*Jorge Almeida
Há fogo, há fogo, gritava a garotada da minha rua. A
sirene era inconfundível, a frequência de sons agudos e graves não enganava. Em
correria deixávamos o jogo da bola ou da carica para acorrer ao quartel.
Já lá estavam os mais afoitos e os mais próximos. É no
Corgo, é no Corgo, dizia uma voz esganiçada. E os bombeiros não faltavam à
chamada. Conforme estavam, em casa, no trabalho ou no lazer, assim vinham
aqueles nossos heróis. De automóvel, de bicicleta, de motorizada, a pé. O
Manuel, o Silva, o Figueiredo, o João e tantos, tantos outros. E o Chefe
Claudino, e mais tarde o Comandante Cardoso… que organização, que autoridade.
Era um gosto ver sair o carro de nevoeiro a toda a
velocidade a caminho do salvamento de pessoas e bens. Havia algo de forte, de
solidário, de altruísta, de comunitário que a pequenada absorvia.
Os Bombeiros Voluntários do Peso da Régua
representaram sempre, ao mais alto nível, os mais nobres valores da ajuda ao
próximo, interpretando individual e colectivamente o lema de “dar de si antes
de pensar em si“.
Mas tem sido também uma associação virada para a
formação humana em todas as suas vertentes, e para a cultura.
Quando muito jovem, fui um dos utilizadores assíduos
da biblioteca. As obras de aventuras Enyd Blyton ou de Emílio Salgari, mas
também os clássicos da literatura portuguesa como os de Eça de Queirós e Camilo
de Castelo Branco, abriram muitos caminhos para o conhecimento aos jovens da
minha geração, numa altura em que a informação disponível rareava, as
bibliotecas públicas no interior eram uma miragem, e em que o poder político
tinha outras preocupações, bem longe da cultura do povo.
Recordo com muita saudade o testemunho que me foi
transmitido por meu tio José Arnaldo Monteiro, o seu referencial à literatura e
à cultura em geral, e o carinho que sempre manifestou pela associação. José
Arnaldo Monteiro foi um grande resistente à ditadura. Foi dos primeiros
reguenses a envolver-se no movimento democrático e a perfilar-se na defesa de
causas sociais. Em sua memória, e concretizando um desejo de família, será em
breve entregue aos nossos bombeiros o fundamental da sua biblioteca particular.
Saúdo por isso a orientação da direcção presidida pelo
dr. José Alfredo que tem feito da vertente cultural uma das suas grandes
preocupações.
A Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do
Peso da Régua, para além de ser a menina dos olhos da comunidade reguense,
atingiu grande prestígio a nível regional e nacional. Honra a memória de todos
que a serviram, desenvolve uma profícua atividade no presente, e prepara-se
para um grandioso futuro. Instalações, equipamentos e pessoas, sobretudo
pessoas, a têm feito crescer, modernizar e consolidar. Mas será sempre com a
memória e a cultura que este ideário reguense se perpetuará.
Vivam os Bombeiros.
*Jorge Almeida - Médico. Foi Vereador, Presidente da Assembleia Municipal da Câmara
Municipal do Peso da Régua e Deputado na Assembleia da República. Actualmente
exerce as funções de Vogal do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Trás-os- Montes e
Alto Douro.
Clique nas imagens para ampliar. Este texto está também publicado na edição do semanário regional "O Arrais" de 12 de Abril de 2012. Texto e sugestão de J. A. Almeida e edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Abril de 2012. Este artigo pertence ao blogue Escritos do Douro. Todos os direitos reservados. É proibido copiar, reproduzir e/ou distribuir os artigos/imagens deste blogue sem a citação da origem/autores/créditos.
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