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terça-feira, 21 de agosto de 2012

As Festas do Socorro


João de Araújo Correia
Não devem ser muito antigas as festas do Socorro. Devem datar do princípio do nosso século ou dos últimos anos do século passado. É crível que se tenham desenvolvido com o crescimento da Régua, vila moderna que tentou imitar Vila Real e Lamego, realizando festas semelhantes às de Santo António e às de Nossa Senhora dos Remédios. É natural que a Régua, situada entre dois burgos lendários, dissesse entre si: também eu nasci ontem, quero festas iguais às de Lamego e às de Vila Real. Iguais ou superiores…
À parte a emulação, terá contribuído para engrandecer as festas reguenses a actual imagem da Virgem Nossa Senhora do Socorro. Dizem que a imagem antiga era tão pequenina, tão humilde, que mal se enxergaria se saísse à rua, como rainha da procissão, no dia 15 de Agosto. Foi preciso que Francisco Pereira da Costa, antigo caiador, regressasse do Brasil com dinheiro suficiente para oferecer à igreja da sua terra uma Nossa Senhora do Socorro nova. Ofereceu-lha como se lhe oferecesse o retrato de sua esposa. O rosto da Senhora é reprodução do rosto da Rosinha – mulher do caiador. O artífice repatriado quis perpetuar e divinizar, na obra encomendada e recomendada, as adoradas feições da sua companheira. De exemplo de amor conjugal confundido, em adoração, como amor à Virgem.

Nossa Senhora do Socorro não é padroeira da única freguesia que constitui a Régua ou, melhor dizendo, o Peso da Régua – nome oficial. Padroeiro da Régua é S. Faustino. Mas, ninguém quer saber de semelhante santo, ninguém lhe reza uma oração, ninguém lhe acende uma vela. Tem imagem na igreja, mas, essa imagem, só por grande milagre figura na procissão. É uma bela imagem, mas, esquecida à míngua de devotos e devotas.
S. Faustino foi mártir. Não contentes com isso, os seus paroquianos prolongaram-lhe o martírio, condenando-o, depois de morto, à moderna pena do silêncio. Tanto, que só uma vez puseram nome de Faustino a um neófito. Abundam as Marias do Socorro, porque a Virgem do Socorro é, de facto, a padroeira da Régua. Quando sai à rua, bem vestida e bem ourada, provoca êxtases religiosos. 
(…)
- Peso da Régua, 5/9/66 - In livro “Horas Mortas”, da Imprensa do Douro.
Clique  nas imagens para ampliar. Imagens e texto cedidos pelo Dr. José Alfredo Almeida e editadas para este blogue. Edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Agosto de 2012. Este artigo pertence ao blogue Escritos do DouroSó é permitida a reprodução e/ou distribuição dos artigos/imagens deste blogue com a citação da origem/autores/créditos. 

sábado, 6 de novembro de 2010

O Bombeiro e a Religião

Padre Luís Gouveia Marçal Monteiro

Ao ser-me dada a honra de colaborar neste opúsculo comemorativo do I Centenário dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua sugeriram-me o tema: o Bombeiro e a Religião. Nunca vi tão fácil o meu trabalho.

È próprio do homem como ser inteligente e livre querer saber o porquê da sua vida, dos seres que o rodeiam, das coisas de que se serve. Mais cedo ou mais tarde começa portanto a ser “filósofo” na pesquisa dum sentido final e dum significado concreto para a sua existência.

Não obstante todos os seus esforços, não encontrará, em si resposta suficiente para as suas interrogações. Tem de sair de si, de deixar de ser “ilha”, e procurar nos outros, no mundo e nas pessoas, a realização dos seus anseios: o homem começa a ser “social”.

Contudo ainda assim subsistem enigmas insolúveis, aspirações insatisfeitas, horizontes inacessíveis, sedes vivas de infinito porque ele, o mundo e os outros são limitados, têm fim. Então o homem, ou se recusa a sair do seu mundo por preguiça, por medo, por egoísmo, e deixa de ser “inteligente”, ou tem de abrir-se ao transcendente, ao Outro, a Deus: e o homem começa a ser “teólogo”.

A “filosofia" dos seres conduz finalmente o homem à “teologia” da vida.

Naturalmente “filósofo”, naturalmente “social”, o homem é também naturalmente “religioso”.

O Bombeiro, porque é homem, é religioso tam¬bém. Mais. Nada tão, favorável e propício à prática da religião, refiro-me agora à religião cristã, como a actividade humanitária do Bombeiro.

São três as palavras que identificam o bom¬beiro com o cristão, que exprimem a afinidade de objectos, a comunhão de ideais: VIDA POR VIDA.

