sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Grande cancioneiro do Alto Douro. Nas cantigas do Alto Douro.

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O livro GRANDE CANCIONEIRO DO ALTO DOURO de autoria de Atino Moreira Cardoso foi apresentado na nova biblioteca da Régua logo no ínicio de suas atividades.

O primeiro volume contém 600 cantigas em 640 páginas.

- Plano geral da obra:

Volume I - “CANTIGAS DA VINHA“ precedidas de uma tese inicial que liga algumas cantigas á lírica trovadoresca (cantigas populares de amigo), provenientes de Santiago de Compostela, no início da fundação da nacionalidade, com D. Afonso Henriques, em Lamego (e Tarouca).

Volume II - “MÚSICAS DE TUNAS RURAIS, NATAL-REIS, ROMANCES, CANTOS RELIGIOSOS, CANTOS AVULSOS DO TRABALHO, DESGARRADAS.

  • GRANDE CANCIONEIRO DO ALTO DOURO.NAS CANTIGAS DO ALTO DOURO. por Altino Moreira Cardoso - Aqui! (versão integral em "pdf") - 05/09/07.
  • PORTUGAL, DOURO, PESO DA RÉGUA (o site) - Aqui!

terça-feira, 30 de setembro de 2008

De Jornada.

(Clique na imagem para ampliar. Imagem criada por Fernando Guichard e que consta da publicação "O Contador de Histórias Dos Jardins Suspensos" de autoria de José Braga-Amaral em primeira edição de 2004 da Associação dos Amigos do Museu do Douro.)

Por ocasião em que se discute o uso oral e escrito da língua portuguesa e se fazem alterações à mesma, lamenta-se que sem ampla discussão popular que envolva a totalidade das nacões que falam a lingua de Camões, o que coloca em dúvida a legitimidade da iniciativa, com seus "defensores" justificando que a simplificação e uniformização linguística favorecem o combate ao analfabetismo(?), transcrevo aqui um conto do médico e escritor duriense João de Araújo Correia, falecido em Dezembro de 1985.

Poderá notar-se ao ler o texto, o quanto a forma de falar e escrever a nossa magnífica lingua portuguesa foi modificada ao longo dos anos e termos/vocábulos seculares vão sendo esquecidos por "falta de uso" ou comodismo simplista destes "novos tempos". Como também notarão certamente, a "imensidão" do mundo para além do Marão, descoberto pelo cinquentão Morgado de Santa Quitéria, em sua primeira viagem à "distante" Lamego, para lá da Régua e do Rio Douro.

Este post é dedicado ainda à memória do prezado e falecido Amigo, Gil Guedes, vereador da Câmara Municipal de Peso da Régua. A ele devo a generosa oferta da publicação "O Mestre de Todos Nós", de onde extraí este conto, quando, hà uns anos atrás, tivemos a alegria de nos reencontrar em nossa cidade-berço, bela e também sempre presente onde quer que estejamos.

DE JORNADA - Por João de Araújo Correia.

Este conto veio de pais a filhos. Conta-se á lareira, todos os invernos, em Trás-os-Montes.

Só acabará quando não houver lareiras nesta província. Nem lareiras, nem lenha que aqueça os narradores.

O Morgado de Santa Quitéria, homem botocudo, abalou da aldeia pela primeira vez, para ir a Lamego, do outro lado do rio, aos cinquenta anos.

Era vulgar, naquele tempo, nascer e viver uma pessoa na concha de uma aldeia. O que não era vulgar era decidir-se um homem aos incómodos duma jornada no limiar da velhice. A ida do Morgado à cidade lendária, com o peso de cinquenta anos em cima dum cavalo, afligiu a família e alvorotou os vizinhos.

O que valeu, para sossego da Senhora Morgada, foi a confiança que tinha no cavalo e no arrieiro - envelhecidos em casa, à manjadoira e na cozinha, sem desgosto de categoria. Conheciam, melhor do que ela e o marido, o estirado caminho da cidade, aonde iam, pela carne e pelo trigo, todas as semanas.

