885, procura fundar uma biblioteca no quartel, revelando, desde logo, um grande interesse pela literatura. Sabemos, no entanto, segundo José Almeida, que essa biblioteca não “mais seria que uma estante com livros raros”[ii]. Eleito comandante da corporação em 1893, sendo o segundo da história desta associação, ocupa o cargo até 1927, ano em que abandona no comando, pois os estatutos não lhe permitiam continuar devido à idade.
Afonso Soares não se destaca no panorama artístico nacional. Embora João de Araújo Correia o designe como “desenhador, gravador, modelador e pintor”, admite, por outro lado, que Afonso Soares não evolui, em primeiro lugar, devido ao seu “feitio dispersivo” e, também, por causa do meio onde se encontrava, longe de “escolas, de estímulos e entusiasmos”[iii]. Mesmo assim, Afonso Soares mantém o seu dinamismo enquanto pintor, efectuando diversos retratos, que tratamos neste trabalho, além de outras obras, algumas delas descritas por João de Araújo Correia no conto Configurações[iv].
Dedicando-se, paralelamente, à escrita, destaca-se como jornalista na imprensa regional, chegando a ser director do Jornal da Régua (1930). Realiza uma monografia, História da Vila e Conselho de peso da Régua (1936), editado pela Câmara Municipal do Peso da Régua. A referida obra acaba por ser publicada numa segunda edição em 1979, o que demonstra a sua importância para a divulgação da cidade e para estudos locais e regionais, mantendo-se ainda actual. Esta monografia, realizada no início do século XX é a única obra de referência deste género acerca do Peso da Régua[v].
A obra plástica que se conhece consiste sobretudo em retrato desenhado, publicado na monografia que realizou e na imprensa, o retrato a óleo sobre tela, pertencentes à colecção de retratos da SCMPR. Como referimos anteriormente, Afonso Soares demonstra uma capacidade diversificada em vários géneros – desde a literatura às artes plásticas, revelando-se um artista de carácter regional, autodidacta, mantendo-se informado cerca das evoluções técnicas da época, nomeadamente da fotografia. Vai socorrer-se deste processo técnico, como faziam os demais pintores, para executar os retratos que conhecemos. Com formação em desenho técnico[vi], o seu traço revela-se com uma qualidade superior em relação à técnica de óleo sobre tela, que não dominava.
A execução técnica das obras revela a ausência de formação académica em pintura, no entanto, a execução do desenho parece-nos muito bem elaborada. A falta de formação na área da pintura leva-o a cometer alguns erros na modelação cromática quer nos fundos, quer nas carnações, retratando figuras hieráticas e inexpressivas. Sentimos que o autor se preocupa, essencialmente, com a semelhança das feições do retrato com o retratado, decorando a execução do retrato psicológico das personagens.
A prática da pintura permite-lhe aperfeiçoar a técnica de óleo sobre tela, a ponto de ser reconhecido enquanto, pintor e de ter legitimidade para fundar na Régua uma escola/ ateliê, onde ensina gratuitamente[vii]. Deduzimos que este reconhecimento público se reflecte na quantidade de obras que Afonso Soares realiza para a SCMPR, o que nos permite supor que nos inícios do século XX, este se torna o “ pintor oficial” da instituição.
Em comparação com os outros pintores expostos na sala das sessões do hospital, as obras executadas por Afonso Soares, um autodidacta, são plasticamente inferiores. No entanto, cumpriram, na perfeição, o objectivo da SCMPR, o de prolongar no tempo a memória de quem contribuiu para a Misericórdia, funcionando como exemplo e incentivo a novos benfeitores, como já referimos no capítulo anterior.
- João Tomé Duarte* - CITEM 

[i] TÓRO – O concelho do Peso da Régua.
[ii] ALMEIDA, José Alfredo – Recordar o Comandante Afonso Soares.
[iii] CORREIA, João de Araújo – Horas Mortas. Régua: Imprensa do Douro, 1968,p.23.
[iv] Ibidem,pp.23-26.
[v] Bandeira de Tóro (1946) e José Braga – Amaral (2007), realizam estudos monográficos acerca de Peso
 da Régua, no entanto, não conseguem ir além do estudo de Afonso Soares, excepto nos assuntos das
 épocas contemporâneas aos referidos autores.
[vi] Supomos ser esta a formação inicial de Afonso Soares pois José Alfredo Almeida refere que o início da
 sua actividade profissional é nas obras da Linha do Douro entre Marco de Canaveses e Peso da Régua
 como “técnico e desenhador”. Cf. ALMEIDA – Recordar o Comandante Afonso Soares.
[vii] Ibidem.

