Foi uma cerimónia emotiva, o momento da passagem de testemunho de Carlos Cardoso dos Santos a Fernando de Almeida (1990-1996), que em 12 de Agosto de 1990, tomava posse como comandante dos Bombeiros Voluntários da Régua.
Além dos convidados oficiais, onde se destacava o Eng. Álvaro Mota, presidente da Câmara Municipal e o Senhor Padre Luís Marçal Gouveia, esteve presente o velho comandante para, com muita devoção e carinho, para apadrinhar o seu sucessor e colocar-lhe as divisas na sua farda azul. Com este solene e distinto acto, o velho comandante fechava um ciclo nos bombeiros do Peso da Régua. As três décadas do comando de Carlos de Cardoso dos Santos foram de grande estabilidade no Corpo de Bombeiros. As várias direcções que o acompanharam, ao longo de 31 anos, deram o melhor para o engrandecimento da associação, deixando um trabalho positivo no melhoramento do quartel e na modernização do parque de viaturas de incêndios e de saúde.
Ao assumir novas funções de comandante, Fernando de Almeida que, até essa data, era o presidente da direcção (1988-1990), teve de abdicar desse seu cargo social. A sua desistência provocou a demissão de todos elementos dos órgãos sociais. E, perante, a situação foram convocadas, nos termos estatutários, as eleições.
Imediatamente duas listas de associados apresentaram as candidaturas: a liderada por José Manuel Moura e outros elementos da direcção anterior e uma alternativa, chefiada pelo professor Renato Aguiar, ex-presidente socialista da Autarquia e, por inerência presidente da assembleia-geral, que tinha sido derrotado para a presidência da Câmara Municipal, pelo social-democrata Álvaro Mota
Os sócios da Associação, em assembleia-geral, realizada no dia 12 de Outubro de 1990, escolheram, por escassos cinco votos, a lista de José Manuel Moura (1990-92). Os bombeiros, parece que apoiantes da lista contrária, reagiram mal e com algum desagrado à escolha. Agindo mais com a emoção do que com a razão, a totalidade do Corpo Activo decidiu auto-suspender as suas funções….Assim mesmo! Queriam dar um exemplo de força, mas apenas conseguiram mostrar falta de razão na atitude, ausência de valores éticos e um total sentido de irresponsabilidade.
Esse momento de crise e mal-estar prejudicou, uma vez mais, a imagem dos bombeiros, manchou a história da Associação e envergonhou a memória dos seus fundadores. Esquecendo as regras do civismo e do humanismo, os homens sem valores procuram mais valorizar as suas aspirações pessoais em vez de respeitarem sentimento colectivo e a valia histórica da instituição.
O caso foi comentado nos jornais locais e nacionais como uma crise nos bombeiros. A gravidade dos factos não dignificou em nada o prestígio da centenária associação e dos bombeiros com e sem farda que, ao longo de sucessivas gerações, a respeitaram e a tornaram cada vez mais eficiente e maior.
Com a legitimidade de ter sido um ilustre director, o Dr. Camilo de Araújo Correia, numa deliciosa crónica intitulada “Uma Chamada na eternidade”, publicada “O Arrais”, de 17 de Outubro de 1990, sentiu a necessidade de comentar o caso, no seu estilo de humor critico, bonomia e fina ironia, com uma lição de moral aos bombeiros faltosos:
“Pelo que os jornais disseram abertamente e os amigos falaram à boca pequena, a última eleição dos elementos directivos dos bombeiros voluntários do Peso da Régua teve aspectos de braço de ferro e ranger de dentes.
Não cabe no meu comentário referir as serpentinas e garrafinhas de cheiro que das duas falanges atiraram uma à outra, traduzindo pútridos fermentos de incuráveis frustrações.
Eu sei que eleições são eleições e falanges são falanges. O que eu não sabia era que o recurso ao “vale tudo” pudesse um dia acontecer nos garbosos e briosos bombeiros da minha terra.
Mas aconteceu.
Os rapazes do Corpo Activo, toldados pelo miasma político latente, pousaram a machadinha, só porque não ganhou a lista da sua simpatia!!! E não se julgue que foi gesto indigesto de momento. Noventa por cento dos bombeiros já se negou a prestar serviço.
