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sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Colectânea literária e musical de ALTINO MOREIRA CARDOSO

Altino Moreira Cardoso nasceu em 8.12.1941, na freguesia de Loureiro, concelho de Peso da Régua. Licenciou-se em Filologia Românica pela Faculdade de Letras de Coimbra, em 1969.
A sua tese de licenciatura versou a obra de um poeta da PRESENÇA: Afonso Duarte.
Frequentou, ao mesmo tempo, como elemento da Tuna Académica e do Conjunto de Câmara Carlos Seixas, o Conservatório de Música de Coimbra, na especialidade de Violino. (...) Concluído o Curso de Ciências Pedagógicas (também na Fac. de Letras da U.C.), seguiu o Ensino Secundário, com Estágio e Exame de Estado no Liceu Normal de D. João III, em Coimbra (1972). Trabalhou em algumas escolas secundárias, entre as quais: Colégio de Porto de Mós, Liceu de Vila Real, Liceu da Amadora, Liceu de Queluz (efectivo 1973-2002).
Em complemento da actividade pedagógica tem elaborado e editado diversos trabalhos, de que se cita uma obra sobre estratégia de preparação de EXAMES (Amadora-Sintra,1996), adoptada no ensino universitário (Univ. Internacional). (...)

Outras obras:
A - Edição da Didáctica Editora:
FRANCE- CENTRES D'INTÉRÊT, 1973);
É autor de centenas de canções (algumas registadas na SPA), entre as quais músicas para: a Infância, os poetas portugueses, a História de Portugal, os Contos Populares, a MENSAGEM de Fernando Pessoa...
Alguns conjuntos (populares, corais e instrumentais), têm utilizado e gravado canções suas, nomeadamente o Regional Duriense, os Rabelos do Douro, a Tuna da Escola Sup. Agrária de Santarém, o Orfeão de Leiria. (...)
Como jornalista, colaborou na revista Música & Som (1976-1979) e, com funções directivas, na Tribuna de Queluz, no Jornal da Amadora e no Jornal de Queluz.
Fundou e dirigiu o Jornal AMADORA-SINTRA (1991-2003). Mantém as Edições AMADORA-SINTRA. (...)
- In DICIONÁRIO DOS MAIS ILUSTRES TRANSMONTANOS (adapt.) - J. Barroso da Fonte. In Folclore de Portugal. As Edições AMADORA-SINTRA têm publicado as suas obras mais recentes. Transcrito do portal da ASSOCIAÇÃO DOS ANTIGOS ALUNOS DO SEMINÁRIO DE VILA REAL.
Para contacto e aquisição das obras de Altino M. Cardoso:

Clique nas imagens para ampliar. Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Janeiro de 2014. Este artigo tem a autorização de Altino M. Cardoso e pertence ao blogue Escritos do Douro. É permitido copiar, reproduzir e/ou distribuir os artigos/imagens deste blogue desde que mencionados a origem/autores.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

PESO DA RÉGUA - XVI Feira do Livro do Douro


PROGRAMA - 7 a 14 de Setembro:

07 setembro, sábado
21h00  Abertura oficial da Feira do Livro
Bombos de Vilarinho dos Freires
Concerto com o grupo Brigada 14 de Janeiro 

08 setembro, domingo
10h00 Abertura da Feira
21h30 Espetáculo com Pifaradas Zabumbadas 

09 setembro, segunda-feira
10h00 Abertura da Feira
21h30 Espetáculo com Fanfarra vinhateira

10 setembro, terça-feira
10h00 Abertura da Feira
21h30 Espetáculo com Semente

11 setembro, quarta-feira
10h00 Abertura da Feira
21h30 Concerto com Beto Mendonça e Sandra Botelho 

12 setembro, quinta-feira
10h00 Abertura da Feira
21h30 Apresentação do livro "Dois Homens num só Rosto", da autoria de Hercília Agarez
22h00 Concerto com Banda Colégio Salesiano de Poiares

13 setembro, sexta-feira 
10h00 Abertura da Feira
21h30 Apresentação do livro "A Terra de Duas Línguas II, Antologia de Autores Transmontanos", coordenada pelo Prof. Ernesto Rodrigues e Dr. Amadeu Ferreira
22H00 Concerto com Grupo Violeta

