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quinta-feira, 22 de setembro de 2011

O Zé Pinto institucional - 2

Adérito Rodrigues

Nas linhas anteriormente expostas procurámos mostrar a dedicação de um Homem que se devotou aos outros (não se pretendeu dizer que sr. Zé Pinto fosse o maior de todos, tão somente que foi um Grande Homem), a exemplo de muitos mais, que se dedicaram e continuam a dedicar-se à causa voluntária, ajudando o seu semelhante no dia-a-dia, desde que sejam solicitados para o efeito.

Será de introduzir nesta crónica que a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua, a par com a Associação dos Amigos do Hospital D. Luiz I, é uma Associação referenciada neste Ano Internacional do Voluntariado, sito na cidade do Peso da Régua, que deverá despertar as consciências para a disponibilidade e a cooperação com o seu semelhante.

Essas pessoas que labutaram em proveito direto dos seus concidadãos, foram uns genuínos Voluntários - na verdadeira aceção da palavra - marcaram-nos com seus feitos, que conservamos na memória e que nos levam a suspirar por um passado que ocorreu e que, nos dias de hoje, nem sempre se cumprem da forma que julgamos a mais adequada.

Dostoievski, no seu livro “Os Irmãos Karamazov”, diz-nos que “…não existe nada mais elevado, mais forte, são e bom para a vida do futuro que alguma boa recordação...”. É salutar não esquecermos as ligações que tivemos, não relegarmos para um plano inferior as boas lembranças que se fixaram na nossa memória, as recordações dos bons afetos. Jamais a ausência de alguém nos pode forçar a um arrasador abandono, a um esquecimento interior, a uma rejeição das emoções que nos humanizaram.

O quarteleiro Zé Pinto esteve sempre disponível para todo e qualquer ser - fosse o mais rico ou o mais necessitado -, sempre solidário e sempre generoso, mas a vida não lhe foi condescendente, ao inverter-lhe a época, pois o 25 de Abril não o bafejou, com o virar de mais uma página da nossa história, já que não lhe proporcionou os aumentos que os do ativo tiveram, vendo-se obrigado a viver com a reforma reduzida que lhe pagavam.

A vida desse nosso conterrâneo teve aspetos bem representativos e gratificantes, apesar de, por vezes, o estado de saturação o atingir, se considerarmos que as horas de trabalho não eram contabilizadas como são hoje, já que ele tinha que estar disponível, desde que alguém o chamasse.

Nas várias conversas que fomos mantendo na década de convívio que tivemos, o sr. Zé Pinto chegou a confidenciar-me que, muitas vezes, se sentia extremamente cansado com tanta correria, pois as viagens à Capital do Norte não eram nada do que são hoje, atendendo ao imenso tempo que se demorava na viagem e à constante rotatividade - ida e volta. Quem, como ele, percorreu os velhos caminhos que nos levavam à cidade do Porto, tem plena certeza de que essas viagens fatigavam qualquer pessoa, mesmo que fosse um “bom acelera”. Era um tempo longo que se perdia na estrada, com curvas e contra-curvas e o inconveniente de termos que atravessar lugarejos, aldeias ou cidades.

Sei, também, que o nosso Amigo Zé Pinto, para colmatar essa situação de cansaço, diversas vezes, levava o filho mais novo, o Quim, para o substituir na condução da ambulância, no regresso, a fim de poder descansar um pouco durante a viagem.

Tempos impensáveis e não aplicáveis nos dias de hoje, onde impera um horário de trabalho e as condições são muitíssimo mais benévolas do que as de outrora.

Nos quarenta anos de trabalho nos Bombeiros teve noites que ainda vinha a caminho e já estava o telefone a tocar, para que fosse outra vez ao Porto e quem atendia o telefone era a Dª Antónia, pela ausência do quarteleiro. Outras vezes estava ele a acabar de se deitar e tocava o telefone para ir levar um doente. Foi uma vida de muito sacrifício e em que a Dª Antónia também cooperou nessa azáfama.