Esta atitude insuspeitada em mais de cem anos de História impoluta, não surpreendeu, tanto assim, o homem que hoje sou, um pouco capaz de acreditar em tudo.
Quem se surpreendeu até à comoção foi aquele menino que anda dentro de nós e um dia recordei.
(…)
Naquele tempo os meninos vestiam a farda para serem homens. Os homens de hoje despem-na para serem nada.
Quero fazer uma chamada na eternidade, nesta hora de passar a revista cá terra a uma formatura de nadas:
- Manuel Maria de Magalhães…
- Presente!
- José Afonso de Oliveira Soares…
- Presente!
- Joaquim de Sousa Pinto…
- Presente!
- Camilo Guedes Castelo Branco…
- Presente!
Sempre fiéis à sua Corporação, à sua terra, a si próprios! Mesmo no infinito”.
Agora, no infinito, o Dr. Camilo ao lado desses garbosos e cultos comandantes - o poeta, o pintor e o jornalista - numa amena e humorada cavaqueira de amigos, estará, por certo, a sorrir para alguns dos seus conhecidos velhos bombeiros, que só sabiam correr para apagar os fogos com o coração cheio de humanidade. Eles, certamente, no vagar do tempo estarão a desvendar pedaços de novas e divertidas histórias, com a mesma ternura e ironia, que nos comovem de pertencer a esta nossa grande família. E, que deixa de herança aos vindouros, um incalculável património imaterial, o maior legado das memórias colectivas dos bombeiros voluntários da Régua.
Estes extraordinários homens fazem não só parte do nosso passado, mas muito mais, do presente e do futuro. Sabemos que eles são fiéis à sua corporação e à sua terra em qualquer lado…mesmo na Eternidade. Se queremos ser os melhores bombeiros cá na nossa terra, se queremos honrar os seus testemunhos de vida, precisamos de escutar as suas palavras, os seus conselhos…os seus ralhos, para percebemos bem o valor e a grandiosidade da instituição.
E, quem não for capaz de os entender não será capaz de entender mais ninguém…!
Além dos convidados oficiais, onde se destacava o Eng. Álvaro Mota, presidente da Câmara Municipal e o Senhor Padre Luís Marçal Gouveia, esteve presente o velho comandante para, com muita devoção e carinho, para apadrinhar o seu sucessor e colocar-lhe as divisas na sua farda azul. Com este solene e distinto acto, o velho comandante fechava um ciclo nos bombeiros do Peso da Régua. As três décadas do comando de Carlos de Cardoso dos Santos foram de grande estabilidade no Corpo de Bombeiros. As várias direcções que o acompanharam, ao longo de 31 anos, deram o melhor para o engrandecimento da associação, deixando um trabalho positivo no melhoramento do quartel e na modernização do parque de viaturas de incêndios e de saúde.
Ao assumir novas funções de comandante, Fernando de Almeida que, até essa data, era o presidente da direcção (1988-1990), teve de abdicar desse seu cargo social. A sua desistência provocou a demissão de todos elementos dos órgãos sociais. E, perante, a situação foram convocadas, nos termos estatutários, as eleições.
Imediatamente duas listas de associados apresentaram as candidaturas: a liderada por José Manuel Moura e outros elementos da direcção anterior e uma alternativa, chefiada pelo professor Renato Aguiar, ex-presidente socialista da Autarquia e, por inerência presidente da assembleia-geral, que tinha sido derrotado para a presidência da Câmara Municipal, pelo social-democrata Álvaro Mota
Os sócios da Associação, em assembleia-geral, realizada no dia 12 de Outubro de 1990, escolheram, por escassos cinco votos, a lista de José Manuel Moura (1990-92). Os bombeiros, parece que apoiantes da lista contrária, reagiram mal e com algum desagrado à escolha. Agindo mais com a emoção do que com a razão, a totalidade do Corpo Activo decidiu auto-suspender as suas funções….Assim mesmo! Queriam dar um exemplo de força, mas apenas conseguiram mostrar falta de razão na atitude, ausência de valores éticos e um total sentido de irresponsabilidade.
Esse momento de crise e mal-estar prejudicou, uma vez mais, a imagem dos bombeiros, manchou a história da Associação e envergonhou a memória dos seus fundadores. Esquecendo as regras do civismo e do humanismo, os homens sem valores procuram mais valorizar as suas aspirações pessoais em vez de respeitarem sentimento colectivo e a valia histórica da instituição.