Mesmo assim, a Senhora Morgada responsou o marido a Santo António - não fosse o inimigo, oculto em alguma brenha, empecer-lhe a viagem. Têm-se visto exemplos... Ao Morgado, homem mazombo, é que não ocorreu ideia de perigo. Benzeu-se, por se benzer, picou o burro e despediu - com arreiro à frente a romper caminho. Bem precisava de o romper, que a manhã inda não era clara.

Passado o horizonte de Santa Quitéria, deparou-se ao Morgado, pela primeira vez, a serra do Marão - safira lapidada a preceito pelo melhor joalheiro. Sobressaía de uma série de largas cumiadas.

- Aquilo é que é o Marão?, perguntou o Morgado ao companheiro. Bem se diz lá que não dá palha nem grão. Que há-de aquilo dar?

Foi esta a observação que o Morgado de Santa Quitéria fez ao arrieiro ao encarar o Marão pela primeira vez.

Se o Morgado de Santa Quitéria fosse poeta, diria ao arrieiro mais alguma coisa ou não diria nada. Certo e sabido é que chocaria um poema ou criaria um mito - o casamento de Apolo, ainda inocente, com uma serra virgem.

O Morgado não era poeta nem para aí caminhava. Quando, de cima do cavalo, à sua mão direita, lhe apareceu o fundo vale do Tanha, com povoações ainda adormecidas, perguntou ao criado:

- Olha lá, Manuel, qual destes povos é então a cidade?

- Não é nenhum, por enquanto... Saberá Vossa Excelência que esta pinhoca de casas, que parece feita á navalha, com ruas do lá vem um tão direitas como se as tirassem por pautas, é a Persegueda. Mais adiante, onde está a igreja, ao pé do rio, é Vilarinho. Além, é Alvações... de Tanha, que há outra Alvações. Mas nenhum é a cidade. Daqui lá...

Calou-se o fidalgo. Foram descendo, vagarosamente, para o rio Corgo. No lugar das Paredes, amo e criado tiraram o chapéu à porta duma capelinha.

- Manuel!, berrou o fidalgo.

- Senhor!

- Não é nada... No primeiro repente, ao ver esta capela, tão asseada, ao cimo desta rua, pensei que fosse já a cidade, como quem diz: a Sé. Tenho ouvido dizer, lá em casa, que há uma Sé na cidade.

- Pois, sim, fidalgo, mas, daqui lá, morre a burra e quem na tange.

Ao atravessarem o Corgo, na união deste rio com o rio Douro, receou o fidalgo afogar-se, vendo a àgua humedecer, a pouco e pouco, as pernas do cavalo. O arrieiro, de cima das poldras, sossegou-o, dizendo:

- Não tenha medo, fidalgo, que ele está afeito...

Livres da água, perguntou o fidalgo:

- Qual dos dois, afinal, é que é o Douro? O gordo ou o magro?

- É o gordo, fidalgo. O magro chama-se Corgo.

Na Régua, pequena vila como era então, quis o fidalgo, à fina força, ver a cidade. Tanto comércio, tanto carro de bois, tanta pipa, tanto sal, tanta barrica de sardinha salgada... deram-lhe volta ao miolo.

- Tira-me daqui, Manuel, que já estou arrependido de ter saído de casa. Para que é tanta pipa?

Cruzaram o ventre do rio Douro na Barca. A proa, como um cutelo alceiro, rasgou, de baixo para cima, a corrente do ponto do Clérigo. O fidalgo, de pé sobre o remoinho bulhento, manteve-se impávido. Subiu-lhe à carranca o doairo dum navegador.

Do outro lado do rio, na subida de Cambres, parou o cavalo e pôs-se a olhar para todas as bandas. Pareceu-lhe que as montanhas, como grandes meninas, dançavam de roda, acenando-lhe com lenços brancos. Sentiu-se estonteado.

- Olha, Manuel, estou a ver que malho do cavalo abaixo!

- Agora malha, fidalgo! Tenha mão...

Passante a Bugalheira, deram de costas ao rio Douro - parado, ao sol da manhã alta, como jibóia empanturrada. Faíscava.

- Manuel, cismou o fidalgo, nunca pensei que o rio Douro fosse tamanho lontro.

