TOMADA DE POSSE
Exmºs. Senhores:
Na pessoa do senhor Presidente, quero começar por
saudar todos os soldados da paz, que servem os interesses da nossa terra nesta
prestimosa corporação, não esquecendo todos quantos, embora não sejam
bombeiros, de uma forma ou de outra, contribuem para a sua grandeza,
funcionalidade e prestígio.
Quando fui contactado para dar também a minha
colaboração como médico dos bombeiros, perpassou-me pela mente todo um rosário
de afazeres e compromissos ligados ao exercício da minha profissão, à minha
vida familiar e à minha participação social. A conclusão foi de que pouco espaço
ficaria vago para qualquer outra coisa que fosse. E, então, desenhou-se-me nos
lábios um redondo, rotundo e definitivo NÃO!
O grande problema é que nós somos animais de memória.
E o que parecia uma resposta fácil e imediata transformou-se num combate
interior: de um lado, uma vida sem espaços vazios, do outro uma apelativa
lembrança do meu tempo de menino e moço.
É que, como se estivesse a assistir à passagem de um
filme, vi-me de calções e feridas no joelho, por detrás da vidraça da janela de
casa dos meus pais, no Largo do Cruzeiro, perfeitamente rendido aos tambores
que rufavam, às luvas brancas que traçavam arabescos no ar, aos capacetes que
luziam, aos machados reluzentes, aos botões da farda com reflexos de ouro.
Como tantos meninos, do meu tempo ou do tempo do meu
filho, sonhava entre prometendo e jurando: "QUANDO FOR GRANDE QUERO SER
BOMBEIRO! ".
Então, e agora que tinha a oportunidade de realizar o
sonho deixava que os lábios fossem mais fortes que o coração?... Então, e agora
iria perder a oportunidade de ser Bombeiro, médico dos bombeiros, mas assim
mesmo completa e inteiramente BOMBEIRO?…
Como que por magia, o redondo e rotundo NÃO dos Iábios
transformou-se, num ápice, no mais redondo e mais rotundo SIM que o meu coração
foi capaz de criar.
E aqui estou! De sorriso confiante e de peito
escancarado para o que der e vier. E aqui estou não para fazer um favor a
ninguém, antes para dar a oportunidade a mim mesmo de me realizar de uma forma
mais completa, deixando-me envolver do espírito de serviço, de dedicação e
amor, tal como qualquer outro bombeiro desta corporação.
Se eu quiser ir um pouco mais longe, rebuscando razões
para além daquela memória apelativa de criança, para estar aqui, neste momento,
descubro, sem dificuldade, muitas outras:
ALEGRIA! É tão bom respirar este ar de entusiasmo,
sentir o coração a pulsar; é tão bom descobrirmo-nos regozijados porque temos
no nosso horizonte os outros e não apenas o nosso umbigo, por mais bonito que
ele seja. E eu sei que vou encontrar, no contacto próximo convosco, essa
alegria, esse entusiasmo.
HONRA! Quem será capaz de duvidar de que todas as
pessoas que, neste salão, estão presentes se sentem honradas por saberem
pertencer a uma instituição tão grandiosa na sua história de tantos anos e
tantos feitos?
O mesmo sentimento pulsa dentro de mim: tenho a
certeza de ir pertencer, de corpo inteiro, a uma corporação prestigiada e
prestigiante, engrandecida por tanta e tanta gente que, hoje, nela vive e luta,
ou que nela deixou o rasto do seu amor e da sua entrega. Possa eu ser merecedor
dessa honra e desse prestígio...
Sou médico. É nessa qualidade que me foi endereçado o convite
para fazer parte da família numerosa e unida dos bombeiros. Vou ser (e permitam-me
que o diga devagarinho, gozando o som melodioso das palavras) O PRIMEIRO MÉDICO
DOS BOMBEIROS DO PESO DA RÉGUA! Se conseguirem imaginar, por pouco que seja, o
orgulho que sinto pela vossa escolha, têm aí a razão deste meu sorriso.
Não esqueço, no entanto, a responsabilidade acrescida
que sobre mim impende. A única garantia que posso deixar, sem hesitações, é a promessa
do meu empenhamento, é a certeza do meu esforço, é a força do meu sentir. À
nossa causa darei o que de melhor descobrir dentro de mim; comigo podem contar
para os momentos bons, sabendo que, nos momentos menos bons, também gritarei
presente.
Não quero maçar-vos com mais palavras. Vossas Ex.ªs.
farão o favor de suprir alguma lacuna que tenha ficado de um discurso que eu pretendi,
desde o início, simples e sincero.
Ao olhar, daqui, para essas luvas imaculadamente
brancas, para esses capacetes que reluzem, para esses machados, que prometem
guerras de paz e para esses botões de ouro em farda de gala, não posso deixar
de continuar a sonhar: mesmo que agora vista fato e gravata e não calções a mostrar
os joelhos esfolados, como que prometendo jurando, digo de maneira sentida:
QUANDO FOR GRANDE QUERO SER BOMBEIRO! OBRIGADO!
- José Alberto Soares Marques
Nota: Discurso proferido em 3 de Dezembro de 1995, no Salão Nobre do Quartel Delfim Ferreira, quando tomou posse como Adjunto de Comando Equiparado/Médico, sendo ao tempo, Presidente da Direção, Eduardo Sebastião Mendes e o Comandante Professor Fernando de Almeida. Actualmente é o Presidente da Assembleia Geral da AHBV do Peso da Régua.
Clique nas imagens para ampliar. Imagens e texto cedidos pelo Dr. José Alfredo Almeida. Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Setembro de 2012. Também publicado no semanário regional "O ARRAIS" edição de 3 de Outubro de 2012. Este artigo pertence ao blogue Escritos do Douro. Permitida a reprodução e/ou distribuição dos artigos/imagens deste blogue somente com a citação da origem/autores/créditos.
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