A canseira que o casal foi tendo pelos tempos fora, não se ficou só por aqui, também tinham um orgulho enorme no Quartel dos Bombeiros e tudo faziam para que o aspeto fosse o mais deslumbrante e apresentável possível. Era comum as pessoas quererem visitar as instalações e as viaturas nas Festas do Socorro e o casal Melo tinha orgulho em mostrar o quartel, pelo que “limpavam os capacetes, ficava tudo a reluzir, todos limpinhos, e a minha sogra andava de joelhos a encerar a casa toda. As pessoas ficavam encantadas com a limpeza do quartel. O meu sogro tinha muita vaidade nisso”.

No dia 16 de Agosto, dia grande das Festas em honra da Nª Srª do Socorro, aquando do regresso da procissão e “a Nª. Srª. vinha para cima, da Capela do Asilo das Crianças para o Peso, só quando saía o último bombeiro é que ele ia comer, apesar dos apelos constantes da mulher para ir comer”.

Se o casal tinha vaidade em ter as instalações devidamente limpas e arrumadas, também o sr. Zé Pinto não deixava de ter um enorme orgulho na limpeza das viaturas, poderemos dizer até que, talvez, uma certa obsessão, pois, no dizer da nora, era de um cuidado extremo. Eis as palavras que o definem:

O meu sogro tinha aquela coisa com ele, não confiava a maca a ninguém. Ele é que a conduzia e não metia um carro dentro do quartel sem ser lavado. Sempre tudo lavado! Não descansava! Estava a gente, muitas vezes, à espera para comer e ele, sem lavar a ambulância, não descansava. Tinha uma paixão muito grande pela Associação, pelos Bombeiros, pelas viaturas e gostava de ter tudo arrumadinho, tudo no respetivo lugar.

A vida desgastante que o quarteleiro viveu, também lhe apresentou alguns casos engraçados e que ele próprio lembrava e comentava, achando-lhes alguma graça.

Naquele tempo, os bombeiros faziam o transporte dos doentes na ambulância, mas também dos mortos, quando os enfermos se finavam nos hospitais. Uma das situações que o sr. Zé Pinto vivenciou tem a ver com uma viagem a Valdigem, a fim de levar um doente falecido. A viúva (o homem já estava morto), uma senhora do povo, quase ao chegar à localidade, pediu-lhe:

“- Óh senhor, toque muito, toque muito, para saberem que vai aqui o meu marido”.

Pretendia a pobre viúva que o bombeiro tocasse a sirene da ambulância, mas qual a intenção concreta, ninguém o saberá, a não ser que queria que soubessem que o morto ia ali. Acho a situação um pouco macabra...

O Sr. Zé Pinto explicou aos seus familiares a situação que viveu e dizia que dentro da infelicidade a que foi chamado, levar um morto, dava-lhe agora o riso pela situação que viveu. A senhora queria que soubessem que ia ali o marido morto!

Ainda no cumprimento da sua missão, referirei um outro episódio em que o sr. Zé Pinto se viu envolvido no cumprimento do seu dever. Ao transportar uma senhora grávida para o hospital, a paciente apresentou sinais de ter que dar à luz num momento inesperado. Como a senhora manifestava todos os sinais de ter começado em trabalho de parto, não havia outra solução que não a de o parto ser na ambulância. O bebé acabou por nascer dentro da ambulância e foi o “nosso” quarteleiro quem assistiu a senhora, mais um bombeiro que ia com ele. Após a situação ter ficado resolvida, quiseram os pais da criança que o Bombeiro Zé Pinto fosse o padrinho da criança.

Aproveito para narrar um relato ocorrido no edifício dos Bombeiros. Havia um senhor, de nome Viana, um homem engraçado e divertido, que ia trabalhar/ajudar os Bombeiros. Ele não era bombeiro, mas ia auxiliar na limpeza dos capacetes e das botas, num lugarzinho lá atrás, onde arranjavam tudo.

Há, contudo, uma história com esse tal Viana, deveras surpreendente, que a Dª Glória Vieira (nora do sr. Zé Pinto) me contou.

