quarta-feira, 11 de maio de 2011

Dr. Soveral Andrade - Era um dos nossos…


Dr. Soveral Andrade
(1953-2011)
Era um dos nossos…

“Nisto erramos: em ver a morte à nossa frente, como um acontecimento futuro, enquanto grande parte dela já ficou para trás. Cada hora do nosso passado pertence à morte."
(Séneca)


"Cada novo amigo que ganhamos no decorrer da vida aperfeiçoa-nos e enriquece-nos, não tanto pelo que nos dá, mas pelo que nos revela de nós mesmos."
(Miguel Unamuno)


Os amigos morrem cedo, muito antes do tempo. Alguns morrem cedo demais. Morreu aos 58 anos de idade, no dia 9 de Maio do corrente ano, José Luís Montenegro Soveral Andrade, vitima de doença prolongada, personalidade conhecida, distinta e reconhecida pelo seu prestígio no foro na Régua e em muitas outras comarcas judiciais onde fez uma brilhante advocacia.

 O Dr. Soveral Andrade era um excelente grande advogado, dizem todos os seus colegas. Digo-o também eu que fui seu estagiário no seu primeiro escritório instalado numa sala no rés-do-chão da casa dos seus pais, na Av. Antão de Carvalho. Consegui-o, pelo seu saber e trabalho árduo, ser o melhor da sua geração.

A sua vida, apesar de curta, mas certamente cheia de vivências, deixa marcas na sociedade reguense. Os seus 58 anos de vida não foram em vão, foram cheios, intensos, muito cheios pelo que fez a nível profissional e social. Com os amigos era insuperável na maneira delicada e fácil como partilhava os seus momentos de evasão e sonhos. Em nós, é natural que nos deixa tristeza e saudades pela sorte que tivemos de usufruir a sua companhia.

Mas deixa, sobretudo, um exemplo da sua dimensão humanista na Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários do Peso da Régua, talvez desconhecido de muitos reguenses.

Nos anos de 1984-87, ele serviu a Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários do Peso da Régua como Presidente de Direcção.

Foram três anos da sua vida que contribuíram para uma causa maior, a dignificação do associativismo e do voluntariado. Não trabalhou para receber méritos nem medalhas. Soube dignificar os princípios e com a sua experiência ajudou os soldados da paz a cumprirem o lema mais importante de uma missão de socorro: “vida por vida”.

Não podemos dizer que fez tudo o que seria possível, mas deve ter sentido muitas preocupações nas reuniões de direcção, o que não foram barreiras ou obstáculos que não vencesse pelo seu génio, talento e dinamismo. Sabemos que a sua acção se destacou, principalmente, na resolução dos problemas financeiros que surgiram após a construção do Bairro Social dos Bombeiros.
Depois de deixar de exercer esse cargo directivo, o Dr. Soveral Andrade permaneceu como um simples associado, mas esteve ser presente para os bombeiros. Quando a sua ajuda era precisa, nunca recusou dar as palavras de conforto e de estímulo e de, muitas vezes, aconselhar e prestar serviços jurídicos a título gratuito.

O Dr. Soveral Andrade esteve a nosso convite, pela última vez, no Salão Nobre do Quartel dos Bombeiros da Régua, no dia 28 de Novembro de 2010, para assistir às cerimónias da sessão solene do 130º aniversário da Associação.

Para nós era um momento particularmente importante. Estava presente o Dr. Duarte Caldeira, o Presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses, a anunciar a realização do 41º Congresso Nacional dos Bombeiros, em finais de Outubro, na Régua.

No seu olhar, adivinhamos-lhe um regozijo por saber que tínhamos conseguido prestigiar os velhos pergaminhos da centenária Associação como uma das melhores e mais importantes do país.

Acreditem que termos o Dr. Soveral Andrade, ao lado de mais cinco antigos presidentes de direcção, naquela majestosa sala, nos honrou e deixou mais satisfeitos. Aquele momento, foi privilegiado para lhe pudermos dizer uns breves elogios, aos quais ele fez um sorriso de agradecimento.

