Os bombeiros da Régua não podiam ter escolhido melhor cenário para, no dia 17 de Agosto de 1969, realizarem um exercício de destreza, bravura, disciplina e até de admirável beleza: perfilados nas escadas de ganchos, montadas na fachada de um prédio de habitação, de três andares, apresentavam uma continência a um público que, na Avenida Sebastião Ramires, como então era conhecida, assistia deslumbrado ao espectáculo de magia acrobática e de perfeita sincronia de todos os movimentos.
O prédio escolhido fica na proximidade Quartel dos Bombeiros. Apenas, os separa o Cine-Teatro Avenida, hoje em estado de ruínas. Desconhecem-se as razões para a preferência, mas não terá sido uma opção ao acaso. Coincidência ou não, esse prédio tinha a particularidade de nele encontrarem já sediados, os estúdios da “Rádio - Alto Douro” (1954), uma emissora regional, popular na região duriense, que entusiasmou um auditório fiel e vasto, durante décadas, até o poder político a nacionalizar e a encerrar.
Aquele vistoso exercício fazia parte do programa das comemorações do Dia do Bombeiro – e era também uma homenagem dedicada ao maior bombeiro português, Guilherme Gomes Fernandes - que os bombeiros organizavam, pela primeira vez, na então vila da Régua.
A grandeza do evento exigia meios e recursos financeiros que faltavam aos bombeiros. Mas, não foi difícil conjugaram-se mais vontades e esforços para dar maior brilho às comemorações do “Dia do Bombeiro”. A Comissão de Festas de Nossa Senhora do Socorro, responsável pela organização das festas religiosas, associou-se aos bombeiros. Interessada que o evento alcançasse sucesso e promovesse a missão dos bombeiros, os seus elementos resolvem conceder um importante patrocínio, isto é, dava dinheiro para financiar os principais custos.
A iniciativa de se festejar um “Dia do Bombeiro” era inédita para a Régua. Os pormenores das comemorações do “Dia do Bombeiro” ficaram registados na primeira página do jornal “Vida por Vida”. Aparecem destacadas as actividades realizadas, a presença dos corpos de bombeiros do distrito de Vila Real, alguns de Viseu, Guarda, Bragança, Braga e Porto. A ilustrar o texto estão duas fotografias, uma das quais é a registou este histórico simulacro ataque ao fogo e de salvamento. Um outro aspecto do evento, era a concentração dos bombeiros, no Largo da Estação, seguido do desfile apeado e motorizado das corporações pelas principais ruas da vila da Régua, com cerca de 350 homens e mais de 30 viaturas, que também mereceu relevo. As individualidades reuniam-se num palanque montado em frente da “Casa do Douro”, à Rua dos Camilos, entre as quais se destacava Inspector de Incêndios da Zona Norte, Coronel Alexandre de Magalhães, acompanhado do Presidente da Câmara Municipal do Peso da Régua, Dr. Rui Machado, que receberam as honras das corporações em desfile. A população reguense interessou-se e não deixou de aplaudir e entusiasmar-se na passagem dos corpos de bombeiros, saudando-os com alegria e muita emoção.
O “Dia do Bombeiro”, festejado na Régua, não acabou sem a tradicional merenda volante servida a todos os participantes, no Salão Nobre do Quartel. Como também não faltaram os habituais discursos quer dos dirigentes das organizações dos bombeiros quer do presidente da câmara municipal, por inerência deste cargo, como permitiam os estatutos, também no exercício de Presidente da Assembleia-Geral da Associação.
No seu improvisado discurso, o edil reguense, bom conhecedor da realidade bombeiros locais, começou por elogiar a importância do evento e a acção dos bombeiros da Régua, enaltecendo a sua obra que, na sua opinião, neste tempo, tinha uma dimensão visível e que “já se projecta para além dos seus muros”.
O Sr. Inspector de Incêndios da Zona Norte discorreu para louvar a “obra que a Associação vem realizando há alguns anos”, ao mesmo tempo que manifestava “o seu apreço aos Bombeiros da Régua, por verificar a par do seu bom nome bem cuidado material, homens capazes de fazerem dele o uso mais eficiente”. E, quanto ao exercício que tinha observado, não deixava de “estar certo de que os bombeiros de todas as corporações seriam modelo do exemplo que lhe fora dado no exercício que acabaram de observar, quanto ao companheirismo, espírito de sacrifício, entreajuda e disciplina”.
A intervenção do Eng. Albuquerque Barbosa, ilustre Comandante dos Bombeiros Voluntários Portuenses, também não ficou despercebida, que começou por expressar o seu regozijo “por estar presente nesta festa tão significativa” e, sobre a exibição técnica dos bombeiros da Régua, nada deixou de evidenciar o seu “agrado que lhe proporcionou o exercício efectuado”.
Esta magnifica imagem dos bombeiros Régua estão também muito ligada à percepção de uma das mais interessantes avenidas da cidade, actualmente conhecida por Avenida Antão de Carvalho. Há quem a aprecie pelo cheiro e a frescura das suas frondosas tílias e, muitos outros, por nela se encontrar situado o Quartel dos Bombeiros, o mais ousado e bonito edifício que nela se construiu. Edificado nos anos 30, o Quartel Delfim Ferreira, obra projectada pelo arquitecto portuense Oliveira Ferreira, só veio a ser inaugurada 25 anos depois do “mestre” Anastácio Inácio Teixeira, artesão reguense, erguer a primeira parede de pedras de xisto, numa parcela terreno doada por um executivo da câmara municipal, presidido pelo Dr. Mário Bernardes Pereira, que generosamente melhor amparou os bombeiros.
Nesse tempo, o Quartel dos Bombeiros da Régua fascinava quem por ali passava, nem que fosse só para contemplar os pronto-socorros e as ambulâncias arrumadas, os imponentes sempre à frente, com o realce para o “Nevoeiro”, o Ford e o velho Buick, a reluzirem no vermelho vivo e nos seus cromados de origem.
Se querem saber, é assim ainda hoje, para aqueles que não deixaram de passar na frente do Quartel dos Bombeiros. O fascínio e magia dos bombeiros da Régua não têm fim…!
- Colaboração de José Alfredo Almeida*, Peso da Régua, Agosto de 2010.