- “Um dia deram um peru ao meu sogro e ele chamou o Viana. Deu-lhe uma garrafa com bagaço e pediu-lhe que embebedasse o peru com o bagaço, para depois se matar. Aquilo é que foi. Bebeu ele a aguardente e cortou a cabeça ao bicho com o machado dum bombeiro. Em vez de embebedar o peru, embebedou-se ele e o peru nunca mais morria”.

- Ah desgraçado, o que tu fizeste” – disse-lhe o quarteleiro.

Como se pode ver por estas pequenas narrativas a vida de bombeiro não era só sacrifício, também tinha algumas cenas engraçadas, que acabavam por amenizar a árdua tarefa que lhes era investida.

Será de referir, já que se fala em comida, que a Dª Antónia era uma mestra na cozinha e, segundo a opinião de alguns, esta senhora fazia uns petiscos muito afamados, assim se pronunciam alguns, que na altura eram frequentadores do bar dos Bombeiros.

Fecho esta série de crónicas, onde foi referido o quarteleiro Zé Pinto, mencionando a atribuição da medalha de mérito e sacrifício (foto 1 ), no ano de 1970, que a Direção de então lhe atribuíra, quando ele já tinha mais de trinta anos dedicados à causa do voluntariado da Associação Humanitária dos Bombeiros desta cidade. Os responsáveis de então entenderam conceder-lhe essa condecoração pelos feitos realizados, e quem lhe fez a imposição da medalha foi o também saudoso Joaquim Lopes, pai do Ângelo Maria, meu amigo e colega no Liceu de Lamego (foto 2).

Procurei relembrar a vida dum Homem, que, muito embora tivesse ficado no anonimato, mostrou-nos uma faceta de dignidade e competência. Que Deus o mantenha na Sua Paz.


O ZÉ PINTO institucional - 2
Jornal "O Arrais", quinta-Feira, 22 de Setembro de 2011
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Imagens e texto cedidos por Dr. José Alfredo Almeida em Setembro de 2011 para Escritos do Douro. Edição de J. L. Gabão. Clique nas imagens acima para ampliar.

O Zé Pinto institucional

Adérito Rodrigues

Neste terceiro apontamento sobre a vida do sr. Zé Pinto irei abordar aspetos que se prendem com a vida institucional deste Bombeiro,  o qual entrou para a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua por meados dos anos 30, do século passado, com vinte e poucos anos e, tal como já dissera anteriormente, aí se manteve quase quatro décadas, tendo saído por motivos de força maior, ou seja, por razões de saúde.

Com a elaboração desta crónica pretendia-se, também, pesquisar algo sobre o antigo quartel ou recolher algumas fotos do quarteleiro que a família pudesse ter, o que, infelizmente, não veio a concretizar-se, já que as familiares com quem falei não se lembram, nem têm conhecimento desse edifício, como também não possuem fotos do quartel velho ou do sr. Zé Pinto ainda nele.

Seria mais um documento valioso ou registo histórico para o património dos Bombeiros do Peso da Régua, mas, perante a resposta de uma familiar . . .

“- Não me lembro do quartel velho, desse quartel só sei o que o meu sogro e a minha sogra disseram, já não sou desse tempo”... nada se pode fazer.

Já numa publicação do Arquivo dos Bombeiros, que saiu no Jornal “Arrais”, em 12 de Fevereiro de 2009, se pode ver uma referência ao homem em causa, sendo documentado o artigo com uma foto - “onde ao centro se destaca um dos nossos grandes quarteleiros, o conhecido e saudoso Zé Pinto...” -, aquando da cheia de 1962, a qual incomodou as gentes da então Vila da Régua, já que foi a terceira maior que o Rio Douro teve. Lá estava o quarteleiro com o seu boné (julgo que será quico) e de galochas, a ajudar na recuperação dos haveres das pessoas, conjuntamente com outros bombeiros.