Chegados a Portelo, diz o fidalgo:

- Graças a Deus, que sempre chegámos...

- Inda não, fidalgo! Inda havemos de passar pelo Relógio de Sol. Depois... falaremos.

Amuou o fidalgo. Mas, reagiu... Endireitou, no selim, o corpo de atleta. Olhou para longe, para as encostas de Trás-os-Montes. Aqui e além, relampejavam aldeias.

- Disseste aí, Manuel, que havemos de passar pelo Relógio de Sol... Meu Deus! Nunca pensei que o mundo fosse tão grande!

Ponham os olhos neste morgado os que almoçam em Lisboa e jantam em Paris, acham o mundo pequeno e querem ir à Lua procurar o espaço.
Livro: "O Mestre de Nós Todos" Antologia de João de Araújo Correia;
Autor: João de Araújo Correia;
Organização: José Braga Amaral;
Patrocínio: Câmara Municipal do Peso da Régua;
Direção gráfica e capa: Loja das Ideias;
Impressão: Papelmunde, SMG, Lda. - V. N. Famalicão;
1.ª edição: Dezembro de 1999;
Depósito legal: 144936/99;
Colecção: Campo da Literatura - 33
CAMPO DAS LETRAS - editores, S. A., 1999
Rua D. Manuel II, 33-5.º - 4050-345 Porto
  • Acordo Ortográfico - o que é que muda? - Aqui!

terça-feira, 29 de julho de 2008

História de um soneto.