14 setembro, sábado
10h00 Abertura da Feira
21h30 Apresentação do livro "Retrato da Mãe de Hitler", da autoria de Domingos Amaral
22h00 Academia de Música da Régua
- Clique na imagem para ampliar. Programa extraído do portal "Rede de Bibliotecas do Peso da Régua"

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Retalhos da net - Tertúlia João de Araújo Correia


SEGUNDA-FEIRA, 18 DE JUNHO DE 2012

Apresentação do n.º 2 da revista “GEIA”
Dia 20 de Junho, quarta-feira, pelas 21h00
na Traga-Mundos – livros e vinhos, coisas e loisas do Douro, em Vila Real
A revista “GEIA” é o órgão oficial da Tertúlia João de Araújo Correia, sediada na Régua e criada há mais de dez anos com o intuito de preservar a memória do escritor e de divulgar a sua vasta bibliografia.
Da importância do autor de “Sem Método” fala o editorial do presente número: «A obra do autor reguense reflecte, com mestria, realismo, emoção, sobriedade e pitoresco de linguagem, a realidade geográfica e humana da sua região natal e faz eco das suas preocupações sociais, ecologistas, urbanísticas, etnográficas e paisagísticas. Além de outros pontos de interesse, tem ela o condão de nos fazer recuar aos tempos do rio de “mau navegar” e aos usos e costumes de uma ruralidade fértil, de geios, de cestos vindimos, de rogas e lagaradas, da festa da vinha.»

A apresentação, a cargo de Helena Gil e de Hercília Agarez, terá lugar no dia 20 do corrente, quarta-feira, pelas 21h00, na livraria Traga-Mundos em Vila Real.
Venha reavivar a memória deste ilustre escritor e intelectual duriense. Contamos com a sua presença...
Tertúlia João de Araújo Correia
Morada:R. Dr. José Sousa
5050-275 Peso da Régua

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

O CEGUINHO E O DEMÓNIO

Por João de Araújo Correia


Tal ceguinho era religioso por vocação e por necessidade. Gostava de assistir às missas, rezar pelos benfeitores, ouvir a palavra de Deus orada do púlpito pelos melhores jesuítas e de adormecer à noite com as camândulas presas entre os dedos magros – de tísico... A religião dava-lhe prazer e rendia-lhe coroas. Vendo-o tão pio, as beatas ricas fartavam-no de esmolas e até lhe inventaram o vício de fumar para ele se entreter – as santas criaturas.

Morava numa casa térrea ao rés do adro e tinha por costume sentar-se nos degraus de um cruzeiro levantado diante da igreja. Ali vivia – preso àquelas pedras com mais amor do que ao buraco da casa. Dali espreitava tudo – se é que os cegos espreitam. Não espreitava, mas ouvia. Dava relação de quantos passos feriam a testada do templo. Passos apressados de homens que não tiram o chapéu a ninguém – menos a uma cruz. Passos frívolos de senhorinhas que fazem vénia, mas ligeira, a Nossa Senhora. Passos doentios de senhoras de
idade, cuja reverência ao Santíssimo é meiga e prolongada. Passinhos de criança sobre o saibro, tic, tic, davam ao ceguinho a impressão do primeiro granizo que pinga na areia.

Afeito àqueles ruídos, conhecia-os todos, identificava-os, sabia o nome aos pés que os produziam. Tinha que fazer, contando-os e nomeando-os, porque o adro era aberto e muita gente o atravessava para ir mais depressa à sua vida.

O cego não pedia esmola. Cumprimentava e recebia. Quando, no meio daquele perpassar de pés e pernas, reconhecia amigo ou devota, dizia:

– Senhor E, o dia está bonito.

Ou

– Minha Senhora! A missinha amanhã é mais cedo. A Senhora sabe... Disse o Senhor Abade...

Estas frases eram a salva estendida à mão caritativa. Caíam nela moedas de prata e de cobre, que o cego apartava em saquitéis. Era muito metódico.

