terça-feira, 8 de novembro de 2022

EX-COLÓNIA PORTUGUESA DE MOÇAMBIQUE - ALBUM ETNOHISTÓRICO DAS ILHAS DE QUERIMBA, IBO E MATEMO 1969 1972

👉 🇵🇹 🇲🇿 🇧🇷 — País MOÇAMBIIQUE  
— Região CABO DELGADO  
— Ilhas QUERIMBA, IBO e MATEMO  
— Autor professor doutor CARLOS LOPES BENTO  
** Edição ©forEverPEMBA OUT 2022  

Ver e ler em ☆ ▪︎   
https://issuu.com/gotael/docs/matriz/
Por Carlos Lopes Bento
Quem é Carlos Lopes Bento 
- Antropólogo. Doutorado em Ciências Sociais. Sócio da SGL. 
DADOS PESSOAIS
- Carlos Lopes Bento, nasceu no ano de l933, em  Mouriscas, concelho de Abrantes e reside no Monte de Caparica, concelho de Almada..

FORMAÇÃO ACADÉMICA
- Doutorado em Ciências Sociais –Especialidade: História dos Factos Sociais, em 1994, pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, da Universidade Técnica de Lisboa, Licenciado em Ciências Antropológicas e Etnológicas pelo mesmo Instituto e Diplomado com o Curso Superior de Administração Ultramarina pelo antigo Instituto Superior de Estudos Ultramarinos.

ACTIVIDADE PROFISSIONAL E CIENTÍFICA
- Em Moçambique, por motivos profissionais, de 1961 até 1974, onde desempenhou funções de chefia e realizou trabalho de campo entre os povos makhwa de Murrupula e Mogincual, makonde de Mueda e mwani das Ilhas de Querimba e Porto Amélia (Pemba).
- Em 1994, defendeu, publicamente, no Instituto Superior de Ciências Sociais e Politicas, da Universidade Técnica de Lisboa, a tese de doutoramento “ As Ilhas de Querimba ou de Cabo Delgado. Situação Colonial, Resistências e Mudança- 1742-1822.
- Docente universitário, desde 1980, nas Universidades Livre e Internacional e no Instituto Superior Politécnico Internacional. Para além da orientação de vários trabalhos finais de licenciatura, leccionou Introdução às Ciências Sociais, Metodologia da Investigação, Antropologia Cultural e Comportamento Organizacional nas licenciaturas de Gestão Turística e Hoteleira e de Gestão Bancária e Seguradora, do Instituto Superior Politécnico Internacional (ISPI).
- Foi director do Centro de Investigação Aplicada em Gestão Hoteleira e Turística, tendo coordenado o Projecto de I&D sobre “Culinária tradicional num processo de mudança, na zona do Pinhal”.
- Presidiu aos Conselhos Pedagógico e Científico do ISPI.
- Membro da Sociedade de Geografia de Lisboa, onde exerceu cargos de direcção, nas secções de Etnografia, Antropologia e História. Actualmente faz parte da Direcção da mesma, e de vários centros de investigação ligados a África, onde tem apresentado dezenas de Comunicações.
- Investigador em vários projectos de natureza sócio-politica e de desenvolvimento em todo o Continente e Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, designadamente, "A Reconversão da Pesca Artesanal, entre os rios Tejo e Sado- Aspectos Humanos", comparticipado pela JNICT.
- Participação em muitas dezenas de eventos científicos ligados à temática africana e do turismo.

ÁREAS CIENTÍFICAS DE INTERESSE
Continua a interessar-se pela Antropologia Africana- governação colonial, ritos de passagem, alimentação e contactos de cultura- pela cultura alimentar tradicional, pela cultura organizacional e pelos problemas humanos relacionados com a mudança em comunidades rurais e piscatórias e em organizações empresariais, particularmente, turísticas e hoteleiras

quarta-feira, 10 de maio de 2017

Era uma vez um hospital na Régua...

Régua...Os recortes de Jaime Ferraz Rodrigues Gabão:
- O Primeiro de Janeiro de 8 de Abril de 1987 - Novo bloco operatório no Hospital D. Luis I
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terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Nair Vieira Soutelinho Ferraz Gabão - Cinco anos de infinita saudade...

Peso da Régua - Portugal - Lembrando a Mãe Nair Vieira Soutelinho Ferraz Gabão, nascida em Pereiro de Agrações - Vidago/Chaves em 07/NOV/1925 e que nos deixou no dia de 06/DEZ/2011, em Aveiro-Portugal.
D. Nair, como por todos era conhecida, era esposa do saudoso jornalista Jaime Ferraz Rodrigues Gabão (também já falecido) e Mãe de Júlio Manuel Vieira Ferraz Gabão e Jaime Luis Vieira Ferraz Gabão. Residiu em Porto Amélia (hoje Pemba) - Moçambique de 1957 até 1974, data em que regressou com a família a Portugal, fixando residência na cidade de Peso da Régua.
Seus últimos anos de vida foram passados em uma clínica de Aveiro (S. João de Loure) onde, acarinhada e com a possível qualidade de vida que lhe era dispensada, se procurou minimizar o sofrimento e os tristes efeitos da doença que a acometeu.

Vai pois em paz, alma querida. A saudade tornar-se-á um bálsamo em nossos corações, e a luz que deixaste sempre nos trará, além de grandes emoções, um grande alento à alma ferida.
Eu hoje tive um pesadelo
E levantei atento, a tempo
Eu acordei com medo
E procurei no escuro
Alguém com o seu carinho
E lembrei de um tempo

Porque o passado me traz uma lembrança
Do tempo que eu era ainda criança
E o medo era motivo de choro
Desculpa pra um abraço ou consolo

Hoje eu acordei com medo
Mas não chorei, nem reclamei abrigo
Do escuro, eu via o infinito
Sem presente, passado ou futuro
Senti um abraço forte, já não era medo
Era uma coisa sua que ficou em mim
E que não tem fim

De repente, a gente vê que perdeu
Ou está perdendo alguma coisa
Morna e ingênua que vai ficando no caminho
Que é escuro e frio, mas também bonito porque é iluminado
Pela beleza do que aconteceu há minutos atrás

- Poema de Cazuza
Em memória de D. Naílde
O mar de PEMBA - Imagem de Inez Andrade Paes
ao Jaime e ao Júlio

mar quebras macio
nos areais do Índico
e manso e morno

leva a tua mão a dar
quem te aguarda

é o Senhor

Inez Andrade Paes - "Contos de Fadas não de Reis", 6 de Dezembro de 2011
Clique na imagam para ampliar
- Em homenagem (e com dolorosa saudade) a minha querida e eternamente lembrada Mãe Nair Vieira Soutelinho Ferraz Gabão, nascida em Pereiro de Agrações - Vidago/Chaves em 07/NOV/1925 e que nos deixou no dia de  06/DEZ/2011, em Aveiro-Portugal.

Clique  nas imagens para ampliar. Imagem-título de autoria de Jaime Luis Gabão. Imagem 'O mar de Pemba' de autoria de Inez Andrade Paes. Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Dezembro de 2012. Também publicado neste blogue em 6 de Dezembro de 2011 e no blogue 'Contos de Fadas não de Reis' em 6 de Dezembro de 2011. Actualizado em 6 de Dezembro de 2014. Este artigo pertence ao blogue Escritos do DouroSó é permitida a reprodução e/ou distribuição dos artigos/imagens deste blogue com a citação da origem/autores/créditos.

domingo, 28 de junho de 2015

SAUDADE AFRICANA - Manuel Coutinho Nogueira Borges

EM MEMÓRIA DE UM AMIGO QUE PARTIU HÁ 3 ANOS
Manuel Coutinho Nogueira Borges é escritor nascido no Douro - Portugal. Faleceu em 27 de Junho de 2012. Extraído com autorização do autor de sua obra "O Lagar da Memória":
(Clique na imagem para ampliar)

Onde está a África da minha saudade que conheci quando ainda não sabia que o futuro nunca é o que sonhamos?

África tão longe e tão longa que a recordação parece não ter contornos e o tempo passado permanece em cada dia que a mágoa nos aleija a alma. Acarto comigo um fardo de angústia que me isola no meio de muita gente, aquela solidão feita da repugnância do que se ouve e vê, da ingratidão que não se merece, da violência dos gestos e das palavras, da profanização sacralizada como se, na vida, só valesse o exponencial de todas as manhas.

