D.Antónia, que nasceu no concelho de Godim no ano de 1810 viveu a sua infância na casa de Travassos, vindo a falecer em 1896 na casa das Nogueiras.
Dois anos depois da sua morte foi criada a Companhia Agrícola dos Vinhos do Porto, mais conhecida por "Casa Ferreirinha".
Ao falar do Douro, há nomes que se impõem e o de D. Antónia Adelaide Ferreira é um deles, conhecida carinhosamente por "Ferreirinha" ou "Ferreirinha-da-Régua" pelas gentes da sua terra.
Seu avô, Bernardo Ferreira, que vivera no tempo de D. José I, foi obrigado, sob pena de prisão, pelo Marques de Pombal, a grangear umas terras denominadas de Montes e de Rodo, convertendo-as em bonitas quintas. Por este processo não muito ortodoxo, o Marquês de Pombal conseguiu que muitos proprietários na época aumentassem os seus bens agrícolas, beneficiando desta maneira a região do Douro.
Um dia, quando Bernardo Ferreira regressava dum passeio, parando para descansar e matar a sede ao seu cavalo na fonte de Covelinhas, foi interpelado por duas patrulhas francesas, a quem teria respondido num impecável francês. As patrulhas pensaram tratar-se de um desertor e fuzilaram de imediato o pobre senhor sem ouvirem qualquer explicação. O Douro acabava assim de perder um grande homem.
Deixou três filhos, José, o mais velho, o António, e o mais novo, o Francisco.
José Bernardo Ferreira, de grande bondade e respeito, foi o pai de D. Antónia Adelaide Ferreira, que seria mais tarde a grande administradora da maior casa agrícola do Douro.
António Bernardo Ferreira era o mais inteligente e de espírito mais comerciante. Quando ainda só se falava de um possível confronto das lutas liberais, este senhor mete-se num barco rabelo e vai até Vila Nova de Gaia, onde vende os armazéns com todo o vinho por preço inferior ao praticado na altura. Quem não gostou nada deste negócio foi o irmão mais velho, porque os bens também eram dele e não fora consultado para o efeito.
Mas o negócio estava realizado e com o produto da venda compraram todo o vinho existente no Douro, transportando-o de seguida em carros de bois e récuas para a Figueira da Foz.
Entretanto rebenta a guerra civil e os armazéns de Vila Nova de Gaia são saqueados e o vinho derramado para o rio Douro pelos soldados enlouquecidos pela guerra. Mas enquanto o Norte sofria na carne a desgraça de uma guerra civil e a barra do Douro estava bloqueada, estes senhores faziam as exportações do vinho generoso para Inglaterra pela barra da Figueira da Foz.
Fizeram um excelente negócio e a família Ferreira ficou muito mais rica e poderosa...
O outro irmão, o Francisco, embora honrado, era um pouco excêntrico. Vivia no Alentejo e só voltou ao Douro para receber a herança depois da morte trágica de seu pai.
D. Antónia Adelaide Ferreira e António Bernardo Ferreira, primos em primeiro grau e filhos de José Ferreira e António Bernardo Ferreira respectivamente, unem suas vidas pelo matrimonio e têm dois filhos, a menina Maria d'Assunção, mais tarde Condessa de Azambuja, e um rapaz a quem deram o nome do avô e do pai.
Mas só depois da morte do primeiro marido é que o espírito empreendedor desta senhora se manifesta de forma admirável, fazendo grandes plantações no Douro e obras de benfeitoria, tornando-se numa figura de primeira grandeza. Tão importante que o Duque de Saldanha, então Presidente do Conselho, pretende que o seu filho, o Conde de Saldanha, contraia matrimonio com a filha de tão distinta senhora.
D. Antónia recusa tal convite, embora se sentisse muito honrada, alegando para o efeito a tenra idade de sua filha, que só tinha onze anos, e que também gostaria que fosse ela a escolher o seu esposo. O Duque, habituado a não ser contrariado, manda os seus homens raptar, numa noite, a menina, à Casa de Travassos.
Mãe e filha, quando souberam o que lhes pretendiam fazer, fugiram, vestidas de camponesas e ajudadas por amigos, por caminhos difíceis, para Espanha e depois para Londres, onde se refugiaram. Depois da filha casada com o Conde de Azambuja, D. Antónia casa com Francisco José da Silva Torres, seu secretário.
Com pouco mais de meio século de existência e no auge das suas capacidades de administradora, D. Antónia compra todo o vinho do Douro para dessa forma ajudar os agricultores na luta contra os baixos preços praticados por consequência de uma crise de abundância.
Com todo o vinho comprado e guardado nos seus armazéns, eis que surge uma praga terrível chamada "filoxera" que destrói a quase totalidade dos vinhedos, lançando os durienses na miséria. Era horrível de se ver... Mas com o poder negocial que se lhe conhecia e com todo o vinho nos seus armazéns, D. Antónia pôde com facilidade negociar da melhor maneira com os ingleses tornando a casa agrícola Ferreira muito mais rica. Depois da catastrófica praga da filoxera, manda replantar as vinhas. Paga a construção de quilómetros de estrada e de caminho de ferro, dá trabalho a mil operários e, desta forma, cobre as suas vinte e três quintas com milhões de cepas.
Em 1880 D. Antónia ficou novamente viúva, mas mesmo assim continuou com a sua obra benfeitora, ajudando a construir os hospitais do Peso da Régua, Vila Real, Moncorvo e Lamego. Mandou também construir no Moledo um palácio para acolher o rei D. Luis, as termas, a piscina e um fabuloso parque. Ajudou a Misericórdia do Porto, ficando esta obrigada a socorrer qualquer familiar seu, se porventura a roda da vida fosse menos favorável. Criou inúmeras bolsas de estudo, entre as quais é de realçar a concedida ao engenheiro agrónomo, Dr Tobias Sequeira.
D. Antónia, que nasceu no concelho de Godim no anos de 1810, viveu sua infância na casa de Travassos, vindo a falecer em 1896 na casa das Nogueiras. Dois anos depois da sua morte foi criada a Companhia Agrícola dos Vinhos do Porto, mais conhecida por "Casa Ferreirinha".
O Douro perde assim sua rainha, contando o povo ainda hoje muitas histórias interessantes a seu respeito.
- In Villa Regula, Setembro de 1999, texto de Marco Aurélio Peixoto.
(Transferência de arquivos do sitio "Régua" que será desativado em breve)