Nesta situação, como em muitas outras, que não faltaram, o sr. Zé Pinto cumpriu o lema “Vida por Vida”, que é o espírito mobilizador duma Associação Humanitária de Bombeiros.

Eram voluntários que se dedicavam de alma e coração à causa nobre de auxiliar o seu próximo, gastando horas e dias em prol duma comunidade necessitada.

Como se sentiriam os bombeiros perante um drama daqueles, quando todas as pessoas eram sobejamente conhecidas?

Muitas das casas à beira-rio eram da gente mais pobre e eram casas fracas, feitas só de tábuas ou, então, de tabique, onde imperava a pobreza, para não dizermos a miséria, e os parcos haveres que possuíam, lá se iam na corrente ou ficavam debaixo de água.

Foi assustador e metia medo tal grandeza de água, pelas correntes que o rio fazia, mesmo encostado às casas, e foi, sem dúvida alguma, uma desgraça que aconteceu às gentes da Régua, que, felizmente, não teve repetição comparável até aos dias de hoje. A situação posterior mais problemática de cheia do Douro foi em fevereiro de 1979 e o rio ficou-se pela Rua João Franco, pois só inundou o rés-do-chão, quase chegando ao 1º andar.

Uma situação inimaginável para os dias de hoje, a vivida nesse ano de 1962, como também uma realidade inatingível para alguns dos mais novos.

Não havia os atuais recursos técnicos, nem as equipas da Proteção Civil ou os militares dos quartéis circunvizinhos, nem as barragens para conter algum do ímpeto das águas do rio, nem os meios de comunicação facilitadores da nossa vida moderna.
A Dª Antónia foi, sem dúvida, uma vez mais, o braço direito do marido. Para corroborar esta tese, e para se comprovar a colaboração dessa senhora, passo a narrar um episódio supremo, de profundo altruísmo, aquando da cheia de 1962 - “era o fim do mundo na Régua” (no dizer da Dª Glória, nora) -, em que a “Antoninha dos Bombeiros” teve que entrar em ação e no salão, ao lado do Salão Nobre, num fogão grande que havia lá, para o aquecimento, onde passou dias a confecionar imensas panelas de sopa, para que os bombeiros pudessem vir comer algo quentinho, depois de longas horas a batalhar contra as intempestivas águas deste rio dourado, a procurar retirar os bens das casas atingidas pela cheia.

Como documentação e para relembrar as pessoas, apresento uma foto do nosso querido e saudoso quarteleiro, Zé Pinto, acompanhado pela sua extremosa esposa, Dª Antónia - “Antoninha dos Bombeiros”, junto do edifício da Casa do Douro, quando ele já se encontrava aposentado (foto 1).

Era inverno e os dias corriam frios! “Foi uma trabalheira desgraçada para os bombeiros” (disse-me a nora), já que as ruas ribeirinhas da Régua ficaram submersas, completamente inundadas, chegando a água muito próximo do 1º andar na Rua da Ferreirinha, havendo, a meio da rua, por baixo de uma das varandas, o registo desse fenómeno excepcional.

Pelo referido registo poderemos concluir, indubitavelmente, como a então Vila da Régua ficara inundada, com as suas ruas, as mais chegadas ao rio, completamente intransitáveis pelo descomunal volume de água, onde a única ajuda possível era a ação dos Bombeiros e de alguns populares (familiares, amigos ou conhecidos), todos Voluntários, que se esforçavam por recuperar, o máximo que pudessem, os bens que ficaram dentro das casas e que só era possível retirar com a ajuda de barcos.

Quantos barcos rabelos não terão andado nessas operações de resgate de bens e pessoas?!

Se atendermos aos primeiros anos de trabalho deste nosso bombeiro, sabendo-se que rebentou a 2ª Guerra Mundial – 1939/1945, um período mau de vida para os povos da Europa, facilmente deduziremos que o “nosso” quarteleiro teve situações bem difíceis, deveras dramáticas, mas que teve que equacionar.

