Para quem gosta de viajar no tempo, deixo
o extracto de um texto de 1909, de Domingos Ramos, publicado na “Ilustração
Transmontana”, que nos descreve uma maravilhosa viagem na Linha do Corgo:
“…Quem desembarca na Regoa e entra no comboio para as Pedras Salgadas, ao
começar a subir as alterosas ravinas que o Corgo sulcou experimenta uma
sensação de bem-estar, de admiração e alegria que lhe suggestiona qualquer
coisa nova e inesperada. O comboio, n'um balouçar que tem o seu quê de berço,
embala a gente sem o sentir e lá vae perfurando panoramas cada vez mais
diversos e mais bellos. Aqui apparece-nos a graça gentil d'uma horta viridente,
acolá a severidade de lombas elevadas, pináculos agudíssimos; aquilo que
a phylloxera não devastou e queimou como raio e a coragem e o aprumo do
proprietário ressuscitou, apresenta-se-nos em amphitheatros, que outr'ora
tanta riqueza demonstrava; a imponência dos castanheiros, o avelludado dos
pinheiros, o rendilhado dos sabugueiros e o assetinado do amaldiçoado tabaco
vêem substituir na rapidez do caminhar aquela magica cultura, para nos surgir
ao collear um meandro do rio.
Os casaes alvejam ao sol, e os
campanários das freguezias, uns no alto dos outeiros e outros no fundo dos
valles, parecem ao longe bandos de pombas espavoridas pelo silvo da machina.
Chega-se
a Carrazedo e alli a visualidade é de mágica thetral: não nos parece real o que
vêmos, mas sim um sonho! Parado na gare, o comboio espera pelo descendente;
ei-lo que foge por sobre a nossa cabeça e precipita-se, desgrenhando a pluma de
fumo sobre aquelle que o espera; de repente esconde-se, reapparece, descendo
sempre até que se approximam.
Ninguém, por mais força imaginativa de
que disponha, é capaz de affirmar que não excedeu toda a sua expectativa o
maravilhoso sonho que vê realizado.
É impossível descrever-se.
Gaba-se o céu de Itália, especialmente o
de Capri, porque imprime à paisagem um tom de lilaz em todo o ambiente; pois ao
vislumbrar a casaria, amparada pela magestade do Marão, se o Sol bate em
cheio no kaleidoscópio da vila, parece-nos tudo banhado em cor de rosa a
evaporar-se deante de nós.
É ampla a entrada para a villa pela
Avenida do Caminho de Ferro.
Lá em baixo o Corgo ferve por entre as
penedias e lá vae até ao Douro… …”.
- Domingos Ramos, “Ilustração Transmontana”, 1909
Clique nas imagem para ampliar. Sugestão de texto e imagens de JASA (José Alfredo Almeida) para este blogue. Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Junho de 2012. Só permitida a cópia, reprodução e/ou distribuição dos artigos/imagens deste blogue com a citação da origem/autores/créditos.
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