É na invocação africana que se me diluem a podridão envolvente, a incapacidade da rotina, os olhares mal encarados, a indiferença das bocas fechadas.

Onde está a África dos meus clamores, das lágrimas escondidas nas sombras das noites de escuta?

África da surpresa por amigos esventrados, estendidos nas caixas dum Unimog ou de uma Berliet, e eu, com o seu fio de ouro nas mãos, sem articular uma frase, garganta presa pela afonia, estômago à beira do vómito, a fugir de ver o sangue e os rostos desfigurados, e os camuflados cheios do esterco da morte inglória, e as botas furadas pelos restos do chumbo, e o cérebro tomado por agulhas a picarem-me por todo o lado, por tudo que é corpo e consciência, e a olhar em meu redor sem uma luz na noite a ensinar-me o caminho, sem um som no fim da terra vermelha para me provocar o andar, sem (meu Deus!) uma esperança de que os mortos inocentes pudessem renascer para o meu convívio.

Onde está a África das cantinas no esconso da selva, das trovoadas e das chuvas apanhando-me nos descampados da savana, das queimadas fantasmagóricas nas noites despertas, perscrutando as curvas e os trilhos da traição, dos luares arrebatadores contemplados por entre os mosquiteiros já gastos pelo uso de muitos rostos, os uivos das hienas, atordoadas pelo cio e pela fome, arrepiando-me todo, acelerando o coração, alagando-me de suor, puxando a G-3, aconchegando o caqui, retesando os nervos com o dedo no gatilho?

Onde está a África das manhãs de maresia nas praias de todas as bandeiras azuis, sem ventos nem garrafões ou ossos de frango nas areias; praias tão quentes e tão finas que até parecia que um homem as pisava pela primeira vez, as suas águas tinham lábios de espuma que nos beijavam sempre em ternuras sem fim, corais como conchas vivas de um sonho irrepetível; palmares enormes como naves de catedrais góticas por onde o sol entrava, coado pelos vitrais da folhagem tão fresca, resplandecente e pura como a virgindade de uma criança?

Onde está a África das presunções fardadas, das madrinhas de guerra, das filmagens da Televisão com «um Feliz Natal e um Ano Novo cheio de propriedades», dos dias de São Vapor com cubas libres e «quem me dera regressar no Pátria!», dos calendários de mulatas nuas repletos de cruzes nos dias já passados, da obrigação de atravessar rios em almadias à procura de esconderijos de armas em ilhas paradisíacas, dos Postos Administrativos onde os sipaios nos deitavam sorrisos pepsodentes, dos funerais com danças de despedida e dos bifes de antílope a enfartaram barrigas vazias de tanta ração de combate?

Onde está a África das noites estreladas num céu tão belo e tão esmagador que dava vontade de ter asas para voar para a lua redonda como uma bola de cristal; noites de ritmos endiabrados, sensuais e espasmódicos, que o sangue fervia nas veias e rejubilava nas têmporas?

Quando o dia clareava e o fogo redondo subia na terra, um feitiço nos ludibriava com a ilusão de paz na vastidão da selva.
- Porto, M. Nogueira Borges - do livro "Lagar da Memória".
  • Outros textos de Manuel Coutinho Nogueira Borges neste blogue!

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Relembrando - UM DE NÓS - Em Memória de Jaime Ferraz Gabão

Em Memória de Jaime Ferraz Gabão
Nasceu na cidade de Peso da Régua em 13 de Abril de 1924.
Com 68 anos, faleceu a 18 de Junho de 1992, dia do Corpo de Deus, em Lisboa - onde, uns dois meses antes, se submetera a melindrosa intervenção cirúrgica. Portanto hà 23 anos!

UM DE NÓS !
Morreu Jaime Ferraz Gabão. Morreu um de nós, os do ARRAIS. Morreu, por ventura, o colaborador que mais lhe respeitava uma das linhas mais vincadas do seu carácter, bem definida no primeiro número. Dizia-se na apresentação, ENCONTRO NA RUA, que "um jornal é também a história e a consciência de uma terra". Ora, na grande maioria das suas crónicas, Jaime Ferraz Gabão foi a história e a consciência da Régua. Recordou acontecimentos longínquos, quando ao presente lhe pareceram oportunos, e sublinhou o dia a dia, sempre que lhe adivinhava a utilidade de algum eco no futuro. São incontáveis as figuras e figurinhas que desfilaram nas suas memórias da Régua antiga. Trouxe á luz dos jornais, famílias inteiras, quase extintas, o que sempre provocava nos descendentes uma onda de simpatia e gratidão, Tive a oportunidade de ler algumas cartas, vindas de longe, de uma comoção difícil de esquecer. Voltou a dar vida às ruas velhinhas, de comércios e ofícios, hoje fechados na própria nostalgia dos tempos e costumes que não voltam. 
Jaime Ferraz Gabão era um reguense pelo nascimento e pelo coração, mas de origem vareira. Sempre se orgulhou dessa origem. Viveu a geminação Régua-Ovar como um encontro dentro de si próprio. Seguiu-a do seu canto, pequeno mundo de livros e papéis. A falta de saúde não lhe permitiu assistir às cerimónias oficiais.
Estivesse onde estivesse, o seu coração pulsava pela Régua. São disso eloquente testemunho as HISTÓRIAS DO SPORT CLUBE DA RÉGUA e do NOTÍCIAS DO DOURO.

Jaime Ferraz Gabão foi um jornalista espontâneo. Como tantos outros expoentes do nosso jornalismo, foi homem de formação sem formatura. O sentimento dos jornais, o espírito atento e a experiência, foram fazendo dele o apreciado jornalista que veio a ser.
Nos muitos anos de África, passados em Porto Amélia, foi colaborador de quase todos os jornais moçambicanos, muito especialmente do DIÁRIO de Lourenço Marques. Neles praticou um jornalismo de noticiário oportuno e de inabalável sentimento patriótico. Quando a descolonização lhe desmantelou a vida, ficou a lamentar mais os prejuízos da terra portuguesa, do Atlântico ao Índico, que as suas próprias perdas. Foi em Moçambique um saudoso de Portugal e em Portugal um saudoso de Moçambique.

No seu regresso de África, veio a ser, pouco a pouco, a alma e a sobrevivência do NOTICIAS DO DOURO. Por fim, era ele, com a dedicação dos tipógrafos, a conseguir, em cada semana, um número difícil.
Quando o NOTICIAS DO DOURO sofreu, bruscamente, uma grande mudança de clima, Jaime Ferraz Gabão sentiu um desconforto tão inesperado como injusto. Para se recompor da enorme frustração, não lhe bastava ser correspondente do PRIMEIRO DE JANEIRO e colaborador esporádico do JORNAL DE MATOSINHOS. Precisava de mais espaço no jornalismo regional. Teve-o da magnânima e hospitaleira VOZ DE TRÁS-OS-MONTES e, depois, do ARRAIS. Com inquebrantável assiduidade, colaborou nestes jornais do seu espírito e do seu coração, até às últimas migalhas de saúde.

Pelo seu desinteressado altruísmo, Jaime Ferraz Gabão veio a merecer da Cruz Vermelha Portuguesa a "Medalha de Agradecimento" e a "Medalha e Cruz de Mérito". O Sport Clube da Régua, distinguia-o ,desde 1965, como "Sócio de Mérito".
Depois de completar 50 anos de jornalismo, muitas foram as homenagens e distinções merecidas por Jaime Ferraz Gabão: Rotary Clube da Régua, Clube da Caça e Pesca do Alto Douro, Voz de Tráz-os-Montes e Arrais; "Medalha de Mérito Jornalístico" da Câmara Municipal de Peso da Régua e "Louvor pelos relevantes Serviços Prestados à Imprensa Regional" da Presidência do Conselho de Ministros.