O trato devoto com senhoras e senhores finos dera ao ceguinho modos adamados.

– Por este não vem mal ao mundo, dizia um fidalgote pálido que tomava o Senhor todos os dias.

Tinha o ceguinho voz monocórdica e não fazia gestos violentos como pessoa ordinária. Era comedido, quase amputado no que representasse força, ousadia, sinal de vida.

– Por este não vem mal ao mundo, anuíam baixinho, dando topetadas, as beatas velhas.

Não, pelo ceguinho não vinha mal ao mundo. Todavia, ele não era insensível à aproximação da carne feminina, principalmente a carne perfumada. Distinguia as senhoras, não só pelo passo leve e curto, mas também pelo cheiro. Havia uma, cujo aroma o inebriava. Mal vinha à esquina do templo, já a sentia como perdigueiro que dá tento de caça. Dilatava as narinas, mas... imediatamente as coçava, disfarçando, e dispunha-se a falar à aparecida com unção.

– Minha Senhora, amanhã a missinha é um pouco mais cedo.

– Já sei, Fernando. Pega lá, olha, para rebuçados.

A senhora afastava-se, e ele seguia-lhe o rasto com a ponta do nariz afilada para o aroma.

Dentro da igreja, identificava os perfumes com as vozes.

– Aquela, a que canta alto, é a que cheira a cravo.

– A de voz rouca espalha um cheiro grosso que me enjoa.

– Esta, sim, tem voz de pintainho, mas é desenjoada. Cheira às ervas do monte.

Os pecados do ceguinho, como se vê, eram latentes, ocultos.

No entanto, mordia às vezes os lábios para os não revelar.

– Ah! Minha Senhora, que lin... Sim, minha Senhora, amanhã a missinha é um pouco mais cedo.

– Obrigado a Vossa Excelência. O ceguinho nunca se esquece de pedir a Nosso Senhor pela saudinha de Vossa Excelência. Que lin...

Seguia-a com o nariz como de costume. Olfacto terrível!

Mas, não só o olfacto. O ouvido também... Era de um apuro! Cativava-se de todo o som, próximo ou longínquo, e guardava de memória para sempre o som harmonioso.

– Muito bem cantou o Veni aquela que cheira à erva do monte! Parece impossível!

Dizia isto no degrau do cruzeiro quando recordava passos de festividade. Mas, dizia-o sem falar. Mexendo os beiços, mal articulava as sílabas. Não descobria o peito.

Um dia, sem mais nem menos, pediu a um irmão, com quem vivia, que lhe comprasse uma guitarra até cem mil réis.

– Pago-ta às migalhinhas... Vê se ma compras. Se ma comprares, és bom irmão. Se ma não comprares, mereces ser ajudado de Deus, mas é à moda... Oxalá que todos os cegos do mundo te amaldiçoem entre a Hóstia e o Cálice.

– Carago! És mau como as cobras...

 –Agora sou! Sou ceguinho.

Dias depois, tinha a guitarra. Não se sabe como o irmão se houve para a conseguir. Era pobre como Job. Comprou-a por milagre para evitar a praga rogada entre a Hóstia e o Cálice.

Com a guitarra nas unhas, o cego desforrou-se da tristeza e humilhação a que votara corpo e alma durante uns poucos de anos. Rompeu a capa que o cobria – capa feita do aniquilamento de todas as vontades. Pôs-se a tocar pedaços de amor musical, notas quentes trazidas pelo vento desde a cidade ruidosa até o adro silencioso.

–Não deves tocar isso, dizia-lhe uma senhora.

Ele porém não a ouvia. Erguia-se do sopé da cruz, metia-se no cardenho e iluminava-o todo com um zangarrear feito de sol.

– A guitarra deu cabo do ceguinho. Oxalá não seja a sua perdição, temia outra senhora.

Como de facto. A guitarra deu cabo do ceguinho. Deu-lhe cabo da compostura, do arranjo com que se sentava nas escadas da cruz, e até lhe deu cabo da voz monocórdica. Era com altos e baixos que proferia:

– Minha Senhora, amanhã a missinha é um pouco mais cedo. Disse o Senhor Abade.