Era o tempo em que o trabalho executado se cumpria sem horários, sem regalias... e, desde que fosse necessário sair com uma viatura, eis que o quarteleiro tinha que estar disponível para tudo e para todos, nada comparável aos tempos de hoje, em que se cumprem as formais horas de trabalho e, depois, cada um vai para sua casa ou à sua vida.

Foi esse o historial do sr. Zé Pinto, fruto dos tempos em que viveu, em que batalhou, tendo trabalhado até à Revolução de Abril e, quando a condição social da sociedade portuguesa começava a melhorar, como consequência desse Abril de 1974, viu-se “empurrado” para uma nova realidade, a de reformado - já que foi obrigado a abandonar o seu posto, por motivos de saúde (um ataque cardíaco) - e, na altura, a respetiva remuneração era fraca, dado que o seu vencimento também tinha sido reduzido outrora, a exemplo da grande maioria dos portugueses que viveram e labutaram nos tempos da ditadura.

Quando a vida se apresentava com melhores dias, já que os vencimentos do pessoal ativo tiveram significativos aumentos, a saúde traiu-o, impedindo-o de manter a sua ocupação profissional.

Dada a conjuntura política que se vivia, o sr. Zé Pinto não teve férias nesse longo período de quarenta anos, como também não teve sábados, não teve domingos, nem tão pouco teve feriados, tinha que estar ao serviço dos outros - os doentes -, dadas as constantes viagens, fossem pelos vários lugares da região ou ao Hospital Central do Porto, para transportar os enfermos, que podia consistir em ir levá-los ou, então, ir buscá-los.

Foi uma vida de dedicação à causa, colocando o serviço sempre à frente da sua vida ou qualquer opção que pretendesse concretizar.

Perante toda esta lealdade e consagração não houve um reconhecimento dos mais notáveis da Organização, enquanto o sr. Zé Pinto foi vivo e reformado, e hoje é tarde, dado que muitos deles já “partiram” e, também, o próprio Zé Pinto. Essa amargura levou-a ele para o Além, muito embora não mostrasse grande azedume com tal facto, mas alguma mágoa sentia, pois, como diz o povo, “quem não se sente não é filho de boa gente”.

Quando uma Organização tem nos seus quadros um elemento que lhe consagra quatro décadas exemplares de laboração (pelo que sabemos e pelo que nos dizem os que com ele conviveram), as quais foram interrompidas por motivos de saúde, e se esquece de enobrecer os préstimos do seu funcionário, muito mal procede e não pode dizer-se que valoriza os seus.

Se fosse um qualquer “graúdo” seria louvado e até agraciado, mas como não era um dos da “elite” deles, Zé Pinto ficou esquecido e relegado para um segundo plano, depois de passar a reformado. Viveu feliz com a esposa, os familiares e os amigos, que não lhe faltaram.
Como complemento desta primeira parte da crónica, apresento duas fotos do quarteleiro Zé Pinto: uma,  foto 2, junto dum velho carro de incêndio com um colega bombeiro, vestido com a farda de trabalho (fato-macaco); outra, foto 3, frente ao quartel e acompanhado por 2 amigos / colegas bombeiros, encostados à velhinha ambulância.

Duas belas peças de museu, as viaturas que podemos observar!  
(continua)
O ZÉ PINTO institucional 
Jornal "O Arrais", quinta-Feira, 15 de Setembro de 2011
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Imagens e texto cedidos por Dr. José Alfredo Almeida em Setembro de 2011 para Escritos do Douro. Edição de J. L. Gabão. Clique nas imagens acima para ampliar.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Os Bombeiros – Zé Pinto socialmente


Adérito Rodrigues

Tal como dissera no artigo anterior, vou tecer algumas considerações sobre a vida de um reguense, que muito embora não fosse um homem de grande estatura, foi um Grande Homem, já que dedicou 4 décadas da sua vida (envolvendo a família, muitas vezes) à causa social e à “sua” Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua, que hoje é centenária e a vaidade/orgulho dos reguenses. No entanto, esta Associação nada teria sido sem os homens que dedicaram as suas vidas a essa nobre causa do Voluntariado.