A Régua mais Régua, a Régua de Jaime Ferraz Gabão, sentiu bem e logo a sua perda, acompanhando-lhe o féretro ao cemitério do Peso, com recolhida pausa na Igreja Matriz, para celebração de missa de corpo presente. Foram celebrantes os padres António Maria Cardoso e Vital Capelo, por ausência inevitável do padre Luis Marçal.
Toda a cerimónia foi um profundo adeus a Jaime Ferraz Gabão. Um adeus, que as eloquentes palavras do Dr. António Maria Cardoso, seu velho e querido amigo, souberam prolongar no coração e no espírito de toda a gente. Foi uma evocação circunstânciada e sentida. Tão sentida que pôde acender as primeiras saudades de Jaime Ferraz Gabão, pouco antes da terra, da sua terra o tirar, para sempre, da nossa companhia.
- Peso da Régua, Junho de 1992, Camilo de Araújo Correia.*
*Agradeço a José Alfredo Almeida os recortes do Arrais oferecidos e que me permitiram a transcrição integral deste artigo do também já saudoso, companheiro e Amigo Dr. Camilo de Araújo Correia.
  • Em tempo de festas de Nossa Senhora do Socorro na cidade da Régua, recordo Jaime Ferraz Rodrigues Gabão!  
  • Jaime Ferraz Rodrigues Gabão citado no portal do Sport Club da Régua - Aqui!

quarta-feira, 17 de junho de 2015

Deixou-nos Fernando Guedes um dos obreiros do Notícias do Douro

Descansa em paz, Amigo!
Fonte - "Noticias do Douro", secção "Região"

BREVE HISTÓRIA DO MONTE DE S. DOMINGOS

BREVE HISTÓRIA DO MONTE DE S. DOMINGOS 
Ex-libris da freguesia o monte de São Domingos, com a sua ermida típica das romarias medievais, é um dos pontos de observação da paisagem duriense mais espetacular, senão mesmo o mais extraordinário. Do miradouro de São Domingos conseguem avistar-se os Municípios de Tarouca, Lamego, Resende, Mesão Frio, Régua, Santa Marta de Penaguião, Vila Real e Sabrosa. Mesmo à frente dos olhos ergue-se a imponente Serra do Marão e aos nossos pés o Douro segue calmamente até ao Porto. A oeste, em primeiro plano, avista-se Lamego com o seu santuário da Sra. dos Remédios. Para norte vê-se a Régua e mais ao longe no horizonte vislumbra-se Vila Real. (fonte Wikipédia)
CONTA-SE TAMBÉM:
LENDAS DE S. DOMINGOS - DEFESA DE HONRA
Quando por aqui passaram as hostes romanas de Trajano que acamparam no Castro de S. Domingos, um chefe militar ou lugar-tenente raptou, à passagem por Queimada, uma linda rapariga por quem se apaixonou. Procurou convencê-la a segui-lo para o acampamento. Renitente, acabou por ir à força. A moça tinha sete irmãos que tentaram, em vão, defender a honra da rapariga. Presos, foram degolados. Um deles, segundo a lenda, terá sido o primitivo S. Domingos em honra do qual foi erguida a ermida, no alto do monte do mesmo nome que na altura pertencia ao termo de Queimada, e de onde se avistam os restantes seis irmãos, todos santos e cada um com a sua ermida, aquém e além Douro, como é o caso de S. Leonardo de Galafura. (fonte "Blogue Valdigem")
(Imagens recolhidas da net, Clique nas mesmas para ampliar)

sexta-feira, 8 de maio de 2015

LITERATURA PORTUGUESA E DO DOURO - Torga no xadrez do seminário: xeque do peão ao Rei?

LITERATURA PORTUGUESA E DO DOURO
 Torga no xadrez do seminário: xeque do peão ao Rei?  
Trabalho sobre Miguel Torga, a convite, para um volume publicado pelo Grémio Literário de Vila Real, no XX Aniversário da morte do grande Escritor duriense. - Autor Dr. ALTINO MOREIRA CARDOSO
Miguel Torga, pseudónimo de Adolfo Correia da Rocha (Vila Real, São Martinho de Anta, 12 de Agosto de 1907 — Coimbra, 17 de Janeiro de 1995), foi um dos mais influentes poetas e escritores portugueses do século XX. Destacou-se como poeta, contista e memorialista, mas escreveu também romances, peças de teatro e ensaios

sexta-feira, 27 de março de 2015

A difícil Lista de Amigos!

(Clique na imagem para ampliar. Imagem original daqui.)
Inspirado em e-mail de Amigo (extraído do ForEver PEMBA):

A Lista
Oswaldo Montenegro

Faça uma lista de grandes amigos
Quem você mais via há dez anos atrás
Quantos você ainda vê todo dia
Quantos você já não encontra mais
Faça uma lista dos sonhos que tinha
Quantos você já desistiu de sonhar!
Quantos amores jurados pra sempre
Quantos você conseguiu preservar
Onde você ainda se reconhece
Na foto passada ou no espelho de agora
Hoje é do jeito que achou que seria?
Quantos amigos você jogou fora
Quantos mistérios que você sondava
Quantos você conseguiu entender
Quantos segredos que você guardava
Hoje são bobos ninguém quer saber
Quantas mentiras você condenava
Quantas você teve que cometer
Quantos defeitos sanados com o tempo
Eram o melhor que havia em você
Quantas canções que você não cantava
Hoje assobia pra sobreviver
Quantas pessoas que você amava
Hoje acredita que amam você
Faça uma lista de grandes amigos
Quem você mais via há dez anos atrás
Quantos você ainda vê todo dia
Quantos você já não encontra mais
Quantos segredos que você guardava
Hoje são bobos ninguém quer saber
Quantas pessoas que você amava
Hoje acredita que amam você.


quinta-feira, 19 de março de 2015

Cartas de longe: Lembrando o PAI, o cidadão, o jornalista Jaime Ferraz Rodrigues Gabão

Testemunhos do tempo
À memória de Jaime Ferraz Rodrigues Gabão

Era Março de 1971.

Moçambique vivia os anos de brasa do conflito armado, em plena guerra colonial.

No batalhão militar de Pemba, constituído, na sua quase totalidade por jovens do recrutamento local, ia processar-se a graduação de um furriel em alferes.

Como convinha, na sua perspectiva, para incentivo e psico exploração junto das forças vivas locais, o comando militar preparou uma pequena cerimónia para a qual , além de muitas individualidades civis e militares, convidou as delegações dos órgãos de comunicação social.

Entre estes últimos encontrava-se um homem por demais conhecido na cidade, onde a par do seu trabalho na Sagal, desde que em 1957 viajara das terra durienses para aquele torrão africano, vinha promovendo através do diário (*Diário de Lourenço Marques-Página de Cabo Delgado) de que era representante, a cidade, os seus valores, os seus anseios, as suas gentes. Fazia-o de forma discreta, sem alardes, ele que era um homem discreto, adverso a fúteis protagonismos, mas com uma garra e uma capacidade de trabalho e dedicação, que não passava despercebido o seu espírito de iniciativa e labor em prol da urbe que o acolhera.

Tinha nome esse grande Homem: JAIME FERRAZ RODRIGUES GABÃO, ele que era o chefe natural duma família de bem com nome gravado naquele chão macua; naquele chão que foi de luta, mas também de trabalho, de suor e lágrimas, mas também de alegrias e felicidades.

E foi este homem que me deixou na memória aquilo a que eu chamo um “pormenor” de comportamento, gravado na memória do tempo, desde esse dia, tão distante e tão próximo, da cerimónia no batalhão militar, na bela cidade, então Porto Amélia.

Findas as formalidades oficiais da cerimónia castrense de imposição de galões ao jovem alferes, o comandante convidou todos os presentes para um lanche/convívio no bar de oficiais.

Todos acorreram solícitos, inclusive todos os outros representantes dos órgãos de comunicação social, distribuindo os habituais sorrisos e lindas palavras de circunstância com as entidades civis e militares presentes.

E foi com alguma surpresa e interrogativos pensamentos que o jovem oficial, viu o senhor Gabão– como o conhecia, – em passada larga, denotando inusitada pressa, abandonar o local, sem se dispor a tomar parte no convívio e repasto “elegante” que se seguiu.

Inicialmente, estranhou a atitude e não conseguiu divisar o real motivo de tão apressado debandar.

Não questionou ninguém, mas também não seria necessário. A resposta concreta, sem palavras ou justificações circunstanciais, chegou-lhe logo no outro dia: o jornal diário do nosso repórter Gabão foi o único a publicar a reportagem do acontecimento. Os outros deram-no à estampa dois ou três dias depois.

O nosso homem, mais uma vez, fez jus àquilo que a cidade lhe já conhecia: primeiro a obrigação, o trabalho, depois a devoção. Melhor, primeiro a profissão, depois o camarão, os whiskys, os eventos de fachada.