– Está bem, está bem.

As senhoras, estranhando-lhe o modo novo de pronunciar a frase, fugiam dele. Davam à fuga, endireitando o busto, o tom particular da ira amordaçada. Só elas sabem como se faz isto.

A escarcela do cego, outrora pingue de coroas, começava a ressentir-se da metamorfose do dono. Passava dias sem se estrear com um tostão.

– Paciência. Não matei a cabra. Mato-a amanhã.

O homenzinho, que tinha sido anjo no âmbito da igreja, passara a falar calão de motorista. Adquirira desenvoltura feia em cego. Parecia maluco. Tinha febre e tosse.

Muito magrinho, cada vez mais magrinho, começou a ficar pela cama dias seguidos. Para se entreter, pedia à cunhada o favor de lhe chegar a guitarra e tocava. E até cantava!

– Bossemecê está doido de todo. Rais me parta se lhe torno a chegar às unhas esse diabo dessa biola.

O cego ria-se como perdido. Fazia-lhe cócegas a zanga pitoresca de Tomásia – sua cunhada.

– Ai, Tomasinha, a menina é um anjo. Fazia lá essa desfeita a um cego!

– Um cego que não tem juízo... Sabe que está um chato? Bom tempo, em que as coroas luziam nesta casa.

– Hão-de tornar a luzir, Tomasinha!

– Quando?

– Sabe o que me lembrou, Tomasinha? Arranjar um rapaz que cante e ir ver mundo, tocar por aí fora.

– Habia de fazê-las frescas, tísico de todo...

O cego amuou, mas, daí a pouco, em voz meio sumida, confusa, como se estivesse a sonhar, ia dizendo:

– A Tomasinha é um anjo. Parece a senhora que canta mal e cheira às ervinhas do monte.

– Doido assim!, exclamou a cunhada.

O cego estava a morrer ou fingia que estava a morrer. Não tocava guitarra, nem pegava em comida. Mas, lembrando-lhe a cunhada o dever de se reconciliar com Deus, disse que era cedo.

– Quando for altura, concluiu.

– Quando for altura, está bossemecê a contas. Lembre-se que já daí se não alebanta.

O cego respondeu como se a não ouvisse:

– A menina é um anjo...

Passaram-se dias sem que o cego pegasse em comida ou pedisse a guitarra para zangarrear. Até que uma tarde, quando o sol lhe varria a cama com um rebotalho de luz amarela, o cego implorou:

Deixe-ma ver agora. Quero despedir-me dela para sempre.

A cunhada aproximou-se do leito condoída.

– Está aqui, tataranha! Aqui!

Neste momento, o cego subjugou os pulsos da mulher e beijou-lhe à pressa as mãos, a face e os cabelos.

– De vossemecê foi que eu me quis despedir. A guitarra? Que a leve o Diabo!

– Seu porco, seu ladrão! O Quim há-de sabê-lo!

No dia seguinte, o Quim, a escumar pelos cantos da boca, intimou o ceguinho a sair de casa.

– Perdoa-me, Quim. Foi o Demónio que me atentou.

– Bai-te embora. Cego seja eu como tu se te não mato. Ou te mato ou te amaldiçoo entre a Hóstia e o Cálice. A ti e a todos os cegos do mundo. Oubiste, alicréu?

– Mata-me, que eu não saio daqui. Chama o Senhor Abade. Quero-me confessar. Por alma da nossa mãe, perdoa-me. Foi o Demónio que me atentou.

– O Demónio dou-to eu. Confessa-te na igreja, bíbora! Aqui tens as calças. Ou as enfias ou te corto o pescoço.

Daí a menos de um ai, o ceguinho estava na rua com a guitarra suspensa do pescoço.

Não se soube mais dele. Ou anda de terra em terra, tocando e cantando novos desesperos, ou, tísico no fim, o vento lhe deu no peito e o levou até um valo como faz às folhas mortas.

- In Terra Ingrata, Editorial Estampa
Clique na imagem para ampliar. Matéria transcrita e editada. Sugestão de JASA. Edição de J. L. Gabão - "Escritos do Douro" em  Janeiro de 2012.

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