Quem foi, afinal, o Sr. Zé Pinto? Era conhecido por toda a gente como o “Zé Pinto dos Bombeiros”, pois foi quarteleiro e condutor nos Bombeiros da Régua, durante variadíssimos anos, no entanto, seu nome era José Melo, muitos nem saberão isto, nascido a 10/01/1915. Estava casado com a Dª Antónia Rosa Carvalho, também conhecida por “Antoninha dos Bombeiros”, que ainda está viva, com 95 anos, vivendo no Porto, em casa da filha, Dª Mª Odete.

O casal teve três filhos - Bártolo, Mª Odete e Joaquim, que viveram nesta cidade -, e ainda conheceu os 4 netos, o mesmo não acontecendo com os 6 bisnetos, pois são “rebentos” mais modernos.

O Sr. Zé Pinto era um apaixonado pela sua atividade, disso todos temos a certeza, muito embora já esteja esquecida a sua ação. A paixão que ele tinha por aquela casa, o Quartel dos Bombeiros, era muito grande e causou-lhe imensa tristeza a separação forçada a que se viu sujeito.

Todavia o “nosso” Zé Pinto não iniciou a sua atividade laboral diretamente nos Bombeiros, muito antes de entrar para tal função, ainda foi guarda-fiscal e só depois é que ingressou na Associação dos Bombeiros, onde ficou quase 40 anos.

Viu-se forçado a ir para a reforma perto dos 60 anos e com um longo percurso de trabalho, dado que teve um ataque cardíaco, surgiu-lhe uma angina de peito, problemática que lhe veio complicar o resto dos dias da vida, até que Deus o chamou a Si, em 14/12/1987, com 72 anos, situação que vivi muito de perto.
Com uma nova situação de vida - a reforma, procurou arranjar alguns entretenimentos para compensar o vazio do dia. Era regular apreciador de um bom jogo de futebol, bem como de uma boa tarde passada na pesca. Ia para o rio, a fim de poder “queimar” o tempo, já que as horas eram longas e nada do que fizera poderia ser de novo desempenhado. Ao menos isso, poder passar o tempo com amigos, porque a mágoa, o afastamento da sua paixão, mantinha-se no seu âmago.
Trazia os peixes que retirava das águas do Douro, mas, como solidário, distribuía-os pelos vizinhos. Não tive esse privilégio de poder comer peixes pescados pelo Sr. Zé Pinto, já que, quando o conheci, a condição física não lhe permitia grandes deslocações ou longas ausências. É assim a vida que nos vai acontecendo, permite-nos alguns factos, mas impede-nos para outros. Parece que no Céu, o Deus Supremo, nos esquece . . .

O conhecimento que tive com o sr. Zé Pinto foi a partir de 1978, quando fui habitar para o Bairro Columbano, na Rua da Lousada, nesta cidade. Ele vivia no 1º andar e eu no 2º e muitas vezes parei no princípio do varandim a cavaquear com ele e com a esposa, a Dª Antónia, nem como com outros vizinhos, com quem mantinha uma boa relação.

Era um tempo em que as amizades se privilegiavam, as boas vizinhanças se preservavam e os bons momentos de convívio e confraternização se desfrutavam numa total plenitude. Que saudades desses tempos!

Ao domingo tinha uma função específica, verificar a tensão arterial ao Sr. Zé Pinto. Como tinha um aparelho para monitorizar esses valores, eu próprio me voluntariei a tal tarefa, sabendo do “calvário” que ele tinha com os valores elevados, o que o atormentava demasiado.
Sendo um homem hipertenso, tinha, sempre, valores bastante elevados, andando a mínima pelos 10 e a máxima superior a 17. Rara era a ocasião em que o valor mínimo baixasse e o valor máximo não subisse, apesar do tratamento que fazia e do cuidado que a esposa tinha com os temperos na alimentação.