“Vida por Vida" - é a divisa do bombeiro, é o seu dever a cumprir.

"Vida por Vida" - é o sinal do cristão, o seu divino mandamento.

“O meu mandamento é este: que vos ameis uns aos outros como vos amei”, diz Jesus Cristo. “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos seus amigos” acrescenta.
O cristão não tem outro dever senão AMAR. O cristão e o não-cristão. Não há outra forma de viver em plenitude que não seja AMANDO. “Viver é Amar”. O amor é a única forma válida, aceitável, HUMANA, de estabelecer laços interpessoais. É a única “lei natural" para garantir e alimentar a vida social do homem. O amor supõe a coexistência ou então realiza-a porque só o amor consegue a permuta “dar e receber” que constitui o segredo e o caminho da felicidade verdadeira, suprema aspiração humana.

O cristão, dado o seu compromisso de fé, não pode contentar-se com a simples dimensão humana do amor e muito menos com a dimensão erótica, carnal desse sentimento que, assim aviltado, em vez de nobilitar o homem o inferioriza.

O cristão tem do amor o conceito original que Cristo lhe trouxe, que pôs em prática e mandou que se praticasse.

“... Como Eu vos amei”, diz Jesus Cristo. Jesus propõe-se como modelo de amor.

O cristão terá de “amar como Jesus amou”.

Jesus amou sem fronteiras de qualquer espécie, sem excepção de qualquer pessoa. Amou os bons e os maus, os amigos e os inimigos. A partir do exemplo de Jesus Cristo o Papa Paulo VI 'traduz assim a universalidade do amor cristão:

“... Amaremos o nosso próximo
e amaremos os que estão longe de nós.

Amaremos a nossa pátria
e amaremos a pátria dos outros.

Amaremos os que merecem ser amados
e os que não merecem.

Amaremos os nossos adversários
e nenhum homem pode ser nosso inimigo”.

Jesus amou sem medida, até ao fim: “não há maior prova de amor que dar a vida pelos seus amigos”. Jesus o afirmou e confirmou pelo seu gesto na Cruz.

“Dei-vos o exemplo para que, como Eu fiz façais vós também”, disse. Como se dissesse: assim como Eu dei a minha vida pela vida de cada homem assim vós deveis dar a vossa vida pela vida de qualquer irmão!

Jesus amou desinteressadamente, sem nada esperar em troca. E se algo recebeu em troca não foi amor, foi ingratidão.

Amor universal, total, gratuito - eis o amor de Cristo que deverá ser o amor do cristão.

Não é assim o amor do Bombeiro?

Ao toque da sirene o bombeiro não procura saber quem o chama: se amigo ou inimigo, pobre ou rico conhecido ou desconhecido. Vai porque é universal no seu gesto.

O bombeiro não condiciona o seu serviço, não põe limite algum na sua acção. Esvazia-se dos seus problemas para viver os problemas dos outros. Sai de casa e não sabe se regressa. Não sabe se será o último o beijo ou o olhar com que se despede dos seus. Vai pôr a vida ao serviço de outras vidas: é total na sua entrega.

O bombeiro nada exige e nada espera pelo seu trabalho: é voluntário na sua resposta.

Quando o bombeiro descobre no silvo da sirene a voz de Deus que o chama e no irmão que socorre a pessoa de Cristo a sofrer, o seu gesto que é senão AMOR?
Notas:
1- Este magnifico artigo do Senhor Padre Luís Gouveia Marçal Gouveia, actual Arcipreste da Régua, encontra-se publicado no Boletim do 100º Aniversário da AHBV do Peso da Régua, comemorado em 28 de Novembro de 1980.

2- As duas fotos mais antigas são da autoria do mestre Baía Reis, sendo que uma delas mostra a bênção do S. Marçal, na Igreja Matriz, realizada pelo antigo Pároco Miranda Guedes e a outra a colocação da sua imagem por um bombeiro, no seu nicho construído numa parede do Quartel Delfim Ferreira.

3- A foto mais moderna é da autoria de Sónia Coutinho e fixa um momento da Procissão de Nossa Senhora do Socorro de 2010, onde o andar com a imagem de S. Marçal é transportado por eles do actual quadro activo dos bombeiros da Régua.
- Colaboração de J. A. Almeida para "Escritos do Douro" em Novembro de 2010. Clique nas imagens acima para ampliar.

Jornal "O Arrais", Sexta-Feira, 07 de Janeiro de 2011
O Bombeiro e a Religião
(Dê duplo click com o "rato/mouse" para ampliar e ler)
O Bombeiro e a Religião