Foi este o tal “pormenor”, que poderá sugerir uma banalidade circunstancial, mas que o jovem alferes não deixou escapar da sua memória, e que mais se foi avivando na medida em que foi aprendendo no tempo a reconhecer onde no concreto residem os valores das pessoas.

E por julgar um dever, aqui o deixa relatado para lembrar mais um grande homem que, por quase duas décadas, foi do Pemba, do Cabo Delgado, do Moçambique, que, como nós, aprendeu a amar.

Hoje, lembrei-me de ti, JAIME FERRAZ GABÃO...
- Em 14 de Janeiro de 2003 - por Francisco José Branquinho de Almeida Portugal.

Vamos, Jaime, vamos...

Faz um ano que me deixaste. O 18 de Junho é mais uma data da minha memória. Como este Mundo ainda não me arrancou o coração do peito nem me chupou o sangue onde ferve a minha alma, aqui estou a escrever-te para que me ouças na transcendência da comunicação espiritual que os laicos materialistas não entendem, mas fingem aceitar quando lhes interessa para o alcançar das efémeras ambições urdidas na penumbra das intrigas.

Venho convidar-te para irmos ao outro lado do mar, esse mar das Descobertas, do escorbuto, dos sofrimentos e da morte. Vamos revisitar a África onde uma geração caminhou, lutou e morreu sem saber que, um dia, o seu sacrifício seria espezinhado nas alcatifas dos sapatos de pelica.

Anda, Jaime, vamos a Porto Amélia, à cidade ondulada, a mirar-se no espelho do Ìndico, tão linda e tão calma que nem a tempestade lhe arranca as palmeiras. Vamos à praia das areias prateadas, mergulhar nas águas mornas e transparentes, com os corais ali à mão e o sal lá em frente, na linha do horizonte, quase a querer dormir, acariciando-nos os corpos. Caminharemos pela estrada de terra vermelha enquanto, ao longe, na temba isolada junto ao farol, o tam-tam do batuque vai crescendo, num frenesim de sensualidade e de suor, de crença e de dor, de delírio e de espanto.

Vamos a tua casa ver se ela ainda está rodeada de acácias, se a porta se abre e se há mesa para comermos papaias e mangas e ananases e cocos e toda a fruta nascida da virgindade do mato.

À noite, com a lua iluminando a baía, daremos uma volta pelo bairro, diremos "Olá" aos cipaios, tomaremos um café no "Polo Sul" e conversaremos sobre a Régua e as suas gentes, o meu Pai teu companheiro de Escola, as saudades das uvas com broa.

O cais estará vazio porque não é dia de S. Vapor, apetece-nos uma "Laurentina" no Marítimo, passaremos pelo Niassa até nos quedarmos no pequeno terraço da Pensão Miramar com os teus Amigos a contarem histórias do algodão e a fumarem "LM". Então, o cacimbo, virá como um nevoeiro, do lado do mar; o Paquitequete encher-se-á de ruídos e de corridas labirínticas, o Gary Cooper não dará mais tiros aos índios no barracão cinema dos monhés, subiremos a Rampa ou as Escadinhas e saudar-nos-emos com um abraço "Até amanhã".

Anda, Jaime, não hesites, vamos lá, a Porto Amélia, onde ficaram as lágrimas da tua despedida, obrigado a partires quase sem nada, fazeres as malas à pressa porque não querias ver os teus amigos de ontem transformados, repentinamente em revolucionários de sempre, porque te enojou a cobardia de uns tantos que julgavam ser possível apanhar o maximbombo do novo poder.

Vamos a Moçambique gritar que nós não temos culpa do que fizeram uns senhores que chegaram a Lisboa feitos heróis, idolatrados como salvadores, que nunca vestiram uma farda nem sabiam onde ficava África; que, por ideologias e parentescos internacionais, voltaram as costas a milhares de Portugueses que julgavam ter merecido a dignidade e a honra de reconstruirem nas matas e nas cidades a grandeza de uma Pátria.

Vamos, Jaime, vamos a Porto Amélia, dizer àqueles que, muito depois de teres vindo, te continuaram a escrever cartas de estima, que a culpa não é nossa, que não fomos refractários nem desertores, que não os abandonamos, mas nos impuseram o abandono.

Vamos, Jaime, vamos...
- Por M. Nogueira Borges-Porto-1992

QUEM FOI JAIME FERRAZ RODRIGUES GABÃO

Nasceu na cidade de Peso da Régua em 13 de Abril de 1924. Com 68 anos, depois de uma vida plena de altruismo, na alegria de fazer e conservar Amigos, dedicado à família e à sua terra, a cidade de Peso da Régua, mesmo quando residente em Moçambique, em Porto Amélia, onde ganhou o respeito, a admiração e a gratidão de todos - pelo que sempre a recordava como um apaixonado - Jaime Ferraz Gabão, Delegado do nosso jornal naquela cidade, faleceu a 18 de Junho, Dia do Corpo de Deus, em Lisboa - onde, há uns dois meses, se submetera a melindrosa intervenção cirúrgica.

Era casado com D. Nailde Soutelinho Vieira Ferraz Gabão; pai dos srs. Jaime Luis V. Ferraz Gabão (Brasil) e Júlio Manuel Ferraz Gabão (Régua); irmão de Margarida Ilharco Ferraz (falecida Porto), António Jorge Ilharco Ferraz (falecido-Régua) e Henrique Ferraz R. Gabão (Costa da Caparica); avô de três netas e um neto.

Jaime Ferraz Gabão, decano dos jornalistas da Imprensa Regional (em Trás-os-Montes e Alto Douro), começou carreira na Imprensa do Douro, tendo colaborado em jornais como "Jornal da Régua" (extinto), "Noticias do Douro" (Régua), "Noticias da Beira" (Beira-Moçambique), "Diário de Moçambique" (Beira-Moçambique), "Diário de Lourenço Marques" (Lourenço Marques-Moçambique), etç. Era delegado de "O Jornal de Matosinhos" (Matosinhos) e do "Primeiro de Janeiro" (Porto), e redactor de "O Arrais" (Régua) e de "A Voz de Trás-os-Montes" (Vila Real).

Funcionário da Estação Vitivínicula do Douro, diretor de vários clubes desportivos em Porto Amélia, foi distinguido como Sócio de Mérito do Sport Clube da Régua e homenageado pela Câmara Municipal de Porto Amélia, onde colaborou no Emissor Regional de Cabo Delgado.

Foi ainda agraciado com um "Diploma de Louvor" da Presidência do Conselho de Ministros (sob proposta do nosso jornal), com um "Diploma da Cruz Vermelha Portuguesa", pelo seu trabalho na Delegação da Régua e homenageado pelo Clube de Caça e Pesca do Alto Douro e pelo Rotary Clube da Régua, etç.

Vida, assim, intensamente vivida, em exemplaríssima dedicação à Comunidade, bem merece que o seu nome seja perenizado na sua Cidade-Berço. De resto, parece ter sido esse o sentir da multidão que o acompanhou à última jazida, depois da Missa de Corpo Presente, na Igreja Matriz, a que presidiu, por deferência do Pároco, sr. P. Gouveia e do seu Coadjutor, Sr. P. Vital (que celebrou), o Director de "A Voz de Trás-os-Montes", particular e dedicado Amigo de Jaime Ferraz Gabão.
- A Voz-de-Trás-os-Montes de 25 de Junho de 1992.

(Transferência de arquivos do sitio "Peso da Régua" que será desativado em breve)

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

28 de Novembro

A  AHBVPR celebra hoje o seu 134º aniversário, o que faz dela a mais antiga do Distrito e uma das mais antigas do País, motivo de orgulho para todos nós.
De 23 de Abril de 2010:
(Clique na imagem para ampliar)

Dedicado ao Bombeiro Auxiliar Zé Penajóia.
28 de Novembro… é o dia do aniversário da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua e mais um dia de festa para a cidade.