Uma vez, quando cheguei a casa do Sr. Zé Pinto, aconteceu-me uma situação engraçada. Ele tinha uma oferta para me dar. Era uma bola da minha terra. Como tinham estado lá em casa uns familiares e, provavelmente, foram a Lamego, entendeu que seria uma boa oferta para me dar. Depois de devidamente monitorizada a tensão arterial, decidiu-se a oferecer-me uma saca, onde estava a dita bola.

- Não é para lhe pagar, mas como vem aqui todos os domingos . . .

Fiquei surpreendido e sem reação, já que não esperava nada, não tão pouco queria o que quer que fosse, acabando por responder-lhe:

- Se voltar a fazer algo semelhante, pode ter a certeza que nunca mais entro na sua casa. Se venho aqui é porque quero, pela amizade que nos une, não tem nada que me pagar ou que me agradecer. Levo a oferta para não ser indelicado consigo, mas não volte a repetir a cena.

O Sr. Pinto ficou de tal forma surpreendido com o meu comportamento, que mais parecia que cometera um crime. Sentiu-se profundamente embaraçado, não queria que me aborrecesse, só pretendia ser simpático, reconhecido, dar-me um sinal de simpatia e agradecimento, só que, para amigos, isso não era necessário. Atitude de um homem humilde, bom e generoso, que reconhecia o valor intrínseco de uma amizade. Só Grandes Homens reagem assim.

Continuámos amigos e permaneci nas visitas a sua casa, a fim de lhe controlar a tensão arterial, enquanto lhe foi necessário monitorizar os valores arteriais, para poder ir andando mais ou menos sossegado com o regime de vida.

Foi da boca deste homem que ouvi algumas coisas interessantíssimas a respeito da Régua, já que vivera sempre na então vila e conhecia bem a realidade local. Coisas do passado ou coisas mais recentes, que se foram vivendo na vila e que ele testemunhara e que transmitia verbalmente.

Uma das várias informações que me deixou e que recordo com grata satisfação e saudade, prende-se com a passagem na ponte de ferro, que hoje está em obras. Muita gente pensa que aquela ponte foi feita para a passagem do comboio, o que é errado, já que nela passavam as pessoas e os carros de bois com a carga e pagavam um cruzado por tal feito, naquela altura. Moeda que já não conheci, pois a moeda mais pequena que manipulei foi o tostão - dez centavos – a décima parte dum escudo. Para as pessoas mais novas poderei adiantar que dois escudos equivalem a 0,01€ - (um cêntimo).

Foram histórias antigas e engraçadas que me foi transmitindo, que eu registei e que, às vezes, me vão aflorando à memória, num misto de saudade e de prazer, por poder reviver uma pessoa que me deu belos momentos de convívio. Muitas outras vivências poderiam ser contadas, pois são várias as que se conviveram, mas como o espaço do jornal não é infinito, remeto-me somente a estas, para mim as mais marcantes.
Como nota final, não quero deixar de agradecer às familiares do Sr. Zé Pinto pela colaboração disponibilizada - a filha - Dª Mª Odete, a nora - Dª Glória Vieira (viúva do filho Bártolo) e a neta - Dª Catarina / a 1ª pessoa a ser contactada e que desde logo se disponibilizou a ajudar na cedência de material, fotos e  algumas das informações, para a elaboração do trabalho.
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Os Bombeiros – Zé Pinto socialmente
Jornal "O Arrais", quinta feira, 11 de Agosto de 2011
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Pequena nota - Enquanto editava este excelente texto do Sr. Adérito Rodrigues, recordei com imensa saudade que o casal D. Antónia - Sr. Zé Pinto foi, durante alguns bons anos, vizinho de meus queridos e saudosos Pais no 'Prédio Columbano' em Godim - Peso da Régua. - J. L. Gabão.
Clique nas imagens acima para ampliar. Leia-se a 1ª. parte "Os Bombeiros – Abordagem pessoal"  neste blogue. Colaboração de texto e imagens do Dr. José Alfredo Almeida e edição de J. L. Gabão para o blogue "Escritos do Douro" em Agosto de 2011.