* Este texto dedicado a José Afonso de Oliveira Soares, antigo Comandante dos Bombeiros da Régua, recordado como pintor, faz parte do relatório de estágio curricular  e profissional no Museu do Douro  de João Tomé Duarte, com o título “Retratos dos benfeitores da Santa Casa da Misericórdia do Peso da Régua no Museu do Douro : estudo da coleção” (edição de Autor, Porto, 2011). Agradecemos ao autor a autorização para a sua publicação.

    A fotografia, cedida pelo Senhor Abeilard Vilela para o Arquivo dos Bombeiros da Régua, testemunha o lançamento da primeira pedra para o Monumento Sacadura Cabral, realizado em Agosto de 1925. Podemos ver ao centro, Júlio Vilela a discursar, atrás deste os bombeiros da Régua com o estandarte da sua corporação e à esquerda o Comandante Afonso Soares acompanhado de Camilo Guedes Castelo Branco.

Clique nas imagens para ampliar. Este texto está também publicado na edição do semanário regional "O Arrais" de 22 de Março de 2012. Texto e sugestão de J. A. Almeida e edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Março  de  2012. Este artigo pertence ao blogue Escritos do Douro. Todos os direitos reservados. É proibido copiar, reproduzir e/ou distribuir os artigos/imagens deste blogue sem a citação da origem/autores/créditos. 

segunda-feira, 19 de março de 2012

Autarcas e Turismo denunciam "abandono" da linha entre Régua e Pocinho

Lusa
19 Mar, 2012, 19:18 - Fonte RTP Notícias

O presidente da Turismo do Douro e autarcas da região estão preocupados com o "abandono" da Linha do Douro e afirmam que a retirada do pessoal da REFER das estações indicia mais um passo para o seu encerramento.
A REFER estará a estudar a introdução do RES (Regime de Exploração Simplificado) na linha do Douro, entre a Régua e o Pocinho, retirando assim o seu pessoal das estações do Pinhão e Tua.

Segundo a edição de hoje do jornal Público, com este sistema, é um agente da empresa que viaja no próprio comboio, ou até o próprio revisor, que sai nas estações para pedir avanço a um posto regulador central, localizado na Régua.

Nestas estações, também já não há funcionários da CP, já que os bilhetes são vendidos pelos revisores dos comboios.

O presidente da Entidade Regional Turismo do Douro, António Martinho, repudia veementemente mais esta medida, que considera ser também "mais um passo para acabar de vez" com aquele troço da linha do Douro.

"É um atentado ao interior e ao desenvolvimento turístico do Douro. Não posso aceitar uma situação dessas", afirmou à Agência Lusa.

Martinho lembrou os polos turísticos importantes que são ligados pela linha-férrea, nomeadamente os museus do Douro (Régua) e Côa (Vila Nova de Foz Côa).

"Mas, depois estamos a retirar condições para que os turistas possam fruir a paisagem. Isso é grave, tanto mais que é uma empresa pública a atentar contra o desenvolvimento do turismo e o desenvolvimento económico da região do Douro", salientou.

O responsável acrescentou que, esta medida da REFER, "indicia uma tentativa de abandono e de encerramento da linha entre Régua e o Pocinho".

"O que para mim significa o abandono de uma zona do país que tem contribuído muito para a riqueza nacional, designadamente através do turismo", acrescentou.

Também o presidente da Câmara de Alijó e da Comunidade Intermunicipal do Douro (CIM Douro), Artur Cascarejo, lamentou aquilo que diz ser o abandono da linha do Douro, a qual considerou estratégia para o desenvolvimento deste território e para a mobilidade das populações.

Além do mais, acrescentou, é também uma retirada de empregos à região, já de si tão carenciada.

Segundo o Público, o RES permite poupar duas dezenas de funcionários que estão afetos às estações de Pinhão e Tua.

"De redução em redução caminha-se para a agonia, para o encerramento da linha", frisou o autarca.

A Agência Lusa tentou obter esclarecimentos por parte da REFER, o que não foi possível até agora.

António Martinho lamentou ainda que se tenha "deixado cair" o projeto de retomar a linha do Douro até Barca d`Alva e depois Espanha, que os agentes da região defendiam.

PLI
  • Outros post's neste blogue sobre os históricos e tradicionais comboios do Douro em risco de desaparecerem.

quinta-feira, 15 de março de 2012

A minha RÉGUA ! - 20

Fotos que refletem um estado de alma sobre a nossa cidade

Clique  nas imagens para ampliar. Novas e inéditas imagens serão publicadas em breve. Imagens cedidas por José Alfredo Almeida e editadas para este blogue. Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Março de 2012. 
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quarta-feira, 14 de março de 2012

No Aniversário da Associação de Bombeiros

 Branca Martinho

Deixai-me hoje falar-vos na Associação dos Bombeiros Voluntários da nossa terra, que tem jus ao nosso carinho e merece parabéns pelo brilho com que se apresenta, pelos anos que já lhes passaram em cima, pelos actos de heroísmo a marcar na sua vida, já bem longa, de benemerências.