(Clique na imagem para ampliar)
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Na dramática noite do dia 8 de Agosto de 1953 estava em frente à estação da Régua, junto ao muro que dá para o rio Douro, assistindo ao dantesco espetáculo. Com seis anos de idade à época, acompanhava meu saudoso Pai Jaime Ferraz Rodrigues Gabão. Jamais saiu de minha memória a beleza assustadora e dramática das chamas envolvendo o edifício enorme da Casa Viúva Lopes. Foi experiência que marca até aos dias de hoje, com nitidez impressionante, minhas lembranças.
- J. L. Gabão, Brasil, Julho de 2008.
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O perigo anda de mãos dadas com a vontade de acudir e de servir a todos. A tragédia espreita a cada canto, e por vezes a morte sai a rua. Foi o que aconteceu no dia 8 de Agosto de 1953 com o Bombeiro João Gomes Figueiredo. João de Araújo Correia, homenageou o valente Soldado da Paz como se pode ler no texto abaixo:
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HISTÓRIA DE UM SONETO
- Por João de Araújo Correia
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Quando, em 1953, ardeu por completo, nesta vila, a CASA VIÚVA LOPES, empório de secos e molhados, como se diz no Brasil, morreu no incêndio o bombeiro João Figueiredo, mais conhecido por João dos Óculos.
No dia seguinte ao fogo, vi o cadáver, estendido de costas, do lado de dentro de uma abertura, que tinha sido, poucas horas antes, uma das portas da grande mercearia.
O corpo do João, ligeiramente vestido, como que ostentava, em toda a extensão das partes descobertas, o que se diz em Medicina, queimaduras do primeiro grau.
Não sei se a rápida morte do João foi devida às queimaduras, talvez mais extensas do que as ostentadas, se foi devida a asfixia ou queda. Não li relatório de autópsia nem sei até se o João foi autopsiado. Sei que morreu durantge o incêndio da CASA VIÚVA LOPES.
Era um pouco triste e um pouco frio, no trato, o João dos Óculos. Mas, homem bem comportado, honesto compositor na IMPRENSA DO DOURO. Vi-o trabalhar, muitas vezes, sem erguer os olhos do componedor.
Tive muita pena do desgraçado bombeiro. Tanto mais, que me eram simpáticos os seus padrinhos e pais adoptivos, o já cansado tipógrafo João Monteiro e sua mulher, a Senhora Glorinha, proprietários de uma arcaica tipografia quase morta chamada TRASMONTANA. Tinham descido de Vila Pouca de Aguiar à Régua, com seu prelo, como se tivessem embarcado para o Brasil. A Régua é chamariz de quem precisa de governar a vida.
Tive muita pena do João dos Óculos, falecido em 1953. Quando, em 1955, festejou as bodas de diamante a benemérita ASSOCIAÇÃO DOS BOMBEIROS VOLUNTÁRIOS DO PESO DA RÉGUA, lembrei-me dele e da sua trágica morte. E, vai daí, andando a passear no meu quarto, improvisei um soneto à sua memória. Digo improvisei, porque me apareceu no cérebro, desde a primeira à última palavra. Nasceu-me, de mais a mais, a conversar com um dos meus filhos, o Camilo, que não é nada tolo, como toda a gente sabe.
Por ele não ser tolo, recitei-lhe o soneto antes de o escrever.
Mas que má impressão lhe causei! Premiou-me os catorze versos com uma coroa de catorze espinhos. Disse-me que eram versos de cego.
Versos de cego, em 1955, eram uma versalhada, que os ceguinhos entoavam na rua, ao som da viola, violão ou outro instrumento de corda, para apurar tostões. Levavam de terra em terra, tocando e cantando, o noticiário de grandes casos. Eram, quase sempre, eco de grandes crimes, principalmente crimes passionais.
Estou a ouvi-los entoar a versalhada, que, na opinião de meu filho, era mãe do meu soneto.
Embora... Publiquei os meus catorze versos numa folha ilustrada, comemorativa dos setenta e cinco anos dos nossos Bombeiros.
Aqui reproduzo o soneto como se repetisse a minha oferenda a um quartel que festeja, em 1980, o primeiro centenário. É como segue:
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BODAS DE DIAMANTE
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O João dos Óculos nasceu bombeiro.
Embora fosse pálido e franzino,
Cumpriu até o fim o seu destino
Com impoluta alma de guerreiro.
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Nenhuns braços lhe foram cativeiro
Mal da sereia ouvisse o som mofino...
Em uma noite de luar divino
Foi encontrar a morte num braseiro.
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A sua Associação, cândida amante,
Celebra hoje as bodas de diamante,
Quase cem anos de exostência honesta.
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Um bom diamante, sócios, é carvão.
Ide buscar o coração do João
E fazei dele o símbolo da festa.
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Mal chegou a Lisboa o sonetito, encontrou no Dr. Nuno Simões carinhoso acolhimento. Depois de o ler na folha única, não se conteve o ilustre publicista. Comunicou o seu entusiasmo à Associação dos Bombeiros.
Isto de críticos... Se todos pensassem o mesmo, a respeito de qualquer obra, tombava o mundo para uma banda, correria o risco de se perder na imensidade.
Todos os conselhos ouvirás e o teu não deixarás - reza o prolóquio. Todas as críticas ouvirás e a tua não deixarás - digo eu antes e depois de publicar os meus escritos. Sei ou suponho que sei até que ponto merecem ser publicados.
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Não se ficou somente pelo texto atrás reproduzido, a homenagem do "Mestre de todos nós" ao bombeiro falecido no incêndio da Casa Viúva Lopes...
Foi fatídico esse ano de 1953. A 24 de Dezembro, coube a desdita ao garboso e corajoso Afonso Pinto Monteiro, que acabado de almoçar, ao primeiro toque da sirene veio a correr atá ao Quartel. O incêndio era em Sedielos, e ainda a viatura subia a rua junto à Igreja Matriz de Godim, e já o Bombeiro falecia por indigestão provocada pela pela aflitiva corrida de momentos antes.
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Livro - "Bombeiros Voluntários do Peso da Régua-125 anos da sua História";
Propriedade - Bombeiros Voluntários do Peso da Régua;
Autor - Manuel Igreja;
Fotografia - B. V. do Peso da Régua, Foto Baía, Manuel Igreja;
Paginação, fotolitos e impressão - Imprensa do Douro;
Depósito Legal n. 234957/05;
Tiragem - 2.000 exemplares.

História de um Soneto
João de Araújo Correia
Jornal "O Arrais", Quinta feira, 27 de Janeiro de 2011
(Dê duplo click com o "rato/mouse" para ampliar e ler)
História de um Soneto

terça-feira, 8 de julho de 2008

Há quinze anos para sempre...