O programa, ao longo dos anos, é quase sempre o mesmo, é por norma inalterável, apenas muda circunstancialmente quando há inaugurações de benfeitorias no património e a bênção de novos carros de fogo e de ambulâncias. Acima de tudo, nesse dia, a população espera nas ruas da cidade, o desfile do corpo de bombeiros, com os sons e colorido da fanfarra a abrir, faça sol, frio ou chuva. Mas, começa-se sempre com a alvorada de fogo de morteiros. Depois, com os directores dos corpos sociais presentes, erguem-se no mastro as três bandeiras: a da associação, a do município e a de Portugal. De seguida, caminha-se para os cemitérios de Godim e do Peso, para em sinal de respeito se deixar uma flor nas sepulturas de bombeiros e directores falecidos. Assiste-se à celebração da Missa Solene na Igreja Matriz com muita fé e grande devoção divinal. Perto do meio-dia, recebem-se na entrada do quartel as principais autoridades municipais e nacionais, os representantes das colectividades locais, os amigos e velhos beneméritos. No Salão Nobre, quase sempre cheio de convidados, o ritual persiste nos agradecimentos e nas cortesias e ouvem-se bons discursos a exaltar o voluntariado e os generosos bombeiros de todos os tempos. Não se esquece o mérito e dedicação dos mais assíduos que são reconhecidos com medalhas de louvor. Finalmente, a festa prolonga-se no tradicional almoço de confraternização entre bombeiros, directores, associados, benfeitores e muitos amigos convidados.

Em cada aniversário, a cidade aproxima-se mais dos seus bombeiros. É isto mesmo que recorda o Dr. Manuel Augusto Escaleira, como antigo director do jornal “O Arrais”, no interessante texto “Vida por Vida”, em que expressa da melhor firma o significado de um aniversário dos Bombeiros da Régua, o festejado 103º. da Associação:

“Não é preciso ser angélico para verificar que, no mundo em que vivemos, campeia o ódio, o egoísmo e a inveja. Poderíamos também notar que os homens esquecidos da sua dignidade, são frequentemente um… para o seu semelhante.

Por isso, é reconfortante ver os exemplos de doação ao serviço, por parte de um punhado de almas generosas que tudo dão, sem nada esperar em troca.

(…)

Dentre eles destacam-se os Bombeiros Voluntários.

O seu trabalho merece o reconhecimento de rodas as pessoas de carácter e o seu realce nos meios da comunicação social.

Talvez, não seja a pessoa mais indicada para o fazer, mas sinto por estes homens desprendidos, abnegados e corajosos um respeito extraordinário.

Imagino-os numa festa familiar, num convívio de amigos ou durante o sono repousante. Toca a sirene… Eis que correm, como para ganhar um prémio, em direcção ao Quartel. Aí, num ápice, equipam-se e partem.

Vão sem uma palavra de revolta ou um gesto de enfado, para se entregarem totalmente ao trabalho, não pensando na fadiga, nem olhando a perigos.

Quantas vezes não foi a sua chegada pronta que impediu a destruição total dos bens ou a perda de vidas humanas!...

E, quando regressam, cansados, sinto-lhes no rosto sereno, a alegria do dever cumprido. Por tudo isto estes Homens merecem o nosso apreço, compreensão e estima.

Não admira, portanto o entusiasmo que anualmente se gera à volta do Aniversário dos Bombeiros Voluntários da Régua. Os nossos bombeiros completaram o seu 103º Aniversário.

Foi um dia de festa, mais uma festa íntima, como é próprio da família unida. A vila e o concelho do Peso da Régua estão com os seus bombeiros, porque os bombeiros estão com os reguenses.”

Costumam os bombeiros aproveitar o aniversário da associação para tirar fotografias das cerimónias mais brilhantes e de fazerem o seu retrato pessoal do seu agrado, numa posse de desvanecimento individual, para o guardarem em casa numa moldura, a avivar as memórias do seu passado. Foi o que fez o bombeiro José de Matos de Carvalho – o Zé Penajóia, como os seus amigos o tratam - fardado a rigor, junto ao Mercedes Baribbi, o carro de fogo que sempre gostou de conduzir, ao deixar-se fotografar num dia festivo, que será da década de 1980.

O Zé Penajóia foi um dos últimos bombeiros do quadro de especialistas e auxiliares. Essa classificação, como estava definida no velho regulamento dos corpos de bombeiros, foi legalmente extinta. Alguém que desconhece a riqueza do voluntariado entendeu que não eram necessários. Assim, deixou de ser permitido que muitas pessoas não possam dar a sua ajuda como especialistas de uma actividade. Até há bem pouco tempo, por exemplo quem era médico ou enfermeiro prestava no seio dos bombeiros os cuidados de enfermagem e de saúde e quem era motorista profissional conduzia as ambulâncias e os veículos de fogo. O quadro de bombeiros especialista e auxiliares não devia ter acabado, faz falta às corporações, pelo que tem de ser recuperado. O exemplo do Zé Penajóia prova como, através do voluntariado, certas pessoas podem ser úteis. No seu caso, ele alistou-se por volta de 1976 e serviu nos bombeiros até Março de 2010. Desde então, passou a integrar o chamado Quadro de Honra da Associação, o lugar para os bombeiros mais antigos e que deixaram a prática da actividade.

Durante 34 anos, o Zé Penajóia foi bombeiro auxiliar motorista. Sempre que os fogos apertavam era chamado para conduzir os veículos pesados. Muitas vezes, o Comandante Cardoso pediu a sua colaboração. Mas, conduziu também as ambulâncias de transporte de doentes quando não havia profissionais disponíveis para tanto serviço. Chegou a ir a Espanha, a Valhadolid, para trazer de volta um doente que aí se encontrava hospitalizado. Era a primeira vez que uma ambulância dos bombeiros da Régua tinha de passar as fronteiras do país. Não havia bombeiros que quisessem fazer esse serviço. Ele não hesitou em aceitar a missão. A viagem correu-lhe bem, sem nenhum percalço pelo caminho. Alguns anos depois, voltava a fazer nova viagem a Espanha, para transportar de ambulância um cidadão internado numa clínica.

Este é um dos muitos serviços que cumpriu com dedicação, zelo e sacrifício. A Direcção e o Comando da Associação distinguiram e louvaram-no com a atribuição de algumas medalhas: Cobre (1985), Prata (1991), Ouro (1994, 2000 e 2007), pelo tempo de bons e assíduos serviços e de dedicação e efectivos serviços prestados à causa do bombeiros portugueses.

Quem conhece o Zé Penajóia sabe que é um homem de certezas. A paixão pelos bombeiros transmitiu-a ao seu filho Marco Paulo, sapador no Batalhão do Porto e as suas duas netas, à Liliana e à Margarida, uma estagiária e a outra infante, na corporação da Régua. Tem 70 anos, mas possui uma indomável genica, que não lhe faz aparentar tanta idade. É um dos mais velhos e mais conhecidos chaufferes de táxi com o que ganha a vida. Tem uma casa de pasto, a Adega Penajóia, no Largo do Tanque Redondo, no Salgueiral, apreciada por servir bom vinho do Douro e refeições económicas confeccionadas com os sabores antigos. Nesse seu “santuário” gosta de evocar memórias de pessoas que não se esquecem, de velhos bombeiros e Comandantes que lhe marcaram o resto da sua vida.

Este homem não é indiferente ao presente, tem-lo visível numa fotografia que mostra o Corpo de Bombeiros da Régua, exposta ao olhar do público na sua adega. Não há ninguém que não se sinta seduzido pelos valores humanos que ali permanecem imutáveis. É mais um sinal da sua admiração pelos bombeiros. Embora haja quem desconheça, o Zé Penajóia encontra-se presente no meio desses anónimos bombeiros simples e humildes, que com o seu exemplo de coragem, abnegação, altruísmo e amor ao próximo, podem não figurar com o seu nome nas páginas da história, mas são os únicos verdadeiros heróis da nossa vida.
- Peso da Régua, Abril de 2010, J. A. Almeida.

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Em conversa com Nogueira Borges - LEMBRANÇA DE NATAL

Fixo-me nesta pedra tumular, branca-escura de quantos lustres, ervas à espreita misturadas com cera derretida e flores campestres caídas de uma jarra. Debruço-me no gradeado que delimita o jazigo e penso:

“A minha geração paternal está toda aqui, com o meu Pai à frente, há mais tempo do que eu tenho de vida. Estão no silêncio da eternidade, indefesos, noites e dias sem uma Avé-Maria, sequer um ciciar dos que não esquecem. Uns, partiram, ainda jovens, sem a oportunidade de um arrependimento, um adeus; outros, velhos, cansados de tanto esperarem. O meu Pai foi sem ouvir o meu primeiro vagido (imaginou-me apenas), derrotado pela doença maldita a que chamam prolongada. Morreu sem me beijar, fazer uma festa na moleirinha, pegar-me ao colo, imaginar parecenças, mudar-me uma fralda, alvitrar um nome baptismal, embalar um sono, viver a maior seriedade amorosa da existência.