É uma das mais garbosas que conheço. Onde se apresentarem, distinguem-se e fazem figura.
Prestaram ontem homenagem aos seus mortos que sufragam anualmente, no aniversario da sua fundação, e honraram todos os vivos com a sua visita, os vivos que os têm ajudado.

Confesso que me alegrei ao vê-los tão ufanos da sua auto-bomba, a melhor que conheço e a mais completa, e bem assim a ambulância onde não se pode exigir mais.

Notei a satisfação incontida que sentiam pelos maravilhosos carros que possuem.

Louvores portanto, aos Ex.mos Directores, Comandantes e membros desta Associação.

A todos saúdo e louvo; e sob o sol que tornava mais viva a cor vermelha dos carros brilhavam os capacetes que pareciam oiro de irrepreensivelmente limpos.

O amor que os leva a conservar esta Associação vem de Pais a filhos, e já se comunica aos netos, não deixa ficar calada a minha alma sempre desejosa de ver progredir a nossa terra.

Mas apesar de sacrifícios sem conta, temos hoje a Associação de Voluntários dotada dos mais modernos métodos de trabalho e equiparada às mais brilhantes corporações, graças também a vários beneméritos que generosamente a teem ajudado.

A nossa terra deve sentir-se honrada e enobrecida por esta corporação. Todos os seus membros têm dado boa conta de si, e nos momentos de maior perigo lançam-se às chamas prontos a arrancar delas, aqueles que estão condenados a morrer.

Os bombeiros da Régua têm nomeada, e tanta que há dias ouvi uma frase que me fez sorrir…
Ateara-se um incêndio numa cidade ou vila próxima, mas a primeira coisa que se ouviu aos bombeiros dessa vila foi: Nós trabalhamos mas não chamem os da Régua.

Não sei se é blague, se uma graça para elevar os bombeiros da minha terra, mas por aqui se reconhece o seu valor.

Não queriam nessa terra que chamassem os bombeiros da Régua, por os saberem valentes.

Quantas pessoas vêem passar indiferentemente este punhado de homens bravos, enérgicos no perigo, resolutos na desgraça alheia, prontos a dar sem nada receber?

E no entanto pobres e ricos, nobres e plebeus, pequenos e grandes, lhe devem um acto heróico, um esforço extraordinário, uma vontade firme, nunca recusada ao mais humilde.

Têm nome e fama os nossos bombeiros, e ao vê-los tão perfilados e elegantes nos seus uniformes, fiquei consolada.

Ainda bem que esta corporação singra!

Ainda bem que há quem pratique a caridade sem nada esperar, olhando unicamente o bem da humanidade; ainda bem que nos tempos que correm há homens de coração e acção.

Já pensasteis, caros leitores, na abnegação e caridade que representa o seu trabalho, a luta com as chamas prontas a tirar-lhe a vida, todos os perigos a que se expõem para nos salvarem e aos nossos haveres?

E vêem eles agradecer!

Nós é que nunca devemos esquecer a gratidão que nos merecem. Auxiliemo-los na construção do seu quartel em obras há tanto tempo, e que necessita ser terminado.

Deste modo reconhecer-nos-emos dos grandes serviços que nos têm prestado até hoje estes heróis, estes homens de valor.

Quinta de Campanhã, 29-11-1948

Nota: Este texto de D. Branca Martinho, publicado no jornal Noticias do Douro, edição de 5 de Dezembro de 1948,  foi  assinado com o pseudónimo de Berta Maria que  usava para escrever a sua coluna semanal, intitulada “Brigada de Caridade”, dedicada aos   assuntos de beneficência, caridade e as  causas de bem fazer e do voluntariado e das instituições mais acarinhadas por ela, como era o caso da Associação Humanitária de Bombeiros da Régua, o que a distinta benemérita  demonstra   nestas   palavras de sentido respeito  homenagem aos bombeiros e directores, a estes heróis, a estes homens de valor, como ela os distingue que comemoraram em 1948,   o 68º Aniversário da Associação de Bombeiros… com imensas dificuldades para acabar a “construção do seu quartel em obras há tanto tempo”. Assim, se  faz a história dos Bombeiros da Régua.
Clique nas imagens para ampliar. Este texto está também publicado na  edição do semanário regional "O Arrais" de 8 de Março de 2012. Texto e sugestão de J. A. Almeida e edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Fevereiro 2012. Este artigo pertence ao blogue Escritos do Douro. Todos os direitos reservados. É proibido copiar, reproduzir e/ou distribuir os artigos/imagens deste blogue sem a citação da origem/autores/créditos.