O caso foi comentado nos jornais locais e nacionais como uma crise nos bombeiros. A gravidade dos factos não dignificou em nada o prestígio da centenária associação e dos bombeiros com e sem farda que, ao longo de sucessivas gerações, a respeitaram e a tornaram cada vez mais eficiente e maior.
Com a legitimidade de ter sido um ilustre director, o Dr. Camilo de Araújo Correia, numa deliciosa crónica intitulada “Uma Chamada na eternidade”, publicada “O Arrais”, de 17 de Outubro de 1990, sentiu a necessidade de comentar o caso, no seu estilo de humor critico, bonomia e fina ironia, com uma lição de moral aos bombeiros faltosos:
“Pelo que os jornais disseram abertamente e os amigos falaram à boca pequena, a última eleição dos elementos directivos dos bombeiros voluntários do Peso da Régua teve aspectos de braço de ferro e ranger de dentes.
Não cabe no meu comentário referir as serpentinas e garrafinhas de cheiro que das duas falanges atiraram uma à outra, traduzindo pútridos fermentos de incuráveis frustrações.
Eu sei que eleições são eleições e falanges são falanges. O que eu não sabia era que o recurso ao “vale tudo” pudesse um dia acontecer nos garbosos e briosos bombeiros da minha terra.
Mas aconteceu.
Os rapazes do Corpo Activo, toldados pelo miasma político latente, pousaram a machadinha, só porque não ganhou a lista da sua simpatia!!! E não se julgue que foi gesto indigesto de momento. Noventa por cento dos bombeiros já se negou a prestar serviço.
Esta atitude insuspeitada em mais de cem anos de História impoluta, não surpreendeu, tanto assim, o homem que hoje sou, um pouco capaz de acreditar em tudo.
Quem se surpreendeu até à comoção foi aquele menino que anda dentro de nós e um dia recordei.
(…)
Naquele tempo os meninos vestiam a farda para serem homens. Os homens de hoje despem-na para serem nada.
Quero fazer uma chamada na eternidade, nesta hora de passar a revista cá terra a uma formatura de nadas:
- Manuel Maria de Magalhães…
- Presente!
- José Afonso de Oliveira Soares…
- Presente!
- Joaquim de Sousa Pinto…
- Presente!
- Camilo Guedes Castelo Branco…
- Presente!
Sempre fiéis à sua Corporação, à sua terra, a si próprios! Mesmo no infinito”.
Agora, no infinito, o Dr. Camilo ao lado desses garbosos e cultos comandantes - o poeta, o pintor e o jornalista - numa amena e humorada cavaqueira de amigos, estará, por certo, a sorrir para alguns dos seus conhecidos velhos bombeiros, que só sabiam correr para apagar os fogos com o coração cheio de humanidade. Eles, certamente, no vagar do tempo estarão a desvendar pedaços de novas e divertidas histórias, com a mesma ternura e ironia, que nos comovem de pertencer a esta nossa grande família. E, que deixa de herança aos vindouros, um incalculável património imaterial, o maior legado das memórias colectivas dos bombeiros voluntários da Régua.
Estes extraordinários homens fazem não só parte do nosso passado, mas muito mais, do presente e do futuro. Sabemos que eles são fiéis à sua corporação e à sua terra em qualquer lado…mesmo na Eternidade. Se queremos ser os melhores bombeiros cá na nossa terra, se queremos honrar os seus testemunhos de vida, precisamos de escutar as suas palavras, os seus conselhos…os seus ralhos, para percebemos bem o valor e a grandiosidade da instituição.
E, quem não for capaz de os entender não será capaz de entender mais ninguém…!
- Peso da Régua, Setembro de 2009, José Alfredo Almeida.
2 comentários:
Muito bem!! Sim senhor
Gostei de ver e de ler
Continuem assim.
Abraços.
Carlos Alves Peso de Régua
Quero felicitar o seu trabalho e dedicação em prol da comunidade à qual tem dado grande contributo, pesquisando factos ocorridos no passado que devem ser perpetuados na região do Douro para enriquecimento da cultura de quem nasceu nos nossos dias.
Parabéns pelo árduo trabalho. Deve continuar!
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