A Associação e os Bombeiros da Régua estão de luto. Depois da sua família, sentem com dor e mágoa a perda de um dos seus melhores homens, um dedicado cidadão, sensível e generoso, que trabalhou uma pequena parte da sua vida para fazer o BEM.

Era um dos nossos…

Na história da Associação, o seu nome será evocado pela sua disponibilidade e gratidão. Por isso, sentimos muito, quando nos avisaram, da sua partida inesperada.

O seu corpo foi sepultado, ao fim tarde de 11 de Maio, no cemitério de S. João da Pesqueira. Os bombeiros acompanharam o seu funeral da Capela da Casa da Criança até à missa de corpo presente celebrada na Igreja Matriz. Na passagem pelo quartel tocaram a sirene, em seu respeito, a assinalar o último adeus, enquanto o estandarte da Associação cobriu o seu caixão até descer ao jazigo da família.

A sua memória ficará connosco na Régua, no coração dos seus amigos e colegas de profissão e, em especial, nos Bombeiros da Régua.

Até sempre, Dr. Soveral Andrade.
Até sempre, amigo Zé Luís.

Como dizia Santo Agostinho nos seus escritos de fé, sabemos que ele não está longe de nós, que está apenas do outro lado do Caminho...

Como o fazia junto de nós, a sorrir para a vida que viveu com alegria, paixão e, sempre intensamente, nos seus limites.

Estejas onde estiveres neste momento, queremos que saibas que és mesmo um Amigo, verdadeiramente, único e inesquecível.
- Peso da Régua, 11 de Maio de 2011
José Alfredo Almeida
Presidente da Direcção da AHBV de Peso da Régua.
Obs. - Clique nas imagens acima para ampliar.
== :: ==
Dr. Soveral Andrade
(1953-2011)
Jornal "O Arrais", Quinta feira, 19 de Maio de 2011
(Dê duplo click com o "rato/mouse" para ampliar e ler)

Dr. Soveral Andrade (1953-2011)

terça-feira, 10 de maio de 2011

RECORDANDO…

(Clique na imagem para ampliar)

António Guedes

O Quartel dos Bombeiros Voluntários da Régua encontrava-se pessimamente instalado no rés-do-chão de uma velha e acabada casa, situada num local imprópria, não só devido à pouca largura da rua como, ainda, pelo trânsito intenso e continuo que por ela passava.

De facto, na estrangulada rua dos Camilos, quase na confluência com a rua Serpa Pinto, tornava-se extremamente difícil e, por vezes, perigosa a saída das viaturas, as quais eram forçadas a executar lentas e arreliadoras manobras para entrarem ou saírem do quartel. Por vezes produziam-se “engarrafamentos” de trânsito, que davam lugar a aborrecidos atrasos e que eram causados por condutores repontões, que se insurgiam contra nós, atribuindo-nos a culpa do que sucedia.

Era uma arrelia, uma constante dor de cabeça.

Em vista disso, a direcção e o Comando da Corporação concluíram que eram absolutamente necessário, para se acabar com aquele inferno, construir um quartel, embora modesto, mais situado num local amplo e apropriado, no centro da vila. Essa resolução veio precisamente ao encontro dos desejos do Corpo Activo, que se comprometeu (e cumpriu briosamente), a trabalhar para esse seu tão grande anseio se concretizasse.

Jaime Guedes, ao tempo presidente da Direcção dos Bombeiros e simultaneamente vereador da Câmara Municipal, aproveitou essa feliz oportunidade e falou sobre o assunto, com os restantes vereadores – Dr. Mário Bernardes Pereira, Capitão Afonso Alves de Araújo, Alberto Gonçalves Martinho e Dr. Abel Duarte Teixeira de Araújo -  e solicitou-lhe a sua concordância no pedido que em breve iria fazer à Câmara Municipal.

De facto, numa das primeiras sessões realizadas, ele apresentou uma proposta, na qual solicitava que o município adquirisse e entregasse aos bombeiros um pequeno prédio, situado na Av. Sebastião Ramires, onde em tempos esteve instalada a Associação de Socorros Mútuos 1.º de Maio, e terrenos anexos, afim dos Bombeiros Voluntários ali construírem o quartel de que tanto careciam.

