Depois da criação, em 1868, de uma companhia bombeiros voluntários em Lisboa que, em 1880, se transformou na primeira associação dos bombeiros voluntários a ser formalmente instituída em Portugal, é fundada nesse ano a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua.
Nos termos dos estatutos, a nova associação destinava-se a “socorrer os habitantes desta vila e das povoações limítrofes por ocasião dos incêndios, ou suas consequências” e que “para esse fim organizará uma companhia de incêndios composta de sócios activos ou de trabalho e também dos auxiliares munida dos materiais necessários.”
Preparou e organizou a sua constituição uma “Comissão Instaladora”, composta por vinte e seis proeminentes reguenses que teve, como principal responsável, o escrivão de direito, Manuel Maria de Magalhães. Coube a todos esses homens a gloriosa missão de redigirem os estatutos da associação, compostos de 44 artigos, e um regulamento interno de 31 artigos para os sócios activos. Discutidos e aprovados numa assembleia-geral, realizada a 25 de Julho de 1880, os estatutos são de seguida aprovados pelo Dr. José Ayres Lopes, Governador Civil substituto do Distrito de Vila Real, por Alvará de 12 de Agosto de 1880.
Em 25 de Setembro de 1880, Manuel Maria de Magalhães convocava os associados para as primeiras eleições dos órgãos sociais: “Tenho a honra de convidar V. Excia para no dia 31 pelas 11 horas da manhã, comparecer na casa extinta Associação Comercial, na Rua da Boa Vista, a fim de se proceder à eleição a que se refere o nº1 do artº 22 dos estatutos das Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua”. Eleitos os dirigentes da nova associação, a sua posse foi efectuada a 7 de Novembro desse mesmo ano, sendo a primeira Direcção constituída por estas sete ilustres pessoas:
- Presidente da Direcção: José Braz Fernandes
- Vice-Presidente: João Guedes Frias
- Tesoureiro: João Botelho
- 1º Secretário: Francisco de Assis de Carvalho
- 2º Secretario: António Joaquim de Oliveira Ramos
- Fiscal da Companhia: Joaquim Pereira de Matos
- Comandante: Manuel Maria de Magalhães
Essa Direcção entendeu por bem escolher o dia 28 de Novembro para proceder à inauguração da associação. Os festejos realizaram-se, pelas 10.00 horas da manhã, na casa da extinta Associação Comercial, que se situava na rua da Boavista. No convite dirigido aos sócios activos, manuscrito e assinado pelo Comandante Manuel Maria de Magalhães e demais sócios fundadores, estava referido que aqueles deveriam comparecer “devidamente fardados, para dali se dirigirem em forma à Igreja Matriz a assistirem a uma missa que há-de celebrar-se para comemorar o acto da inauguração e a bênção das bombas.”
Esta era a primeira cerimónia pública dos bombeiros da Régua à população reguense. E, como tal, ficou como data que hoje se celebra para comemorar os aniversários da associação.
A então vila da Régua acompanhava o que se passava nas principais cidades do país, onde o movimento associativo ligado aos bombeiros voluntários se afirmava como um novo modelo organizativo para o combate aos incêndios.
A Câmara Municipal da Régua, para cumprir as leis administrativas (1842 e 1878), que lhe cometiam as incumbências de “organizar serviços ordinários ou extraordinários para extinção de incêndios” e de fazer os regulamentos policiais “para a limpeza das chaminés e fornos, e o serviço para a extinção de incêndios e contra inundações”, foi uma das primeiras a tomar a decisão em 1873 de apetrechar-se com material de incêndio, adquirindo duas bombas de incêndio.
Não tendo o executivo tomado a resolução de criar um corpo de bombeiros municipais, permitia que esse material fosse usado por qualquer pessoa, mesmo sem o saber manusear, para fazer a extinção dos frequentes e cada vez maiores incêndios urbanos que aconteciam nos armazéns de vinhos. Só que nestas circunstâncias, o socorro prestado não era o mais eficaz nas “ocasiões que a maior actividade e perícia nunca foram de mais.”
De forma que, conhecendo os riscos e os perigos, a Câmara Municipal da Régua tenha feito de imediato a entrega desse material de incêndios ao primeiros bombeiros voluntários para eles, com regras e mais técnica, combaterem o flagelo dos fogos.
Assim, pode dizer-se que a bomba de incêndios de 1973 foi o primeiro pronto de socorros a ser utilizado pelos bombeiros da Régua.