O que faz, afinal, a ilusão da vida? O que a dimensiona na escassez ou na lonjura dos anos? É a substância da dádiva e do amor, mesmo na brevidade biológica, ou o vazio desafectado no prolongamento biográfico? A vida nem ao menos tem lógica. Há quem morra sem uma ruga, com o sol e o pranto a adornar a despedida; há quem parta encolhido por remorsos velhos sem uma réstia de deixar saudades.

Morreu-me antes do tempo, sem tempo para lhe pedir um conselho, uns tostões para rebuçados ou para uma bola de futebol, para divergirmos quando não estivéssemos de acordo, para nos amarmos, sempre, até o sangue secar.

Aqui estou, só, com um sol fraquinho encoberto pelas nuvens de Dezembro a lembrar o Natal. Um Natal que nunca partilhei com ele e já nada me diz porque o transformaram numa hipocrisia, numa feira de vaidades, num símbolo pagão, materialista, sem solidariedade e sem virtude. Resta-nos as cruzes dos Cristos vivos e mortos, exemplos e memórias contra o ódio e a inveja que nos consomem. Um dia aqui estarei desde o nascimento sem ti até à morte contigo “.

Um vento agreste varre o alto da Corredoura. O sussurro da folhagem dos eucaliptos acentua o abandono do palacete envelhecido onde brinquei em criança, diante do qual encolho um grito inominável e pergunto por que vendem os homens as histórias das suas vidas? Lá ao fundo, para os lados de Rio Bom, há uma paisagem amarelecida, desamparada, com os fumos das chaminés a acentuar o deserto dos caminhos. O Douro, esse, não morre, continua a correr, leva nostalgias, sonhos e destroços. Há muitos Meninos Jesus na encosta-presépio de Loureiro, mas eu nunca tive um Pai Natal Vivo.
- De M. Nogueira Borges* extraído com autorização do autor de sua obra "O Lagar da Memória". (Atualização daqui)

Pode ler M. Nogueira Borges neste blogue e no blogue "ForEver PEMBA". *Manuel Coutinho Nogueira Borges é escritor e poeta do Douro-Portugal. Nasceu no lugar de S. Gonçalo, freguesia de S. João de Lobrigos, concelho de Santa Marta de Penaguião, em 5.10.1943. Faleceu em 27 de Junho de 2012 na cidade de Vila Nova de Gaia. Está sepultado em Cambres - Lamego. Frequentou o curso de Direito de Coimbra, cumpriu o serviço militar obrigatório em Moçambique, como oficial miliciano e enveredou pela profissão de bancário. Tem colaboração dispersa por diversos jornais, nomeadamente: Notícias (de Lourenço Marques); Diário de Moçambique (Beira), Voz do Zambeze (Quelimane), Diário de Lisboa, República, Gazeta de Coimbra, Noticias do Douro, Miradouro, Arrais e outros. Em 1971 estreou-se com um livro de contos a que chamou "Não Matem A Esperança". (In 'Dicionário dos mais ilustres Trasmontanos e Alto Durienses', coordenado por Barroso da Fonte. Manuel Coutinho Nogueira Borges está no Google.

Clique  nas imagens para ampliar. Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Dezembro de 2012. Em homenagem ao saudoso Amigo MANUEL COUTINHO NOGUEIRA BORGES. Também publicado neste blogue em 19 de Dezembro de 2010. Este artigo pertence ao blogue Escritos do DouroSó é permitida a reprodução e/ou distribuição dos artigos/imagens deste blogue com a citação da origem/autores/créditos.

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

CAMILO DE ARAÚJO CORREIA - O escritor e médico do Douro 'partiu' em 30 de Outubro de 2007

Texto do blogue ForEver Pemba de 30 de Outubro de 2007, escrito portanto há 7 anos atrás:

"""A vida acontece entremeada de alegrias, surpresas e desgostos a que costumo chamar de "pontapés"... Hoje recebi mais um, bem forte, doloroso porque "partiu" um AMIGO... AMIGO que, pela distância física, nem permitiu a permuta de um último abraço de despedida !

A notícia chegou assim, bem simples:
""Lamento trasmitir esta infeliz noticia. Faleceu o nosso grande Amigo Dr. Camilo. Já transmiti à Filha os sentimentos em nome da nossa Família... Faleceu no Porto, e está a caminho da casa mortuária do Peso da Régua. Será sepultado amanhã em Canelas. Logo à noite vamos ao seu velório.""

Para os leitores do blogue e Amigos que o recordam do tempo de Porto Amélia, onde foi director do Hospital Militar nos anos 60, aqui deixo link's que permitem a leitura de alguns de seus textos. E transcrevo um de seus "Apontamentos de Histórias Perdidas".
Descansa em paz Dr. Camilo de Araújo Correa (nasceu em 1925 na cidade do Porto mas viveu na Régua desde os três anos de idade).