Essa proposta foi aprovada por unanimidade, demonstrando a vereação, por essa forma, a sua simpatia pela velha e gloriosa Corporação que, há perto de um século serve a Régua e os concelhos limítrofes.

Mas, Jaime Guedes, não deixou arrefecer o entusiasmo do momento, numa outra proposta, que igualmente foi aprovada, solicitou a concessão, aos Bombeiros, de um subsidio de cinquenta mil escudos, destinado a custear as primeiras despesas da construção do tanto desejado quartel.

Estava dado o primeiro e gigantesco passo para a concretização do grande e sublime sonho que a nós, velhos bombeiros, há muito nos embalava.

Jaime Guedes, filho de bombeiro e irmão de bombeiros, iniciou imediatamente as necessárias demarches, destinadas a levar a cabo essa grande obra, que hoje constitui um motivo de orgulho para a gente da Régua – e que é o modelar quartel dos seus bombeiros.

A planta do prédio foi imediatamente executada pelo distinto arquitecto Oliveira Ferreira, autor do projecto da capela do Asilo José Vasques Osório, e a empreitada da obra adjudicada ao mestre pedreiro Anastácio Inácio Teixeira, reguense de gema e artista admirável, que burilava a cantaria com primor, o mesmo enlevo e carinho como que as nossas lindas minhotas consagram às suas artísticas e primorosas rendas de bilros.

A sua proposta foi, muito sensivelmente, a mais baixa que se recebeu.

Já o prédio estava muito adiantado quando se constatou, com enorme surpresa e desgosto, que havia errado o orçamento que figurava na sua proposta e que, nessas circunstâncias, não poderia concluir a obra pela qual tanto se interessava e tanto o envaidecia.

Tornou-se taciturno e pouco falador, notando-se nele um grande cansaço e uma constante tranquilidade.

Restavam-lhe, pois, duas alternativas:

A primeira, que muito a amigável e sinceramente lhe foi sugerida pela própria Direcção dos Bombeiros, era que parasse imediatamente com a obra e que se tranquilizasse, pois nada lhe seria exigido, - sugestão essa que terminantemente rejeitou;

E a segunda – que ele seguiu sem vacilar – foi concluir a obra, vendendo ou hipotecando os seus modestos bens, para poder cumprir com a sua palavra.

E não houve forças humanas que o demovessem, que o fizessem mudar de ideias.

E assim terminou a obra.

Sabe Deus com que desgosto, com que sacrifício esse homem, já velho e cansado, nessa altura, se despojou de um pequeno património (que levara a vida inteira a construir) para poder cumprir com a sua palavra.

Eram desta têmpera, os homens daquele tempo!

Faleceu decorridos poucos anos.

E a velha Corporação, comovidamente, acompanhou-o ao cemitério.

Foi um verdadeiro Homem, um carácter.

E foi, sobretudo uma grande lição!

Notas:

1-Este texto faz parte das memórias de António Guedes, antigo chefe dos bombeiros voluntários do Peso da Régua, que foram publicadas no jornal O Arrais, na década dos anos 70 e 80.  

2- É mais um importante contributo para se conhecer melhor a nossa História do Quartel dos Bombeiros da Régua. Vale a pena atentar no exemplo do mestre pedreiro Anastácio Inácio Teixeira. Para ler e meditar com muita atenção…

- Matéria e imagem enviadas por nosso Amigo e colaborador Dr. José Alfredo Almeida para "Escritos do Douro" em Maio de 2011.
:: ::
Recordando...
Jornal "O Arrais", Quinta feira, 28 de Abril de 2011
(Dê duplo click com o "rato/mouse" para ampliar e ler)
Recordando...

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Raízes - Para matar saudades...

(Clique na imagem para ampliar)
Imagem de autoria do Dr. Altino M. Cardoso, cedida para "Escritos do Douro 2011"