sexta-feira, 16 de outubro de 2009

A Régua com os bombeiros de Ermesinde


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Em 1 de Maio de 1960, os bombeiros de Ermesinde foram recebidos na vila do Peso da Régua num ambiente de festa.

Eram aguardados na Rua da Ferreirinha, junto à famosa Garagem Janeiro, pelos bombeiros da Régua, numa impecável formatura, pelos directores da associação Alfredo Baptista e Augusto Mendes de Carvalho e pela população que queria assistir à entrega do diploma de sócio - honorário, distinção concedida pelos bombeiros de Ermesinde.

Esta brilhante cerimónia celebrava o princípio de uma união e amizade entre as duas corporações que, desde essa data, é mantida e consolidada com contactos permanentes.

Os bombeiros de Ermesinde, na sua primeira vinda à Capital do Douro, mostravam a sua determinação em unir os homens paz do litoral com os do interior. Fizeram representar-se por uma delegação que incluía o presidente da direcção Adélio de Oliveira e o Comandante Capas Peneda. Para que a cerimónia revestisse de maior brilho, os directores pediram aos associados com viatura própria, para integrarem a caravana com destino à Régua.

O brilho não faltou de nenhum dos lados. Os bombeiros da Régua, sentindo-se honrados com o gesto altivo, acolheram os seus camaradas de Ermesinde e com uma recepção que, seu presidente da direcção, considerou como grandiosa. Como reconhecimento pela honra recebida, aos bombeiros da Ermesinde foi entregue uma medalha privativa da associação reguense, colocada solenemente no seu estandarte, pelo Comandante Carlos Cardoso.

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A cerimónia continuou depois no salão nobre do quartel. Os discursos proferidos salientaram a importância dos laços de união entre as duas associações e, sobretudo, entre os homens que abraçam a causa do voluntariado. Pelas palavras do Comandante Capas Peneda veio o maior elogio de solidariedade. Confessou emocionado que os bombeiros da Régua podiam estar em Ermesinde como estivessem na sua casa. Ora, na verdade, é isso que hoje acontece quando lá vamos. Somos recebidos pelo actual presidente da direcção Artur Carneiro e pelo Comandante Carlos Teixeira como amigos especiais, onde temos sempre um lugar na mesa de honra. Da nossa parte, quando eles nos visitam, damos-lhe as mesmas atenções. Assim, a amizade entre as duas corporações resiste ao tempo e a distância que nos separam!

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Mas esta fotografia aviva as memórias da Régua nos anos 60. Além da oficina dos Janeiros, na rua da Ferreirinha estavam estabelecidos os grandes armazéns e algumas das principais lojas de comércio. Como artéria principal era movimentada e ligava, através da chamada ponte do Bate – Estacas, o centro da vila à vizinha freguesia de Godim. E, servia como a saída e a entrada dos veículos que percorriam a velha estrada nacional nº108 entre a Régua e Ermesinde, um percurso com sinuosos 94 km de distância.

A Régua, nesse tempo, vivia fechada em si e nas suas belas paisagens e pelos cenários de ruralidade que as mãos do homem transformaram em verdadeiros monumento naturais. Os grandes negócios faziam-se no sector dos vinhos.

E, muitas ajudas aos bombeiros vinham das firmas de vinhos, como a da casa comercial inglesa Sandeman que, em 18 de Junho de 1893, ofereceu a quantia de 25 mil réis. Ainda hoje é assim…

Algumas memórias e vivências desses velhos tempos são evocadas na notável crónica “A Botica do Anastácio”, de Joaquim Pires (pseudónimo do escritor Dr. João de Araújo Correia), publicada no jornal “O Arrais”, em ficamos a conhecer o quotidiano de ilustres bombeiros reguenses:

“A Régua actual, tornemos a dizer, não é muita antiga. Nasceu com a Companhia Velha, cujo edifício e armazém, à beira do nosso rio, são uma espécie de quartel-general do país vinhateiro. Era à Régua o foro de capital do Douro.
Mas, por hoje, vamos lá recordar a botica do Anastácio, situada na Rua dos Camilos, defronte da antiga loja do Valente Novo. Loja que mudou de nome português para nome francês, mudando o proprietário. Deus lhe perdoe!
A botica do Anastácio! Já toda a gente lhe chamava farmácia. Mas, o meu pai, amigo de termos velhos ainda lhe chamava botica. Assim como chamava Rua da Bandeira à Rua dos Camilos, porque os terrenos, por ali situados, tinham pertencido aos Portocarreiros, fidalgos da Bandeirinha, lá em baixo, na cidade do Porto.
A Régua não é muito antiga. Mas, já se pode ir falando da Régua de ontem aos actuais reguenses. Como tudo quanto nasceu, também, a Régua vai envelhecendo.
A botica do Anastácio é de ontem. É do tempo em que não havia clubes ou só havia um clube. É do tempo em que os mentideiros, os soalheiros, os centros de cavaco, eram as farmácias ou mercearias. Memorável ponto de reunião foi a botica do Anastácio - como lhe chamava meu pai. Memorável clube improvisado.
Anastácio, de pé, do lado de dentro do mostrador, deitava aos contertúlios, de vez em quando, uma palavra mansa.
Era homem calmo, correcto, farmacêutico limpo e honesto como não havia segundo. Receita aviada por ele saía das suas mãos como obra-prima em forma de garrafa, hóstias ou pomada. Morreu bastante novo, com uma diabete quase fulminante.
Contertúlios reunidos à noite eram aí meia dúzia. Além de meu pai, conto o Dr. Vasques Osório, mais conhecido por Doutor Galego, por ser filho de Domingos, galego de nação; Joaquim Lopes da Silva, homem de grande tino comercial, uma energia oriundo de Ovar; Cardoso Mirandela, então ajudante de notário, homem esperto e positivo; Joaquim de Sousa Pinto, merceeiro bem disposto, dedicado comandante de bombeiros; Joaquim Penhor, a quem chamavam o Tio Rico, e outros.
Conversavam sobre a política do tempo, contavam anedotas recessas, etc.
Tio Rico morava lá em cima, no Poeiro, numa casa que veio a ser residência paroquial. Creio que vivia com mulher e cunhadas. E, como não tivesse filhos, deixou a casa ao Cardoso Mirandela, sobrinho dele por afinidade.
A Régua não é muito antiga. Mas, como se vê, começa a ter que contar”.

Como bem conta o escritor reguense, pela botica do Anastácio passaram muitos homens que fizeram a história da Régua e, em especial, dos seus bombeiros voluntários.

Ficamos a saber que, por volta dos anos 30, nessa tertúlia estavam presentes o Comandante Joaquim Sousa Pinto (1927-30), um dos fundadores da associação, o Chefe Cardoso Mirandela e o pai do escritor que foi bombeiro (António Correia), que gostavam de dar dois dedos de conversa sobre a política do seu tempo…!

Bons tempos dessa Régua de ontem!

Hoje, passados quase 50 anos, quase tudo mudou na Régua.

Os costumes das pessoas e os horizontes da cidade são bem diferentes. As pessoas deixaram de reunir nas tertúlias. A cidade, que nasceu e cresceu nas margens do rio Douro, uma vez mais procura através dele novas formas de desenvolvimento, como é o caso do turismo. Chegam ao cais fluvial milhares de turistas atraídos pelos encantos naturais, pelo vinho generoso, único no Mundo, pelos rituais das vindimas e, ultimamente, pelas descobertas proporcionadas pelo “Museu do Douro”, onde se pode visitar a exposição dedicada à vida de um homem genial - a razão e o sentimento - como foi o escocês Barão de Forrester.

Enfim, a Régua como concelho desde 1837 e os seus bombeiros voluntários, a partir de 1880, estão voltados para o futuro e continuam a crescer ao compasso de um mundo em mudança, mas assente em quatro pilares basilares: o vinho, a paisagem, o turismo e a cultura.
- Peso da Régua, Outubro de 2009, J. A. Almeida.
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1 comentário:

Anónimo disse...

Queria homenagear o colaborador deste blogue J.A. Almeida pelos excelentes trabalhos que tem publicado. Parabéns pelo dedicação que tem demonstrado nos seus textos pelos Bombeiros e pela Régua.