Quando recordo o tempo de Porto Amélia, muitas vezes me salta na memória o meu amigo Armando Cepêda.
Era um homem largo, inteligente e bondoso. No carão de pugilista a linha dos olhos e a linha da boca traçavam, a miúdo, um sorriso paralelo a deixar transparecer uma acomodada filosofia de vida.
Era casado com D. Maria, senhora absoluta da Pensão Miramar. E digo senhora absoluta porque ali quem mandava era ela. Nem o marido nem os filhos davam a mínima ordem naquela nau de tripulação negra, capaz de todas as preguiças e descuidos. Com dois berros e dois cascudos aquela criadagem indolente andava numa roda viva. D. Maria era uma senhora robusta, de língua solta com sotaque do Porto.
Parecia um salpico, na costa de Moçambique, do pincel genial de Abel Salazar, em momento de inspiração tripeira. Armando Cepêda mandava na sua oficina de reparação de motores de que era especialista em Diesel. A oficina ficava na Rampa, aquela encosta medonha que nem a bordadura de acácias rubras conseguia suavizar. Medonha e obrigatória na ligação da parte alta com a parte baixa de Porto Amélia.
Passei muitas horas naquela oficina entre carcaças da mais diversa maquinaria avariada, à espera que Armando Cepêda lhe restituísse a serventia perdida. E dava gosto ver aqueles dinossauros sair de um sono pesado e regressar ruidosamente à floresta, com uma palmada na anca. Uma palmada que só o meu amigo Cepêda sabia dar.
Conseguíamos conversa entre roncos de motor e marteladas de todos os sons. E tudo servia para dois dedos de conversa, a fazer sede para dois goles de cerveja. Guardo ainda um cinzeiro de pé alto que Armando Cepêda me fez numa pausa do serviço. É a estilização de uma cobra erguida na ponta do rabo a equilibrar meio coco na fúria da cabeça.
Antes e depois de jantar, Armando Cepêda derramava o corpanzil naquelas cadeiras do jardinzinho da pensão à espera de todos os cansaços, de todos os tédios e nostalgias. Recordo ainda o perfume adocicado das magnólias que o calor da noite parecia libertar suavemente.
Os hóspedes vinham chegando, um a um, à roda das cadeiras e a eles se juntavam residentes de Porto Amélia para dois dedos de conversa. Pessoas vindas de toda a parte pelas mais variadas razões, algumas delas muito roladas pelas mais diversas geografias. Comerciantes, agricultores, médicos, funcionários públicos, engenheiros, militares, todos enleados naquele fio de nostalgia tropical que parece igualar todos os homens.
As palavras iam ficando mais espaçadas e moles com o andar daquelas noites suadas. Mas se a conversa caía sobre o mato, Armando Cepêda erguia-se um pouco da posição quase horizontal, para, pouco a pouco, dominar o assunto.
E todos nos erguíamos um pouco também para o ouvir contar histórias de camiões atolados no matope, dos perigos e dos encantos do mato. E de caça. Armando Cepêda não era, digamos, um caçador de safaris. Era caçador solitário, muitas vezes por exigência da esposa, quando a despensa fraquejava. Apertado por ela, Armando Cepêda ia ao mato abater um javali como quem vai ao fundo da capoeira buscar um frango.
Por duas vezes o acompanhei nesta caça de subsistência. A ele e ao Jacinto dos Caminhos de Ferro devo o conhecimento do mato. Sem eles a minha África teria sido pouco mais do que uma África de cidade. Jacinto era uma velha glória do Benfica. Ter sido guarda-redes das primeiras categorias era uma recordação que lhe fazia ainda rebrilhar os olhos. Jacinto era um caçador tão metódico como apaixonado. Dois pisteíros negros, o velho Land Rover, um bom farolim e a arma escolhida para o tipo de caça determinado. E eu, às vezes, graças a Deus! Sim, dou graças a Deus por ter vivido o emocionante espectáculo de andar a esmo pelo mato, com o jeep aos solavancos, farolim a esquadrinhar os espaços mais suspeitos e a surpreender os animais na intimidade da noite.
Inesquecíveis aquelas imbabalas saltitantes e graciosas como bailarinas a fugir ao palco de luz que lhes ofereciamos. E aquela sensação de liberdade plena que se experimenta, ao descansar nas quinandas, ouvindo o crepitar da fogueira e do falajar dos negros contra o silêncioprofundo do céu?Sempre me pareceu que Jacinto, mesmo a mexer na burocracia do seu emprego, tinha os olhos no mato. Tanto que, mal deixava a secretária, caía no quarto a pintar. A pintar o mato; sempre com animais em primeiro plano e, tão recortados, que pareciam postos ali depois do quadro pronto. Não era um bom pintor. As telas eram o seu mato teórico para onde gostava de ir, a qualquer hora. Uma vez, só porque me demorei um pouco mais a ver três gnus a pastar, ofereceu-me o quadro. Na bagunça do regresso, o quadro perdeu-se. E tenho pena. Estaria hoje numa das minhas paredes com as saudades da África a retocá-lo todos os dias.
De uma vez o Jacinto convidou também para a caça o Dr. Manuel Jóia, médico do «Bartolomeu Dias», ancorado na baía de Porto Amélia, em patrulha da costa de Moçambique. Foi o seu baptismo de mato. O grande entusiasmo com tudo o que ia acontecendo redobrou quando, ele próprio, abateu um javali. Entre as seis e as dez da manhã é fácil encontrá-los nas áreas da sua predilecção. Passam como carruagens de um comboio rápido. Jacinto aconselhou:
— Aponte a um dos primeiros... Pode ser que acerte num dos últimos...
E o Manuel Jóia acertou, julgando, a princípio, não ter acertado. O raio do bicho com um rombo na barriga ainda se fartou de correr como se nada fosse com ele! Depois lá caiu como se tivesse caído do comboio.
No «Bartolomeu Dias» os oficiais comeram javali até lhe chegarem com um dedo e festejaram o seu médico como um herói da selva.
Voltemos ao meu amigo Armando Cepêda. Ele era, como já lhes disse, um caçador solitário. Saía antes da madrugada e regressava antes do entardecer. Da segunda vez que fui com ele «à carne» aconteceu uma coisa que me apetece contar.
O sítio escolhido para o abate foi uma velha machamba de milho abandonada, entre Porto Amélia e Mecufi.
— Aqui é um sítio bom por causa dos restos do milho e não há macacos a denunciar a nossa presença com a gritaria — disse o Armando Cepêda, saindo da picada.
Não havia meia hora de sol, quando apareceu um javali do outro lado da pequena veiga que dominávamos completamente de onde nos haviamos instalado. Era um animal relativamente pequeno, a grunhir e a estraçalhar a um e outro lado do focinho temeroso.
Parecia nada recear e, no entanto, toda aquela energia de patas e focinho parava, de vez em quando, como se tivesse havido um curto-circuito. Depois de uns segundos de imobilização total, a fúria do javali restabelecia-se para, daí a pouco, sofrer nova pausa.
— O bicho está desconfiado... eles são muito desconfiados... — disse Armando Cepêda, à boca pequena, sem tirar os olhos do javali.
Como vinha na nossa direcção, a certa altura ficou a uma boa distância de tiro.
—Então?!—perguntei baixinho.
— Quanto mais perto o abatermos, menos custa a arrastar para o jeep...
— Pois é... — disse, reconhecendo a minha inexperiência.
Armando Cepêda sorriu aquele sorriso de linhas paralelas.
Quando o javali ficou a uns trinta metros, perguntou-me se queria atirar.
— E se falho e não aparece mais nenhum? Não podemos aparecer à D. Maria de mãos a abanar!...
— Deus nos livre!... Ninguém a aturava!...
Soaram dois tiros com intervalo de um segundo. O javali caiu no meio da erva como um saco de batatas.
Com um arame atado às patas de trás e um pau atravessado na outra ponta foi fácil arrastá-lo até ao jeep.
O «mata-bicho» à sombra daquela mangueira isolada no mato rasteiro, ainda hoje me sabe. D. Maria era uma senhora farta. Arranjou-nos um farnel que dava para atravessarmos a África. Fígado de cebolada, meio metro de omelete, carne assada, queijo, muito pão, cerveja e água mineral. Do começar ao palitar, foi uma larga hora a comer. A comer e a contar coisas.
No fim de arrumar a tralha, com o método e a lentidão que o caracterizavam, disse o Armando Cepêda, já todo contente com a ideia:
— Vamos cumprimentar o meu amigo Rosas! É chefe de posto aqui perto. Vai ficar todo contente!
Era realmente ali perto e o senhor Rosas ficou todo contente. Quis logo que nos sentássemos na varanda e foi dizendo:
— Vindes em boa altura! Tenho uma esplêndida carne de búfalo novo; vou já arranjar uns bifes e umas costeletas...
— Para mim, não! — cortei, aflito.
— Ora essa!... Por quê?! — admirou-se o senhor Rosas.
— Desculpe... é que acabámos agora mesmo de comer este mundo e o outro...
—Bem... Bem!—respondeu desalentado, mas logo a berrar lá para dentro:
— Hassan!
Apareceu um negro, a limpar as mãos, a fazer vénias e a sorrir de orelha a orelha.
— Prepara uns bifinhos e umas costeletas daquela carne... com aquele molho... Tu sabes como é!
Hassan sabia como era. Meia hora depois, apareceu na varanda com uma travessa enorme no meio de uma pequena mesa portátil, já posta para três pessoas. O cheiro da carne apanhou-me de surpresa. Era de tal maneiras agradável e penetrante que até as glândulas salivares me doeram!
— Vai uma pontinha, doutor, só para provar? — perguntou-me o senhor Rosas de olhinho irónico.
— Isso cheira pela vida... — consegui dizer em plena vertigem.
A pontinha de carne que o senhor Rosas me pôs no prato «só para provar» foi uma costeleta do tamanho de uma raquete de ping-pong espessa, suculenta e aromática...
A princípio com uma certa cerimónia e depois com uma certa gula lá fui andando pela costeleta fora. Acabei a «raquete» como mandam as regras: pegando-lhe pelo cabo... Quando pousei o osso rapado, diz-me o senhor Rosas com sorriso de vitória:
— Então, doutor, estava boa?
A vitória não foi do senhor Rosas. Foi da África. Daquele sentir tudo de novo, como uma estreia dos sentidos, em cada momento que passava.
Conheci Megama Abdul Kamal muito antes de o vir a encontrar, frequentemente, na Pensão Miramar. Megama era régulo do Chiure, com influência religiosa numa larga faixa de terreno entre o Rovuma e o Lúrio. Homem abastado, senhor de terras e camiões, era também transportador habitual da grande companhia algodoeira Sagal.
Fui a sua casa a convite do Armando Cepêda, chamado a consertar o motor de um poço. Nas apresentações vi que eram grandes amigos. Julgo que, por isso, Megama me olhou logo com respeito e franqueza, sem duvidosa humildade dos negros daquele tempo.
O motor ficou composto num instante. Nós levámos mais tempo... Megama quis que provássemos de todos os seus petiscos. Seu era também o café, da planta à chávena. A mâozada firme e confiante com que nos despedimos havia de repetir-se, vezes sem conta, por todo o meu tempo de Porto Amélia.
No regresso ao jeep, ouvi falas e risinhos por detrás de uma paliçada.Notando a minha estranheza, Armando Cepêda logo me esclareceu:
— São as mulheres de Megama...
Na cidade, vim a saber pelo Jaime Ferraz que deveriam ser umas sete... Em Porto Amélia o Jaime sabia um pouco de tudo!
Um dia, Megama apareceu no Hospital Militar todo dobrado e cheio de dores. Era uma hérnia estrangulada, há três dias... Os cirurgiões costumam «berrar» com os doentes por virem tão tarde, em evidentes situações de solução cirúrgica. Mas o Dr. Manuel Simões Coelho não berrou. Tratava-se de Megama Abdul Kamal! E por se tratar de tão importante personagem o post-operatório teve aspectos de pereqrinação.
Vinham negros de toda a parte, trazidos por aquele fio invisível que é o sentimento religioso, temperado na fé e na obediência.
Com o vai e vem da gentiaga, a vida do hospital acabou por se perturbar. Ao ponto de, pelo terceiro dia, o Simões Coelho me pedir:
— Tu, que és todo amigo do Megama, podes garantir-lhe que está livre de perigo, que tudo vai correr bem...e pedir-lhe que faça constar as suas melhoras, a ver se acaba esse corrilório!...
Assim fiz. Megama compreendeu e actuou muito bem. As visitas acabaram de um dia para o outro. Nem umas só voltou a aparecer! Ainda hoje me espanta o extraordinário poder de comunicação dos negros naquelas lonjuras primitivas, sem rádio, sem telefone e sem correio.
Armando Cepêda era um caso curioso de fotógrafo. Nem amador, nem profissional. Era fotógrafo de ocasião, para ganhar uns cobres suplementares. Essa ocasião surgia quando os indígenas precisavam de retrato para a caderneta. Dava-lhe jeito aproveitar os domingos, que no mato não têm qualquer significado. Era sempre recebido nas aldeias com grandes manifestações de contentamento. Nas pausas da algazarra, fotografava quatro negros de cada vez, sentados numa tábua. Depois, no «estúdio», a tesoura lá os separava. No domingo seguinte, a caminho de outra, passava pela aldeia fotografada e distribuía os retratos. Havia corridinhas e gritos de alegria, com todos a querer ver a cara de cada um no retalhinho de papel.
Um dia houve um pequeno acidente... Toda a gente parecia satisfeita, quando apareceu uma reclamação, já com o jeep a ronronar a partida.
— Patrão!... Patrão!... esta não é do nosso!
— Não é tua?! É tua, sim senhor!! — garantiu Armando Cepêda olhando para o negro e para o retrato.
—Não é!... Não é!... Nosso não tem chapéu!
Armando Cepêda sabia lidar com os negros. O grande respeito e admiração que lhes infundia emanava do seu grande espírito de justiça e bondade. Além disso, era um branco forte, compunha máquinas e matava leões.
Não teve a mínima dificuldade em desfazer o equívico. Pôs a mão no ombro do negro e sossegou-o, assim:
— Ah!... o chapéu?... Fui eu que pus. É saguate! (brinde, oferta)
Os olhos do negro rebrilharam com aquela gorjeta inesperada. Depois vieram as palavras de gratidão de uma boca babada de riso:
— Brigado, patrão!... Brigado, patrão!...
E partiu, a misturar-se com os outros. Talvez a fazer-lhes inveja.
- Camilo de Araújo Correia - Livro de Andanças.