Tanta grandeza de alma
Em cada sublime acção
Conta-nos a pequenez
Leva-nos a dar a mão
Pois pode haver outra vez...
(Manuel Igreja)
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Por Camilo de Araújo Correia.
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Os Bombeiros Voluntários do Peso da Régua fizeram cento e dez anos (2005). É um numero bonito. Não pode ser redondo, mas por traduzir muitos, muitos milhares de horas de trabalho e sacrifício de quem dirige, de quem comanda e de quem obedece a regulamentos e sentimentos em benefício do mais anónimo dos anónimos - o próximo.
O programa de festas cumpriu-se no dia 2 de Dezembro e com ele a tradição de visitar bombeiros, directores, comandantes, sócios e benfeitores falecidos, sepultados nos cemitérios da Régua e de Godim; de assistir à missa na Igreja Matriz; de percorrer em formatura as principais ruas da cidade; de apresentar cumprimentos à Câmara Municipal.
Antes do almoço tradicional, sempre animado, houve imposição de medalhas, cerimónias de tocante significado, em que os silêncios e os aplausos sublinham os méritos distinguidos.
A Direcção e o Comando mantiveram também a tradição de convidar autoridades, afinidades e simpatias mais evidentes, o que sempre corresponde a uma boa apresentação de toda a Régua. E, assim, nos aniversários a cidade fica ainda mais perto dos seus bombeiros.
Quem já fez uma dezena de anos, ao assistir a estas festas centradas nas magníficas instalações dos nossos bombeiros, não pode deixar de recordar o velho e minúsculo quartel do Cimo da Régua. Velho, modesto e pequeno, mas muito querido dos seus frequentadores e visitantes fortuitos, sem falar do rapazio, incapaz de passar adiante sem se deslumbrar com o pronto-socorro de cadeirinhas e com a ambulância, uma caranguejola esquinuda, de um branco muito duvidoso e um conforto ainda mais duvidoso... Os carros entravam à justa na porta estreita, sempre com grande vozearia de indicações e avisos.
O quarto do Zé Pinto, o quarteleiro, era também minúsculo e abria para o "parque automóvel". Deste se passava à sala de jogos, por dois degraus. O quartel acabava aqui, se não contarmos uma pequena cozinha lá no fundo. Cozinhava ali a senhora Antoninha, esposa do Zé Pinto, ainda hoje inconformada viúva, e ele próprio preparava os petiscos que os jogadores da noite lhe pediam.
Jogava-se um bilhar muito gozado, um dominó muito batido e umas cartas muito lambidas.
Havia, ainda, uma estante de livros sonolentos, perturbados, muito de longe em longe, por esporádico leitor.
As formaturas só se desfaziam no quartel, à medida que iam entrando. De maneira que a porta estreita oferecia grandes dificuldades para manter o aprumo. As maiores dificuldades ainda eram as do Justino, garboso porta-bandeira de muitos anos. Garboso, mas desastrado... De rígida marcialidade, esquecia muitas vezes o globo de entrada; aquele globo de luz melancólica marcada por uma cruzinha vermelha. A rigidez do corpo e do gesto não lhe permitia baixar suficientemente a bandeira. Zás!... mais um globo. De nada valiam os avisos dos colegas mais próximos, feitos, ,disfarçadamente, pelo canto da boca: -Ó Justino... Ó Justino... olha o globo! Bumba!... mais um.
Até que um dia o Justino, muito infeliz, propôs que se arranjasse um globo de lata.
Coitado do Justino. Já lá está, nem sei há quantos anos.
Não pôde levar a sua querida bandeira dos Bombeiros da Régua. Ainda bem... Eu sei lá, se com o vagar da Eternidade, nos andaria a quebrar as estrelas, uma a uma.
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Livro - "Bombeiros Voluntários do Peso da Régua-125 anos da sua História";
Propriedade - Bombeiros Voluntários do Peso da Régua;
Autor - Manuel Igreja;
Fotografia - B. V. do Peso da Régua, Foto Baía, Manuel Igreja;
Paginação, fotolitos e impressão - Imprensa do Douro;
Depósito Legal n. 234957/05;
Tiragem - 2.000 exemplares.