No livro a “História da Vila e Concelho do Peso da Régua”, o seu autor José Afonso de Oliveira Soares - veio a ser comandante dos bombeiros após o falecimento de Manuel Maria de Magalhães - descreve as diligências para a compra das primeiras bombas de incêndio e as movimentações de reguenses com vontade de formarem uma “companhia de incêndios”, constituída por voluntários, assunto que merece ser lembrado:
“Outras associações de recreio se criaram durante o período de 1874 a 1880.Todas, porém, de vida efémera. Neste último ano fundou-se a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua.
Havendo nesta vila tantos armazéns de vinhos que serviam de depósitos de aguardente, principalmente nas ocasiões da vindima, muito era para estranhar que os reguenses se conservassem por tanto tempo desprevenidos de utensílios para cuidarem a qualquer incêndio que por fatalidade se desse. Assim havida pensado já a municipalidade de 1843 que, em sessão de 7 de Janeiro, dirigiu uma representação à câmara dos deputados pedindo uma bomba para apagar os incêndios. Apesar de tudo, parece que só desde que um prédio, na Rua Nova, foi devorado completamente pelas chamas, é que lhes incutiu o receio de grandes perigos; e, julgando-se de vez em quando entre vulcões que lhes podiam vomitar desgraças e danos consideráveis, jamais esqueceram que era preciso prevenirem-se contra eles. Contudo, ainda só de tempos a tempos, e talvez quando algum incêndio se manifestava, é que eles de novo tentavam prover-se de material necessário para o serviço de extinção.
Em 13 de Março de 1858, constando à câmara que as companhias de seguros, com agencia nesta vila, manifestaram desejos de ter nela um estabelecimento de bombeiros, deliberou – porque o governo de sua majestade não lhe concedesse privilégios para poder organizar uma companhia de incêndios - propor-lhes o arbítrio de fornecerem uma bomba de grande força, no gosto moderno, e duas bombas de mão, ou o seu valor, ficando a seu cargo o cuidado de organizar, pelos meios ao alcance, uma companhia de incêndios. Nesta conformidade oficiou, em 13 de Abril, às companhias Equidade, Garantia e Segurança, para saber se sim ou não forneceriam as bombas, para inaugurar a sua instalação no dia de núpcias de D. Pedro V.
Ignora-se a resposta que as companhias lhe deram. Sabe-se, porém, que a câmara nada conseguiu, porque, decorridos dois anos (1860) esta, por falta de meios, de novo convidou as companhias de seguros a concorrem para um estabelecimento de bombas.
Baldadas foram, por espaço de trinta anos aproximadamente, as fracas diligências dispensadas ao assunto de tanta importância. Só depois de um incêndio que se manifestou num armazém da rua Bandeira para a rua da Alegria, sobre um tonel de vinte pipas de aguardente, foi que os reguenses mediram bem o perigo que a todo o momento corriam e simples casualidades podiam atiçar. A essa terrível explosão valeu a admirável temeridade de um tanoeiro desta vila, chamado Manuel Pinto de Souza, conhecido por Manuel do Terreiro, que se arrojou a escalar a vasilha para lhe afastar as chamas de sobre o batoque, que ele melhor apertou. Avolumando desde então a ideia da necessidade de estarem prevenidos de material para casos idênticos, apareceu enfim uma vereação em 1873, que fez a aquisição de uma bomba e de um carro de material que aquartelou na rua de Medreiros, em armazém pertencente a Manuel de Oliveira Lemos.
Tendo, porém, o material, a câmara não organizou companhia para dele fazer uso. Pondo à disposição do povo, a quem sobrou sempre coragem e actividade para acorrer a todas as desgraças, não se lembrou que aquele maquinismo só poderia servir de estorvo em ocasiões que a maior actividade e perícia nunca foram de mais. Em vista disso sugeriu aos habitantes a ideia da organização de um corpo de bombeiros voluntários, ao qual se entregasse o material municipal. Esta lembrança, abraçada pela mocidade reguense, fez com que em 16 de Julho de 1880 vários indivíduos se dirigissem à câmara a fazer-lhe saber que tendo há muito em mente a realização de uma companhia de bombeiros voluntários, haviam resolvidos nomear uma comissão para formular os estatutos e regulamento para ela; e, que, constando-lhes que se queria organizar uma outra companhia, lhe pediam para, se tal se desse com o fim de obter as bombas municipais, lhe indeferisse.
(…)
Constituídos os primeiros em associação, a câmara acedeu agradavelmente aos seus desejos, e, em 26 de Novembro do mesmo ano, fez-lhe a entrega de todo o material que possuía para serviço de extinção de incêndios sob condições de parte a parte estabelecidas. Esta associação, intitulou-se de Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua”.
- Peso da Régua, Dezembro de 2009, J. A. Almeida.
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