O calor está chegando aos trópicos...
Com ele vem o canto das cigarras.
Mas hoje, seu som parece-me mais triste !
Jaime Luis Gabão"""

domingo, 31 de agosto de 2014

Conheça o Reguense Jaime Ferraz Rodrigues Gabão

Cruzar a linha não é muito fácil, em especial quando não há vantagens ou ganhos em retorno. É nesta hora que você percebe e entende quem tem consideração, quem reconhece!
Conheça o Reguense Jaime Ferraz Rodrigues Gabão
As cartas enviadas desde Porto Amélia em Moçambique sobre o Sport Clube da Régua.
Jaime Ferraz Rodrigues Gabão

Nasceu na cidade do Peso da Régua em 13 de Abril de 1924.
Com 68 anos, faleceu a 18 de Junho de 1992, dia do Corpo de Deus, em Lisboa - onde, uns dois meses antes, se submetera a melindrosa intervenção cirúrgica.

Tive a oportunidade de ler algumas cartas, vindas de longe, de uma comoção difícil de esquecer. Voltou a dar vida às ruas velhinhas, de comércios e ofícios, hoje fechados na própria nostalgia dos tempos e costumes que não voltam.  
Jaime Ferraz Gabão era um reguense pelo nascimento e pelo coração, mas de origem vareira. Sempre se orgulhou dessa origem. Viveu a geminação Régua-Ovar como um encontro dentro de si próprio. Seguiu-a do seu canto, pequeno mundo de livros e papéis. A falta de saúde não lhe permitiu assistir às cerimónias oficiais.
Estivesse onde estivesse, o seu coração pulsava pela Régua. São disso eloquente testemunho as HISTÓRIAS DO SPORT CLUBE DA RÉGUA e do NOTÍCIAS DO DOURO.

Jaime Ferraz Gabão foi um jornalista espontâneo. Como tantos outros expoentes do nosso jornalismo, foi homem de formação sem formatura. O sentimento dos jornais, o espírito atento e a experiência, foram fazendo dele o apreciado jornalista que veio a ser.
Nos muitos anos de África, passados em Porto Amélia, foi colaborador de quase todos os jornais moçambicanos, muito especialmente do DIÁRIO de Lourenço Marques. Neles praticou um jornalismo de noticiário oportuno e de inabalável sentimento patriótico. Quando a descolonização lhe desmantelou a vida, ficou a lamentar mais os prejuízos da terra portuguesa, do Atlântico ao Índico, que as suas próprias perdas. Foi em Moçambique um saudoso de Portugal e em Portugal um saudoso de Moçambique.

No seu regresso de África, veio a ser, pouco a pouco, a alma e a sobrevivência do NOTICIAS DO DOURO. Por fim, era ele, com a dedicação dos tipógrafos, a conseguir, em cada semana, um número difícil.
Quando o NOTICIAS DO DOURO sofreu, bruscamente, uma grande mudança de clima,Jaime Ferraz Gabão sentiu um desconforto tão inesperado como injusto. Para se recompor da enorme frustração, não lhe bastava ser correspondente do PRIMEIRO DE JANEIRO e colaborador esporádico do JORNAL DE MATOSINHOS. Precisava de mais espaço no jornalismo regional. Teve-o da magnânima e hospitaleira VOZ DE TRÁS-OS-MONTES e, depois, do ARRAIS. Com inquebrantável assiduidade, colaborou nestes jornais do seu espírito e do seu coração, até às últimas migalhas de saúde.

O Sport Clube da Régua, distinguia-o, desde 1965, como "Sócio de Mérito".
Depois de completar 50 anos de jornalismo, muitas foram as homenagens e distinções merecidas por Jaime Ferraz Gabão: Rotary Clube da Régua, Clube da Caça e Pesca do Alto Douro, Voz de Tráz-os-Montes e Arrais; "Medalha de Mérito Jornalístico" da Câmara Municipal de Peso da Régua e "Louvor pelos relevantes Serviços Prestados à Imprensa Regional" da Presidência do Conselho de Ministros.


- Peso da Régua, Junho de 1992, Camilo de Araújo Correia.*


Conheça algumas das cartas enviadas e publicadas pelo Jornal Notícias do Douro, sobre o SC Régua.
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Transcrito do site - Sport Clube da Régua

Alguém disse: Cruzar a linha não é muito fácil, em especial quando não há vantagens ou ganhos em retorno. É nesta hora que você percebe e entende quem tem consideração, quem reconhece! Minha gratidão imensa ao Dr. José Alfredo Almeida, Amigo sempre presente pela pesquisa dos textos, ao pessoal do Notícias do Douro pela autorização, na pessoa do Dr. Armando Mansilha, salientando também o velho Amigo, funcionário e jornalista Fernando Guedes, que se encarregou de fotocopiar os recortes acima expostos e ao Sport Clube da Régua, a quem meu saudoso Pai ofertou amor e inúmeras horas de dedicação intensa, desinteressadas e permitiu a digitalização-publicação no site do clube. Seu pensamento-coração, mesmo longe, em terras de África (Porto Amélia, hoje Pemba), estavam também no rincão natal. - Jaime Luis Gabão, 4 de Maio de 2011.
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